Além de Casa Vazia e Depois de Ser Cinza, há um terceiro longa gaúcho que chega às salas de cinema nesta quinta-feira (3). Voltado ao público infantojuvenil, Despedida combina elementos de fantasia, animação e suspense. O filme estará em cartaz na Cinemateca Capitólio, com sessão promovendo debate com os diretores neste sábado (5), a partir das 18h.
Produção da Pátio Vazio, Despedida é o segundo longa que nasce da parceria entre Luciana Mazeto e Vinicius Lopes. Antes, a dupla dirigiu Irmã (2020). O filme foi o vencedor das categorias Melhor Atriz e Melhor Direção de Arte entre os longas gaúchos do Festival de Gramado 2022, e vencedor de Melhor Longa na Competição Nacional no Fantaspoa 2022.
Rodado em Pelotas e no estúdio Tecna, em Viamão, Despedida conta a história da menina Ana (Anaís Grala Wegner), 11 anos, que acaba de perder a avó. Em meio ao Carnaval, ela e a mãe viajam para o funeral, no interior do Rio Grande do Sul. Por lá, um mundo fantástico se entrelaça com a realidade: Ana se depara com bruxas, bonecas falantes, vilões de fábulas, um cão feroz e falante, entre outras criaturas estranhas.
Além disso, Ana percebe que há uma antiga desavença na família. Ela sente também que sua mãe precisa voltar a se conectar com o mundo fantástico que deixou para trás há muito tempo.
Fábula experimental
O projeto de Despedida começou, inicialmente, como um curta-metragem, lá por 2014. Lopes conta que sentiram vontade de explorar as memórias de infância, lidando com histórias que tratassem de temas relativos ao processo de amadurecimento partindo da fantasia. Consequentemente, trabalhar com o fantástico também seria uma forma de experimentar mais livremente a linguagem do filme que pretendiam fazer.
— Quando começamos a explorar essas ideias, o Despedida foi ganhando mais corpo. O universo do filme foi crescendo, e a gente viu que havia um chão fértil para criar uma história mais complexa, que acabou se tornando esse longa — explica o cineasta.
Para a criação do universo fantástico do Despedida, Lopes conta que eles se inspiraram no grande imaginário construído assistindo a filmes e lendo livros de fantasia na infância. Enquanto ele e Luciana escreviam o roteiro, os dois tiveram produções infantis e adultas como referências, como Alice no País das Maravilhas (1951), Alice (1988, versão do tcheco Jan Švankmajer para a história de Lewis Carroll), Labirinto — A Magia do Tempo (1986), Valerie e a Semana das Maravilhas (1970), A Cara que Mereces (2004) e as animações de Hayao Miyazaki.
Em Despedida, os dois diretores procuraram utilizar a fábula como ferramenta para tratar de temas densos e próprios do processo de amadurecimento. Lopes aponta que Ana passa por vários processos e desafios no filme: a perda de um parente próximo; o lidar com a dor silenciosa da mãe (que ela não entende); a descoberta da avó (primeiro como uma figura mítica, para depois desmistificar e humanizar essa figura); a descoberta de um mundo novo e também do seu papel nessa história de reencontro.
— São temas complexos, e a fantasia e a aventura foram essenciais para conseguir traduzir essas questões em uma linguagem acessível para o público infantojuvenil, e tornar a história mais universal, ampliando a possibilidade de identificação com os espectadores. O "era uma vez" pode ser uma ferramenta muito poderosa para nos ajudar a entender a realidade — explica o diretor.
O cineasta acrescenta que a principal vontade dos dois era explorar a fantasia para criar uma narrativa engajadora e atrativa, mas também complexa, que não subestimasse a capacidade de compreensão e a imaginação das crianças, propondo uma experiência diferente e desafiadora. No caso, a busca de Ana pela avó e a descoberta dos mistérios da sua família e daquele lugar mágico formam a linha principal da história, onde os cineastas aproveitam para experimentar com as possibilidades estéticas e narrativas para criação da fantasia.
Contudo, como ressalta Lopes, a camada fabular se desenvolve sobre uma segunda camada, que é a do drama familiar. Ele destaca que dois filmes que fez com Luciana tratam de questões muito pessoais, partindo de experiências que tiveram na infância e adolescência. Portanto, o aspecto emocional aparece com força em ambas as produções.
— Tanto no Irmã quanto no Despedida buscamos criar uma conexão emocional do público com o drama familiar que se desenrola na tela — diz Lopes. — Enquanto Irmã tinha seu foco no acerto de contas e na impossibilidade de reconciliação, Despedida explora a "descoberta do outro" e a possibilidade de reconciliação, a chance de fazer as pazes com o passado e curar as feridas. É um filme bastante otimista nesse sentido, que aposta no poder da imaginação e no efeito transformador das ações de uma jovem menina sobre todo o universo ao redor dela.