— Me envia a conta bancária da livraria que eu vou pagar o aluguel para vocês.
Éderson Lopes foi surpreendido com essa frase após atender o telefone da Livraria Taverna na tarde desta terça-feira (17). Do outro lado da linha, estava uma cliente e vizinha que, preocupada com o atraso do aluguel de março, decidiu ajudar os proprietários a enfrentar o período de crise, agora agravada pelo coronavírus, que está provocando o fechamento de estabelecimentos para evitar a aglomeração de pessoas e, assim, reduzir o contágio.
Localizada na Rua Fernando Machado, no centro de Porto Alegre, a Taverna é uma das poucas livrarias da cidade que não está instalada em locais fechados, como shoppings, em um formato conhecido como "livraria de calçada". Éderson, que é sócio junto com André Günther, contou para GaúchaZH que o aluguel de março estava atrasado por conta da temporada de verão, quando as vendas tradicionalmente caem.
— Janeiro e fevereiro já são bem ruins para livrarias, já é normal passarmos por dificuldades nesse período. No início de março, geralmente é bom pela volta às aulas, mas não sentimos nenhuma melhora nesse ano após o carnaval. Com isso, atrasamos várias contas, como o aluguel — contou Ederson.
O sócio da Taverna afirma que, mesmo com as finanças em crise, não fez nenhum tipo de apelo para amigos e clientes, apenas expôs a situação nas redes sociais da livraria. Mesmo assim, a ajuda recebida surpreendeu.
— Ela é uma vizinha e cliente, mas não tínhamos intimidade, é apenas uma relação profissional. Ela ligou e pediu o valor do nosso aluguel. Eu achei a pergunta estranha, mas respondi. E ela pediu para passar a nossa conta bancária, porque iria pagar nesse mês. Fiquei desconcertado. O valor é alto e vem de uma pessoa que tu não conhece muito. Tu não entende que o que está acontecendo — contou, ainda surpreso.
Apesar de saber a identidade da alma caridosa, Éderson afirma que a doação foi praticamente anônima. A cliente pediu que seu nome fosse mantido em sigilo e fez questão de justificar o auxílio à livraria:
— Ela disse que queria ajudar porque a livraria e muito importante para o bairro, para a rua — lembrou.
Efeitos do coronavírus
Por conta do avanço do coronavírus no Brasil, diversos estabelecimentos, não só na Capital, estão reduzindo horários de atendimento ou até fechando as portas para evitar que a doença se espalhe de forma massiva. A Taverna reduziu a equipe de trabalho, cancelou eventos e está apostando nas vendas online para tentar superar os dias de portas fechadas.
Porém, Éderson Lopes se mostrou preocupado com a sobrevivência dos negócios locais em meio à pandemia. Nas redes sociais, há uma espécie de campanha correndo pelos perfis para priorizar as compras em pequenos negócios e com produtores locais, que correm o risco de terem suas economias colapsadas enquanto as pessoas não tiverem circulando — atitude exemplificada pela doação feita pela vizinha e cliente da Taverna.
— A gente de fato corre o risco de fechar, como qualquer outra livraria pequena. Mas nós vivemos uma situação ainda mais delicada, pois nesse período as pessoas enxergam um livro como um item dispensável. Ninguém vai pensar em comprar livro agora — explicou.