Provavelmente este texto seria vetado em um Conselho Jedi – e contenha erros imperdoáveis para um fã de Star Wars. Mas o objetivo aqui é justamente fugir da análise dos conhecedores da saga, oferecendo um ponto de vista alternativo sobre Star Wars: Os Últimos Jedi. Só quando a ideia de uma resenha assim começou a circular pelo 2º Caderno percebi que há certo exotismo em nunca ter assistido a qualquer coisa da franquia. Até segunda-feira, eu ainda gozava dessa condição – e não ganhei muito ao perdê-la.
Star Wars pode ser visto como um novelão com episódios esparsos, mas cada capítulo – ou filme, nesse caso – funciona separadamente. Pelo menos é o caso deste Os Últimos Jedi. É claro que saber de tudo que veio antes na saga aumentaria minha compreensão sobre alguns fatos e personagens, mas os roteiristas aparentemente respeitam a presença de neófitos na sala de cinema. No filme, a Resistência, último foco da cultura Jedi, está ameaçada pela sanha totalitária de Snoke, líder supremo do lado sombrio da força. Para salvar a Resistência, a jovem Rey tenta reagrupar o sábio e isolado Luke Skywalker a seu grupo. Só senti falta de entender porque Rey tem uma ligação paranormal com Kylo Ren, pau-mandado de Snoke, mas nada que uma busca posterior na internet não pudesse me esclarecer.
Os Últimos Jedi tem momentos interessantes. Não é novidade que George Lucas leu Joseph Campbell (1904 – 1987) e estudou arquétipos para desenvolver sua saga. Na melhor cena do longa, Rey se embrenha na escuridão e afunda na água para conhecer o que há no lado sombrio da ilha habitada por Skywalker – trevas e água são símbolos recorrentes do inconsciente em outras narrativas. Lá, ela precisa encarar seu maior drama íntimo: a dor por não conhecer sua origem.
Cartas do tarô intergaláctico
Os arquétipos do filme, no entanto, são na maior parte esquemáticos, quase caricaturas dos arcanos do tarô – objeto de estudo de Campbell. Rey é a Estrela, símbolo máximo da esperança e da renovação; Leia, a Imperatriz; Snoke, o Diabo (com Rey e Kylo Ren a seus pés); e Luke Skywalker, o Eremita. A visita de Rey a Skywalker também lembra a estadia de Beatrix Kiddo na casa de Pai Mei em Kill Bill: Vol. 2 (2004), embora o mestre jedi não tenha bigodes – nem graça – tão grandes.
Apesar dos personagens esquemáticos, o filme capta a atenção do público em suas mais de duas horas com batalhas espaciais, perseguições com animais fantásticos e duelos com sabres de luz. Tudo isso funciona muito bem, ainda mais em uma sala escura, com som de alta qualidade, projeção tridimensional e cadeiras que tremem. É sem dúvida bom entretenimento para quem gosta de filmes de ação e aventura. Já eu lamentei ter saído do cinema com a orla do Guaíba já deserta depois do pôr-do-sol. Que a força continue ao lado dos fãs de Star Wars – mas que a luz também não deixe de brilhar para quem prefere ficar fora da sala de projeção.