Não há crise que desestimule as artes cênicas no Rio Grande do Sul. Para a temporada 2020 – e até para o ano que vem –, os diretores e seus grupos estão envolvidos em projetos que refletem a diversidade da cena gaúcha, de montagens de clássicos a trabalhos com dramaturgia criada em sala de ensaio.
Conheça, a seguir, os espetáculos em gestação no Estado.
Patrícia Fagundes - Cia. Rústica
“Pensar em projetos em tempos de desmonte, insistir na arte apesar de tudo, vencer o desânimo e apostar no desejo. Há muito de podre no reino, e mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar a nossa filosofia. Dançando com a improbabilidade, queremos montar Hamlet, nosso Hamlet brasileiro no século 21: um jogo para pensar nosso tempo, este tempo violento e absurdo, onde sabemos de tudo mas não sabemos o que fazer, ou sabemos mas não fazemos.
Uma máquina cênica, um mecanismo para questionar e imaginar, para desmontar e recriar, para investigar a lama dos reinos que habitamos. Uma insanidade montar Hamlet na Porto Alegre de 2020. Voltamos ao início do ciclo da Rústica, voltar já mortos para renascer o que for, encarar tantas mortes de frente, fazer teatro, essa coisa velha que morre, está sempre morrendo, despedaça, desmonta e vive outra vez.”
Diego Mac - Macarenando Dance Concept
“Neste ano, a Macarenando seguirá com a pesquisa sobre experiências cênicas imersivas aliada à busca de novas interfaces de relação com o público local. Estão previstas cinco edições inéditas do projeto de terror imersivo Casa do Medo, que desenvolvemos desde 2017. Também faremos a criação da segunda parte da Trilogia do Amor, que iniciamos com nosso espetáculo de estreia, 100 Formas para o Amor (2014). A previsão de estreia é para novembro. Por fim, teremos a montagem do espetáculo Um Barzinho e uma Dança, em dezembro, que será criado a partir do procedimento Dance a Letra e de hits brasileiros no estilo banquinho e violão. Todas as produções da Macarenando para 2020 seguirão uma linha curatorial baseada no afeto, no humor, na experiência e na interação como estratégias para driblar a agressividade do caos social contemporâneo.”
Eduardo Kraemer - Cia. Teatrofídico
“Em 2020, a Cia. Teatrofídico completa 17 anos. Estamos com o projeto de realizar o primeiro espetáculo infantil do grupo. A ideia é uma mistura entre a commedia dell’arte e o universo clownesco. Inspirados pelos textos de Carlo Goldoni, Ben Jonson, Molière, Marivaux, Gozzi e outros, queremos adaptar para o universo infantil os enredos que ridicularizavam militares, prelados, banqueiros, negociantes, nobres e plebeus, com o objetivo de entreter criticamente, provocando o riso com o recurso da música, da dança, com diálogos cheios de ironia e humor. Vamos inclusive contribuir nesta escrita dramatúrgica. Também dentro dessa proposta, queremos montar com dois atores que fariam todos os personagens (Arlecchino, Brighella, Colombina, Dottore, Pulcinella, Pantalone etc.), ao estilo Irma Vap (em que os atores trocam de personagens e figurinos velozmente). Não temos data de estreia, mas vamos tentar realizar para o segundo semestre e concorrer nos editais de ocupação dos teatros públicos.”
Roberto Oliveira - Depósito de Teatro
“Estou começando dois projetos novos. Um deles é A Lista, de Jennifer Tremblay, dramaturga canadense. É um monólogo, e o texto é lindo, sensível e muito tocante. O outro é A Tropa, do carioca Gustavo Pinheiro. Vou dirigir e atuar. Um texto escrito em 2015, premiado, atualíssimo, político e uma bomba. Grande elenco: Evandro Soldatelli, Paulo Roberto Farias, Lucas Sampaio e Gustavo Susin.”
Alexandre Dill - GRUPOJOGO
“Estamos preparando Réquiem para Antígona, um espetáculo sobre Antígona, de Sófocles. Queremos abordar este ano o que é direito e o que é justiça. O grupo é formado majoritariamente por homens, e nós queremos discutir nosso papel opressor para com as mulheres. A ideia é refletir sobre o que é desobediência civil, sobre o direito natural e positivo.”
Jussara Miranda - Muovere Cia. de Dança
“Em 2020, a Muovere desenvolverá o projeto Performance em Dança no Contexto Escolar, no momento em tramitação para ser aprovado. Esta ação contará com oficinas de criação coletiva e mostras abertas em seis cidades do Estado, que terá as coreografias realizadas pelos alunos divulgadas em um canal no YouTube, mais uma vez aproximando a dança da comunicação, como em projetos anteriores da companhia. Para os pequenos, há novidades no projeto Toin Dancinfância, que contará com inovações nos conteúdos artísticos e também operacionais dos espetáculos e oficinas, desenvolvido desde 2012 para os públicos de zero a três anos e também para a segunda infância.”
Marcelo Ádams e Margarida Peixoto - Cia. Teatro ao Quadrado
“Planejamos um 2020 bem produtivo. Queremos concretizar três espetáculos ao longo do ano, ainda sem definições de datas de estreia, e que estão em nossos planos há algum tempo. A Cia. Teatro ao Quadrado vai encenar um espetáculo baseado nas peças curtas de Karl Valentin, ator e dramaturgo alemão admirado por ninguém menos que Bertolt Brecht e Samuel Beckett, que se chamará Não Dói Quando Eu Rio. Direção de Marcelo Ádams, com Margarida Peixoto no elenco.
Com o encenador Clóvis Massa, traremos para Porto Alegre a dramaturgia granguinholesca inédita por aqui do espanhol Esteve Soler, sensação do teatro mundial. O terceiro trabalho terá direção de Luciano Alabarse, um solo com Marcelo Ádams baseado no romance Melancolia, do norueguês Jon Fosse.
São três projetos muito diferentes entre si, se pensarmos no que faremos esteticamente com eles. Entretanto, há algo maior que os une, em termos filosóficos: todos propõem um olhar com estranhamento (na acepção brechtiana do termo) para o mundo em que vivemos e para a forma alucinada como interagimos uns com os outros. Nesse sentido, acreditamos que a função mais nobre do artista é valorizada: acender um refletor sobre a surpreendente espécie humana.”
Eva Schul - Ânima Cia. de Dança
“Iniciei no final do ano passado a montagem do espetáculo Macho Homem Frágil, em parceria com a Eduardo Severino Cia. de Dança, com performance de Eduardo Severino e trilha sonora de Felipe Azevedo. Apresentamos uma célula inicial e estamos tentando um Catarse (financiamento coletivo) para a montagem. Portanto, ainda não temos data de estreia. O espetáculo trata da desconstrução do homem tóxico e de suas fragilidades, procurando desnudar confrontos individuais e sociais.”
Thiago Pirajira - Grupo Pretagô
“Em fevereiro, no Porto Verão Alegre, fizemos a pré-estreia de nosso novo espetáculo, Mesa Farta, que terá temporada de estreia em abril no Teatro Renascença. É uma grande celebração, um banquete à vida e às existências negras. No segundo semestre, prevemos o lançamento de outro espetáculo, ainda sem título, com os atores Bruno Fernandes e Camila Falcão.
Seguindo a trajetória do Pretagô, vamos construir a dramaturgia a partir das biografias do elenco, relacionando as vidas dos artistas à contemporaneidade. Terá muita música, embalada nas ondas do rádio. No final do primeiro semestre, vamos lançar nossa formação pedagógica, com oficinas e cursos. E começaremos a criar neste ano um solo meu como ator, com previsão de estreia para 2021, a partir da vida de Nega Lu, uma força da natureza presente no imaginário de Porto Alegre, inspiração para todas as pessoas LGBT+ que vivem no Brasil. É um ícone dos anos 1980 e da eternidade.”