Por Armindo Trevisan
Autor, entre outros, de “A Surpresa de Ser” e “Como Apreciar a Arte”
Trata-se de uma iniciação à fé cristã, dirigida “idealmente” a um jovem de hoje. É pretensão – admito-o – “definir” esse jovem! Quem poderia apresentar um retrato, que fosse aceito sem reservas, de um jovem de hoje? Primeiramente, existe grande variedade de “jovens”. Em segundo lugar, um jovem francês, por exemplo, difere de um jovem asiático, ou de um jovem africano. Em terceiro lugar, existe uma espécie de hibridismo nas novas gerações, em parte porque os jovens atuais sofrem a influência das redes sociais e das viagens que realizam. Em quarto lugar, são múltiplos e variadíssimos os intercâmbios religiosos. Os jovens de hoje parecem saber claramente o que não querem – em termos de adesão religiosa. Não obstante, muitas vezes, também parecem ignorar o conteúdo das religiões de seus avós.
Nossa intenção, ao elaborar um Credo inspirado em São Tomás constituiu, antes, um desejo de revelar São Tomás às novas gerações, do que a sugestão de um estatuto religioso, de tipo dogmático, ou mesmo um programa específico de catequese. Meu livro é propriamente um ensaio.
Há alguns anos, traduzi o texto das homilias de São Tomás sobre o “Símbolo da Fé”, isto é, o Credo, que é a confissão recitada, aos domingos, durante as missas ou os cultos, tanto da Igreja Católica como das Igrejas Luteranas e Reformadas. Tal confissão consiste na reafirmação de 12 artigos essenciais, que são professados pelos que aderem à pessoa e à doutrina de Jesus.
Notemos que as homilias de São Tomás, pronunciadas numa igreja de Nápoles nos dois anos que precederam sua morte, acabaram sendo o canto de cisne do autor, visto que ele morreu mal completara 49 anos. A importância de tais homilias é que elas são consideradas o primeiro esboço de um catecismo cristão. Os catecismos propriamente ditos surgiram com Lutero (Catecismo Menor e Catecismo Maior), e com o monumental Catecismo do Concílio de Trento (1545-1563). A palavra “catecismo” deriva de um verbo grego que significa “ensinar à viva voz”.
Ao elaborarmos um livro com comentários sobre o esboço de Tomás dos elementos essenciais da fé cristã, nosso objetivo foi confrontar sua exposição – digamos “medieval” – com a evolução da catequese nos últimos séculos. Creio que seríamos desrespeitosos e imprudentes se depreciássemos o grande Doutor, considerando-o uma figura arqueológica do cristianismo. Também é verdade que não convém considerá-lo uma espécie de “cérebro-mor do pensamento cristão”. São Tomás é, simplesmente, um excepcional pensador cristão, ou antes, um excepcional pensador do mundo ocidental.
Nosso livro pretende simplesmente adicionar às reflexões de São Tomás o que a teologia moderna e contemporânea refletiu, nos últimos séculos, em relação aos mistérios da revelação. É evidente que toda tentativa de síntese, em termos religiosos, é deficitária. Por uma razão: se é verdade que Jesus convidou todos os seus discípulos a anunciarem o Evangelho “a todas as nações”, não menos verdade é que entendeu tal preceito sob uma ótica ecumênica. Sugeriu-nos que adotássemos o que hoje se entende por “inculturação”, a admissão de que cada cultura possui originalidade e uma linguagem peculiar, que varia de um continente a outro. Demos um exemplo: quando John Wu, chinês convertido ao catolicismo em 1937, quis traduzir o Novo Testamento, pela primeira vez, para o chinês, esbarrou numa dificuldade. Como verter a palavra “Verbo” (tradução latina do termo grego “logos”, utilizado por São João no prólogo do seu Evangelho: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (João 1,14)? John Wu não encontrou, na tradição chinesa, nenhum conceito semelhante ao de “logos”. O erudito chinês, portanto, achinesou o conceito e a linguagem, traduzindo o “logos” de São João da seguinte maneira: “No princípio era o Tao, e o Tao estava com Deus, e o Tao era Deus”.
Além de chamar a atenção para as intuições e reflexões do maior teólogo da Igreja Ocidental, nosso livro evoca um provérbio que o próprio Jesus julgou digno de incluir no seu Evangelho: “O homem bom, do seu bom tesouro, tira coisas boas..." (Mt 12,35). Supomos que São Tomás não deixou de ser um bom tesouro só por ter sido esquecido... Vale a a pena extrair alguma coisa de sua produção intelectual do século 13, para aplicá-la ao nosso complexo mundo contemporâneo. São Tomás, em nossa opinião, é um mestre do passado que continua a ser um mestre da atualidade. As redes sociais fariam bem em redescobri-lo.
O livro
O Credo de São Tomás Explicado a um Jovem de Hoje
De Armindo Trevisan. Editora AGE, 295 páginas. O livro está à venda a R$ 78, em média. Lançamento no dia 6 de setembro, das 17h às 19h, no Foyer do Theatro São Pedro, em Porto Alegre.