Aos 81 anos de idade e com mais de cinco décadas de carreira, Lya Luft não precisa provar nada para ninguém. Autora de best-sellers e colunista de jornais e revistas de grande circulação, a autora tem boa recepção do público e, ao mesmo tempo, também é tema de estudos no meio acadêmico. As Coisas Humanas, mais novo livro de crônicas da autora, deixa transparecer a tranquilidade e segurança de quem sabe que já deixou seu nome impresso na história da literatura brasileira, mas ainda segue com viva inquietação criativa.
O volume, que mescla material já publicado com textos inéditos, foi compilado após a morte de André Luft, filho do meio de Lya, que teve a vida abreviada aos 51 anos por conta de uma parada cardiorrespiratória enquanto surfava em Santa Catarina.
A perda do filho é citada no início e no final do livro, e André reaparece novamente em outras crônicas. No entanto, além do trauma aparecer de modo explícito, de certa forma também pauta toda a organização de As Coisas Humanas. Ao final, é possível ter a impressão de que o livro serviu como amparo para a escritora superar o momento difícil e trazer renovação para sua trajetória – “mesmo quando uma perda trágica nos derrubou, de repente, aqui e ali, um galhinho verde muito claro desabrocha na galharia maltratada”, escreve a autora.
Sentido
Família, amizade, leitura e imaginação literária são os temas mais recorrentes dos textos. Não se trata de alguém que pretende a todo custo dar sentido à vida por meio dos relacionamentos ou da literatura. Ao contrário, em um dos melhores momentos do livro, a autora abdica da busca de sentido: “o consolo está em que nada faz muito sentido. (…) Se uma parte de viver são escolhas, a outra parte é o olhar compassivo, divertido ou cruel dos deuses – para nossa glória ou danação”.
A força de As Coisas Humanas está no despojamento e na simplicidade de Lya para tratar de temas indecifráveis da experiência humana, como o sentido da vida e a busca de significado para as perdas. Tratar desses assuntos de modo abrangente, para captar a atenção de uma grande comunidade de leitores, mas também não descambar para o pieguismo e a extrema superficialidade, é um grande feito.
Em sua trajetória, Lya Luft já conquistou leitores fiéis, que certamente vão se deliciar com mais esse volume de crônicas da autora. Como em outros livros do gênero, os temas são retomados por diferentes pontos de vista, mas não necessariamente aprofundados – cada texto inicia uma nova reflexão, sem o compromisso de seguir adiante o raciocínio do anterior. Trata-se de uma leitura leve e que não abre mão do bom humor, apesar de muitas vezes abordar assuntos densos.