Vai muito além da poesia o legado de Oliveira Silveira. Um dos fundadores do Grupo Palmares, o escritor dedicou-se à pesquisa por décadas e deixou, em 2009, quando morreu, uma herança cultural e histórica que se estende desde seus versos até uma vasta documentação da comunidade negra na Capital.
Doze anos após sua morte, quando completaria 80 anos, e em pleno Ano Estadual da Consciência Negra, a filha do autor, a professora Naiara Silveira, anunciou a criação do Instituto Oliveira Silveira, ainda sem sede, para disponibilizar ao público toda a sua obra.
Oliveira esteve, há 50 anos, entre os idealizadores de um ato em oposição ao 13 de maio, que marca a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel. Com o Grupo Palmares, o poeta instituiu, então, o Dia da Consciência Negra em 20 de novembro, coincidindo com a morte do líder quilombola Zumbi dos Palmares, que entraria para o calendário nacional em 2011.
Naiara relembra a dificuldade que os integrantes encontraram para fazer esse contraponto à data da abolição da escravatura. O empecilho acabou sendo também o motivador de Oliveira para que ele criasse um acervo capaz de contar essa história.
— Porto Alegre é responsável pelo 20 de novembro. É gaúcho, é nosso. E se vem alguém de fora para pesquisar aqui, os documentos estão lá, fechados em um apartamento. Quem precisar pode me procurar, dou um jeito de atender e faço isso com a maior alegria, mas (deixar o acevo no apartamento) não é o certo. Ele não deixou para mim, mas para a comunidade negra — afirma Naiara.
A iniciativa conta com a ajuda de amigos de Naiara e da professora da Unipampa e biógrafa de Oliveira, Sátira Machado. No acervo, localizado atualmente na casa de Sátira, há desde originais até vinis, xilogravuras, CDs, cartas trocadas com ativistas e reportagens de jornais editados por negros em 1800, com notícias de vendas de negros escravizados. Além do objetivo de conservar o patrimônio material e imaterial do poeta, o projeto também visa à promoção de ações educativas de preservação, como palestras.
História
Também embarca nessa missão a Coordenação de Direitos e Promoção de Igualdade Racial da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social de Porto Alegre, responsável por ceder um local para o Instituto ganhar vida. À frente da pasta está Adriana Santos, que chegou a conhecer Oliveira em meados de 2008. Para ela, estar envolvida no projeto significa manter, de certa forma, um contato com o escritor. Aponta que a criação do espaço reforça a existência e a contribuição dos negros gaúchos para a história do país.
— O Oliveira já tem a fama por si só. O Instituto representa uma formalização para colocar na vitrine não só o acervo do Oliveira, mas Porto Alegre, o Rio Grande do Sul, o Brasil no mapa do mundo — afirma ela.
Quem não puder visitar presencialmente o local, em breve terá outra oportunidade de conhecer as obras. Em um projeto idealizado antes mesmo de o instituto ser trazido à tona, Sátira trabalha — hoje em parceria da Unipampa com a UFRGS — para catalogar e digitalizar o acervo do autor, que será disponibilizado no site ufrgs.br/oliveirasilveira.
Com seu trabalho exposto a todos, a ideia é tornar acessível Oliveira Silveira em toda a sua visceralidade — assim, poderá ser lembrado não somente como poeta e um dos idealizadores do 20 de novembro, mas também como historiador, pintor, compositor, entre tantas outras facetas.