Cor e leveza contrastam com bailarinos que quase não se tocam e dançam em pequenos grupos, mas ainda assim fazem desabrochar a esperança depois de anos em meio a uma pandemia que devastou o mundo.
Neste fim de semana, o Grupo Corpo volta ao Teatro do Sesi (Av. Assis Brasil, 8.787), em Porto Alegre, para apresentar Primavera, nova coreografia que se passa ao som de 14 canções da dupla Palavra Cantada adaptadas para a música instrumental. Após o intervalo, completando o programa, os bailarinos performam Gira, trabalho inspirado na ritualística da umbanda que o público porto-alegrense pôde ver em 2017. As sessões serão no sábado, às 21h, e no domingo, às 19h, com ingressos à venda no site guicheweb.com.br e na Ótica Diniz Prime (Rua 24 de Outubro, 503), a partir de R$ 130.
Primavera brotou em dezembro de 2020, em plena pandemia. Diante de um momento em que não era recomendável juntar vários profissionais dentro de uma única sala, o coreógrafo Rodrigo Pederneiras decidiu tomar uma ousada decisão: criar uma trilha sonora baseada no trabalho do Palavra Cantada, cujos integrantes, Paulo Tatit e Sandra Peres, são seus conhecidos. Assim, encontrou uma solução para a expressão artística sem causar aglomeração no estúdio.
— Adoro o trabalho deles e tive a ideia maluca de utilizar as coisas que já tinham prontas, só que eliminando todo o lado infantil. Foi um atrevimento grande meu ter proposto isso, mas eles toparam na hora — conta Pederneiras.
Prontamente, o coreógrafo recebeu cerca de 40 músicas da dupla. Sem as vozes, trabalhou em cima das bases das canções infantis, dando uma roupagem totalmente nova. Em seus 36 minutos de duração, a trilha traz uma miríade de estilos musicais que vão do jazz à percussão afro, buscando proporcionar ao público um olhar mais esperançoso diante do caos sanitário e econômico que se instalou ao redor do globo em decorrência da covid-19.
Fora da zona de conforto do grupo, a coreografia de Primavera difere dos moldes das outras apresentações, já que incorpora toda a sensação do distanciamento social. Fora três pas-de-deux (duetos), que são apresentados por casais da vida real, os outros bailarinos dançam em duplas, trios ou quartetos, sem se tocar. Há uma cena envolvendo oito dançarinos, mas ainda assim não há contato físico entre eles.
Para respeitar os protocolos de segurança da covid-19, os ensaios também foram feitos de maneira atípica. Pederneiras lembra que montava uma cena, e os dançarinos ensaiavam em outra sala. Ao todo, os profissionais trabalhavam ao mesmo tempo em três espaços diferentes para não reunir muitas pessoas em um mesmo ambiente e garantir a saúde dos envolvidos.
O resultado de todo esse esforço em uma época ainda incerta para a cultura chega pela primeira vez a Porto Alegre. E apesar de ter sido criado em um cenário não ideal, Pederneiras define Primavera com uma palavra otimista:
— Recomeço.
Na segunda parte do programa dos espetáculos, após o intervalo, os bailarinos apresentam Gira. Aqui, a prioridade não é estabelecer uma relação com o primeiro segmento: é que, dadas as condições em que deveriam ser feitos os ensaios, esta era a coreografia mais conhecida dos bailarinos. Da flor que desabrocha ao rito traduzido em dança, a combinação das coreografias marca a retomada das atividades do Grupo Corpo com ecletismo.