Mateus é negro e vive no Interior, sem a menor possibilidade de seguir o sonho de ser aviador. Um grande esquema acaba lhe oferecendo um emprego em São Paulo em um ferro-velho, com a promessa de dias melhores e pagamentos justos. O que parecia uma luz no fim do túnel se torna um verdadeiro pesadelo: o trabalho análogo à escravidão, em pleno século 21, é o rompante de 7 Prisioneiros, filme brasileiro que esteve em cartaz no cinema e estreia nesta quinta-feira (11) na Netflix.
Com produção de Fernando Meirelles (de Cidade de Deus), o longa-metragem de Alexandre Moratto foi destaque no Festival de Veneza em setembro deste ano, com dois prêmios em mostras paralelas. A emergência do assunto — realidade em diferentes países — tocou os jurados do evento e deverá fazer o mesmo com os espectadores.
Esta batalha é centrada na luta por sobrevivência de Mateus (vivido por Christian Malheiros, do seriado Sintonia) e dos outros seis prisioneiros contra o administrador do ferro-velho, Luca (Rodrigo Santoro). O longa traz uma reflexão sobre o quanto o poder tem a capacidade de corromper cada pessoa.
— O Luca pode ser comparado a qualquer partido político que se perdeu. Esse dilema moral do que somos e como podemos mudar conforme a circunstância em que estamos é o mais interessante. Se fosse só um filme sobre oprimidos e opressores já seria uma discussão necessária, mas essa virada de humanizar um monstro nos mostra o quanto, algumas vezes, as pessoas não têm escolha — afirma Meirelles.
Esperança
A discussão traz uma atmosfera pesada ao filme. Santoro conta que, para compor seu personagem, esteve próximo de casos reais em São Paulo e no Rio de Janeiro e que uma preocupação foi não provocar uma espécie de "redenção" a Luca, já que seus atos são injustificáveis.
— Trazer camadas distintas para o Luca ajudou para que não ficássemos nesse conceito de quem é mocinho ou vilão. Ele é uma peça de uma grande engrenagem de estrutura social, um pedaço de uma estrutura de poder perversa — afirma Santoro.
Ao mostrar a escravidão moderna, 7 Prisioneiros acaba refletindo sobre o Brasil atual e a falta de políticas públicas para o problema. Na visão de Malheiros, o filme acaba expondo feridas "que não conseguiram ser sanadas", ao relatar um "reflexo do Brasil colonial" que segue visível:
— É preciso colocar isso à tona e achar caminhos, respostas. Seja em uma comédia ou com este drama pesado que fizemos, o cinema acaba cumprindo seu papel social, que é buscar a luz no fim do túnel: ver a realidade e achar o caminho de mudança.