Neste sábado (25) é celebrado o Dia Nacional do Escritor. Para comemorar a data, GaúchaZH pediu aos seus colunistas indicações de autores para ler durante o período de isolamento social. As dicas vão de obras de ficção que prometem tirar o leitor de sua realidade até textos que descrevem algumas das situações mais sérias da sociedade, como o racismo. Confira:
Guillaume Musso, A.J. Finn e Ed McBain, por David Coimbra
Nesses tempos de realidade dura, talvez o melhor seja buscar na literatura uma fuga para mundos mais amenos. Para isso, indicarei livros que farão com que você mergulhe na trama e esqueça de tudo mais que está acontecendo em volta.
O primeiro é um atual, lançado no ano passado: Um Apartamento em Paris, do francês Guillaume Musso, um thriller repleto de surpresas, um pouco parecido com O Código Da Vinci, de Dan Brown, que, aliás, se você não leu, leia. É uma boa diversão.
Minha segunda indicação deveria ser a primeira, porque gostei mais desse romance. É A Mulher na Janela, de A.J. Finn. É uma trama original, muito bem contada. Você não consegue largar a história. Esse A.J. Finn estourou como best seller nos Estados Unidos, mas logo caiu em desgraça, porque os jornalistas americanos descobriram uma série de mentiras que ele contou a respeito da sua própria vida. Ele mentiu sobre os pais, sobre seu passado e inventou até um câncer. Um cara meio estranho, mas ótimo contador de histórias.
Por fim, você deve buscar algum romance de Ed McBain, um dos pseudônimos de Evan Hunter. Ele escreveu mais de 80 livros policiais com esse nome — todos são bons, mas experimente Viúvas. Você não vai se arrepender.
Angela Davis, por Kelly Matos
Ler sempre foi uma alegria pra mim, desde pequena. Mas nessa pandemia, curioso, me debrucei sobre um tema que não é tão divertido. Eu li ficção, é verdade — e recomendaria de olhos fechados a obra de Romain Gary, de quem consumi na quarentena A Vida pela Frente, um clássico narrado pelo pequeno Momo e que rendeu ao ator o Prêmio Gouncourt pela segunda vez. Aqui, uma curiosidade: o Gouncourt é o mais importante prêmio literário da França e só pode ser entregue uma vez a cada escritor. Acontece que Gary escreveu este sob o pseudônimo de Émile Ajar. E sua verdadeira identidade só foi descoberta após sua morte e, por isso, o feito. Mas voltemos à pandemia e às autoras e autores que descobri nela. Todos, relacionados à questão racial.
Digo isto porque desde que o tema se abriu pra mim (com atraso, reconheço) passei a consumir Angela Davis, Grada Kilomba, Djamila Ribeiro, Lúcio Almeida, Carla Akotirene. E como a proposta aqui é se debruçar sobre apenas um, vou me atentar a Angela Davis. Professora, filósofa, ativista, Angela expõe ao mundo há décadas as feridas coloniais e raciais impressas sobre a nossa sociedade e ainda assim segue extremamente atual. Sua obra Mulheres, Raça e Classe é leitura obrigatória se desejamos avançar em questões humanitárias que, na minha visão, precisam ser enfrentadas com urgência, caso contrário permaneceremos reproduzindo os mesmos erros ainda reflexo do período nefasto da escravização. Na pandemia, adquiri também Mulheres Culturas e Política e A Liberdade É Uma Luta Constante, da editora Boitempo. Nas palavras da professora Angela Figueiredo, da Universidade Federal da Bahia, que conduz o prefácio desta última, o encontro com a obra de Angela é um “divisor de águas”, a partir de sua enorme capacidade de reflexão crítica sobre o passado e suas articulações com o presente. Angela Davis. Minha autora da quarentena.
Ayelet Gundar-Goshen, por Cíntia Moscovich
Uma escritora surpreendente, que deve ser lida, é Ayelet Gundar-Goshen, um talento em ascensão na literatura israelense e que acaba de ser lançado no Brasil pela Todavia. Despertar dos Leões, que tem tradução de Paulo Geiger, conta a história de Eitan Green, neurocirurgião que é transferido de Tel-Aviv para Beer Sheva — da metrópole para as franjas do deserto —, mudança que lhe causa revolta e cansaço. Certo dia, ao voltar de um estafante plantão, atropela um imigrante africano e foge da cena do acidente.
A partir daí, Green se vê afundado cada vez mais numa série de equívocos e mentiras, uma roda de infortúnios na qual toma contato com imigrantes que buscam em Israel uma nova chance de vida, algo semelhante ao que se passou com os judeus sobreviventes depois do massacre nazista.
Para a época de padrões morais tão flexíveis, talvez seja a melhor leitura a se recomendar.
Domenico Starnone, por Mário Corso
A vida do escritor Domenico Starnone está envolta em um mistério literário. Seria ele Elena Ferrante? A escritora italiana de maior prestigio e venda da atualidade usa um pseudônimo e ninguém a conhece. Ou Ferrante seria a sua mulher, a tradutora Anita Raja? Ou ainda, Ferrante seriam os dois escrevendo juntos? Não sabemos, mas existem leitores e críticos que sustentam que as obras de Ferrante e Starnone conversam, e possuem similaridades além do razoável.
Recomendo o autor de Laços, Assombrações e o recém lançado Segredos, pelas genial amarração dos roteiros, não há nada fora do lugar, não há palavra solta. Comece por Laços, parece uma novela policial, mas é a vida amorosa dramaticamente atabalhoada de um casal, narrado alternadamente pelos personagens.
Fernanda Bastos, por Julia Dantas
O livro Dessa Cor, de Fernanda Bastos, tem tudo que um bom livro de poesia precisa ter: sensibilidade, trabalho técnico e alguns murros no estômago do leitor. É por isso que ele atinge tanto quem lê com o intelecto quanto quem lê com o coração. "Na minha vez / de gritar no precipício / não veio o eco", começa o poema Lá em Riozinho. Na seção Cartas de Liberdade, são revisitadas cartas de alforria de pessoas escravizadas no Brasil.
O livro está repleto de reflexões, metáforas e imagens que apenas uma mulher negra poderia alcançar. Todo escritor é um mistério, mas arrisco um palpite: Fernanda Bastos escreve com a pele e com a carne, mas depois revisa e edita com a inteligência sofisticada de quem conhece, da arte, as engrenagens.
H.G Wells, por Diogo Olivier
O mais perturbador e instigante em O Homem Invisível, de Herber George Wells, escritor inglês que assinava H.G Wells quase como prosa de sua ficção científica, é a atualidade. Lançado em 1897, há mais de 120 anos, você pode indicar para o filho adolescente que ele vai devorar com sofreguidão. Tem humor, ação, cenas inesperadas, diálogos ágeis e descrições detalhadas de ambientes e perfis psicológicos dos personagens.
Esses ingredientes todos, colocados no caldeirão, fizeram de H.G Wells um mestre da fórmula na qual o herói ou protagonista envolve-se em histórias de vida ou morte, tendo sempre uma questão científica no centro, o que viria a definir o gênero hoje conhecido como ficção conhecida. O título do livro diz tudo. Diversão garantida na quarentena.