Os brasileiros Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha exibiram o documentário A Queda do Céu (2024) durante o Festival de Cannes no domingo (19). A obra aborda a cosmologia yanomami e serve de alerta para a humanidade diante das ameaças sobre a Amazônia.
A Queda do Céu estreia em Cannes A produção foi selecionada para estrear na Quinzena dos Cineastas, seleção independente do Festival de Cannes. Baseado em um livro escrito pelo antropólogo francês Bruce Albert e o líder indígena Davi Kopenawa, o documentário começou a ser idealizado em 2017, antes da crise da covid-19.
A câmera acompanha a vida de uma aldeia yanomami no coração da floresta, uma etnia de cerca de 30 mil indígenas que dispõem legalmente do próprio território, mas que regularmente sofrem com as invasões de garimpeiros e madeireiros.
— A floresta está viva. Só vai morrer se os brancos insistirem em destruí-la. (...) Então morreremos, um atrás do outro, tanto os brancos quanto nós. Todos os xamãs vão acabar morrendo. Quando não houver mais nenhum deles vivo para sustentar o céu, ele vai desabar — alerta Davi Kopenawa.
Os diretores documentaram os yanomamis durante quase uma década para o projeto e reconhecem, em entrevista à AFP, que quando chegaram à comunidade, a única coisa que poderiam fazer era deixar se levar pela magia do lugar.
Durante o processo, eles também gravaram um dos rituais mais importantes da cultura yanomami, um reahu, espécie de cerimônia que a aldeia organizou em homenagem ao sogro falecido de Kopenawa.
— Havíamos lido o livro, tínhamos feito vários roteiros — recorda Rocha. — Mas ao viver essa festa em seu interior, foi uma experiência muito forte.
— Nós ficamos um mês convivendo com eles. O filme nasceu ali — acrescenta. — Nos deixamos levar pela força, pelos sonhos desta comunidade.
Durante o ritual, os yanomamis consomem drogas alucinógenas, dançam e cantam. Mas também cantam e sonham durante a passagem pela floresta, durante as tarefas diárias.
O único momento em que a harmonia é quebrada e a tensão é palpável é quando eles recebem notícias de outras aldeias, por frequência via rádio. Notícias de assédio, de invasões, de doenças "trazidas pelos brancos".
— Temos essa forte crença de que o filme, a arte, é uma forma de encontro, uma forma de relacionamento, uma forma de criar outros mundos, outras possibilidades. Acho que os yanomamis também entendem isso — explica Gabriela.
Eryk Rocha é filho do prestigiado cineasta Glauber Rocha (1939-1981), um dos integrantes do Cinema Novo brasileiro, ao qual o filho prestou homenagem em um documentário apresentado em Cannes em 2016.
— É muito emocionante estar aqui novamente, trazendo a luta do povo yanomami, o sonho do povo yanomami — diz o cineasta.