Encravado no centro da Praça da Alfândega, o balcão de informações da 65ª Feira do Livro de Porto Alegre recebe diariamente cerca de 1,5 mil visitantes à procura de todo tipo de ajuda. A maioria pede auxílio para encontrar a banca onde está sendo vendida determinada obra. Mas há também os que caem de paraquedas no lugar. Tem aquele que aproveita para despejar a raiva do dia no primeiro que aparecer à frente e até quem se aproxima para pedir a indicação de "onde comprar queijo na feira".
Entre 8h30min e 20h30min, cinco atendentes se revezam no balcão, coordenado há seis anos pela professora aposentada Noia Kern, 72 anos. Paciência, calma, habilidade com informática e conhecimento literário são requisitos importantes aos que exercem a função de saber todas as informações relacionadas ao evento. Mas jogo de cintura se torna fundamental na hora de responder as dúvidas mais estapafúrdias. A artesã Grasiela Pressi, 44 anos, três deles trabalhando no balcão, que o diga.
Na manhã desta segunda-feira (11), ficou sem conseguir responder a um senhor onde ele poderia tirar fotos 3x4 em Porto Alegre. O homem saiu indignado. Afinal, para ele, aquele era um balcão de informações. No primeiro ano como funcionária, ouviu xingamentos por não saber responder ao visitante o endereço do local onde ele faria a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Ao explicar que a internet da Feira era apenas para informações sobre o evento, foi obrigada a ouvir que estava de má vontade.
— Nesta hora, vem a calma. As pessoas precisam compreender que temos apenas informações sobre a Feira do Livro. Amamos o que fazemos e estamos aqui para auxiliá-las — reforça Grasiela.
Já se tornou comum aos mais novos na função receberem casos muito além dos problemas pertinentes ao evento. Na tarde desta segunda, a reportagem presenciou um atendimento envolvendo dois dos cinco funcionários. Por volta das 14h, um senhor de cabelos brancos aproximou-se do balcão e questionou o motivo de determinada obra não estar sendo vendida na Feira. João Pedro da Cunha, 20 anos, estudante de teatro e estreando no serviço, prontamente passou a pesquisar na internet sobre sobre o livro. Descobriu que nenhuma distribuidora havia se interessado em revendê-lo. Quando começou a ouvir a explicação, o homem arregalou os olhos, aumentou a voz e passou a chamar os funcionários de "vigaristas". Na mesma hora, Noia aproximou-se e, quase sussurrando ao ouvido do homem, expôs a situação. Impaciente, ele ainda esbravejou sobre a política no Brasil e no mundo, antes de sair xingando os atendentes, que ficaram sem entender o motivo de tamanha agressividade.
— É preciso preparo para qualquer situação. O importante é que a maioria chega em paz, realmente buscando uma informação — completou Cunha.
No domingo (10), o estudante precisou ir além das indagações relacionadas à Feira. Segurando uma Torá — livro sagrado do judaísmo — uma senhora foi ao balcão de Cunha perguntando "onde ela poderia encontrar um judeu, porque tinha questões relacionadas à Torá". Inicialmente, o jovem explicou que não tinha como indicar alguém no evento, mas que ela poderia localizar alguém numa das sinagogas da Capital. A mulher saiu satisfeita com a resposta.
Também há quem busque o local para deixar objetos perdidos. Durante a presença da reportagem, havia três cartões bancários, uma carteira de motorista, um cartão de espera para fazer a carteira de trabalho e um casaco. No ano passado, até uma dentadura foi deixada no balcão. E ainda existem os que perdem pessoas. Na semana passada, um homem chegou ao balcão procurando a esposa. Prontamente, o nome da mulher foi anunciado quatro vezes no alto-falante. Ela, porém, não apareceu. Depois de uma hora, o homem agradeceu e foi embora. Cinco horas depois, por volta das 20h, uma mulher se aproximou do balcão à procura do marido. O nome era o mesmo do homem que havia passado pelo local naquela tarde. Os atendentes relataram a preocupação dele e a questionaram se estava tudo bem. Ao grupo, a mulher relatou ter ficado dando voltas nas quadras até encontrar um local para estacionar. Ao parar o carro, sentou num bar próximo e esperou o marido, mas ele não apareceu. Sozinha, resolveu circular pelos estandes da Feira antes de voltar a procurá-lo.
— Ele vai a Brasília ainda hoje, e não consigo localizá-lo — contou a mulher aos atendentes.
Na mesma hora em que relatava a saga, ela atendeu o celular:
— Onde você está? O quê? Já está em Brasília?!
A mulher saiu correndo, e os funcionários ficaram em silêncio, apenas tentando entender o que acabar de ocorrer.
Segundo a coordenadora, pelo menos 5% dos que passam pelo balcão durante todo o evento chegam indagando que movimento é aquele na praça. Geralmente, aponta, são pessoas de bairros distantes da cidade ou turistas.
Saiba mais:
- Para saber onde comprar um livro, é importante ter o nome da obra ou, pelo menos, o tema e a editora.
- Com essas informações, os atendentes conseguem rastrear pela distribuidora em qual banca está sendo comercializado.
A equipe
- Nóia Kern, 72 anos, professora aposentada e há seis anos no balcão — coordenadora da equipe
- Grasiela Pressi, 44 anos, artesã e há três anos na Feira
- Marina Greve, 21 anos, estudante de teatro e há dois anos no balcão
- Adriana Bagatini, 37 anos, gestora cultural e há dois anos na Feira
- João Pedro da Cunha, 20 anos, estudante de teatro, primeiro ano na Feira
- Nathália Muniz, 32 anos, doutoranda em engenharia, primeiro ano na Feira