A partir de 1998, Eduardo Bueno conseguiu a proeza de transformar o Brasil Colônia em fenômeno do mercado editorial com a coleção Brasilis. Essa faceta de escriba pop da história chegou ao YouTube há dois anos, com o canal Buenas Ideias, e mais recentemente aos palcos com o espetáculo Não Vai Cair no Enem – Uma Peça. Mas, antes, durante e depois de tudo isso, Peninha – seu codinome – tem assinado reportagens, entrevistas e crônicas que documentam sua indomável atuação no jornalismo.
Uma seleção destes trabalhos antes esparsos, originalmente publicados em Zero Hora (em sua maioria), O Estado de S. Paulo, prefácios e outros lugares, agora está reunida e novamente acessível aos leitores com o lançamento do livro Textos Contraculturais, Crônicas Anacrônicas & Outras Viagens (L&PM). A sessão de autógrafos será nesta quinta-feira (28), às 18h, na PocketStore Livraria (Rua Félix da Cunha, 1.167), que foi aberta nesta semana em Porto Alegre.
Reunindo escritos de 1984 a 2019, o volume começa com a seção dedicada à contracultura, uma especialidade de Peninha, incluindo perfis de ícones da geração beat como Allen Ginsberg, William Burroughs (ambos entrevistados pelo autor) e Jack Kerouac, cujo fundamental On The Road Peninha traduziu para a própria L&PM, que para ele é "a editora beat por excelência no Brasil". Bob Dylan, o cara que inspirou todas essas referências no jornalista, ficou de fora porque ganhará um livro só sobre ele neste ano, pela mesma editora.
Na primeira e na terceira partes do livro (esta dedicada às "outras viagens"), sobressai-se um estilo que poderia ser filiado, com alguma liberdade, ao novo jornalismo pela verve literária, pelas observações agudas e pela profundidade de conhecimento sobre os temas. Para Peninha, esse é o resultado de suas influências: Dylan (sempre), os beats e o novo jornalismo, aliado a seu "apreço pelo pop". É assim que ele escreve há 43 anos.
– Ao contrário do que se possa supor, pois sou do tempo em que os repórteres que escreviam dessa forma eram imediata e depreciativamente chamados de "poetas" por seus colegas e, em especial, por seus editores, desde o início em Zero Hora, passando pelo Coojornal e pelo Estadão, sempre me incentivaram a escrever assim, ou melhor, nunca me reprimiram – recorda.
Seu lado cronista está documentado na segunda seção do livro, com textos publicados desde 2017 em sua coluna em Zero Hora, a terceira passagem pelo jornal onde começou a carreira jornalística, em 1976. Se Peninha já costumava se colocar de alguma forma em suas reportagens, nas crônicas lança um olhar mais explicitamente pessoal sobre as próprias histórias, como as 11 vezes em que foi preso ("em seis línguas diferentes"), e também sobre os nossos usos e costumes, sem deixar de lado a atualidade brasileira. A última crônica, de 1º de fevereiro deste ano, é sobre a tragédia de Brumadinho.
– O que tenho a dizer sobre essas crônicas é que, pela primeira vez na vida, escrevo sem sofrer. Sempre sofri, como boa parte dos jornalistas que conheço, por causa dos prazos, dos baixos salários, da pressão do jornalismo diário, e como uma larga porção dos escritores de ofício também, pois que esses eventualmente tremem diante da suposta "imortalidade" do texto impresso em livro. Mas, agora, não.
Unindo textos distantes no tempo e em estilo está a verve de "rebelde com causa", como Peninha se autodefine. Rebeldes prosperam em qualquer época, mas especialmente em tempos de conservadorismo, e não é por acaso que os Estados Unidos dos anos 1980 são o pano de fundo do perfil do poeta e editor Lawrence Ferlinghetti (hoje com cem anos, completados no domingo passado) que abre o livro. Mas o que significa ser rebelde hoje?
– Creio que uma forma de se rebelar é tentar usar o mínimo possível ou então tentar "sabotar" essas malditas redes sociais. Que elas vieram para ficar é claro, mas acho que seu uso deveria ser “profanado” pelos verdadeiros rebeldes, que ainda devem andar por aí – defende Peninha, que usa apenas o YouTube. – Outra forma de conspurcar o papel tão nocivo dessas redes é usá-las para dizer a verdade, já que elas preferem a falsidade.
TEXTOS CONTRACULTURAIS, CRÔNICAS ANACRÔNICAS & OUTRAS VIAGENS
De Eduardo Bueno
Crônicas, L&PM, 296 páginas, R$ 49,90.
Sessão de autógrafos nesta quinta-feira (28), às 18h, na PocketStore Livraria (Rua Félix da Cunha, 1.167), em Porto Alegre.