Nudez remete a um corpo despido, não há dúvida. É a primeira coisa que vem à cabeça, afinal. Mas para o músico, compositor e artista visual Bebeto Alves, que morreu na madrugada desta segunda-feira (7), as coisas não eram assim tão encaixotadas. Nu propõe um novo olhar para o conceito de nudez, que deixa de ser a ausência de roupa e torna-se ausência de corpo.
A mostra, que estreou com entrada franca na última terça (1º) e segue em cartaz até o dia 11 de novembro, das 9h às 17h, na Galeria Municipal de Arte Liana Brandão (Rua Osvaldo Aranha, 934), em São Leopoldo, traduz a mudança de paradigma por meio de uma série de 20 fotografias feitas por Bebeto nos últimos três anos. São imagens de peças de roupas vazias, sem nenhum corpo para vesti-las, em uma espécie de nu artístico às avessas.
— As imagens querem dizer muitas coisas. A inspiração pelo nu dá-se pelo avesso, pela ausência, pela abstração de um corpo pelo seu invólucro, as roupas, que nos representam e criam identidades — explicou o músico que, há cerca de 10 anos, passou a enveredar pelas artes visuais por meio da fotografia, em sua última entrevista a GZH. — Sempre fui reconhecido como músico e compositor, então, sempre fui o foco das fotografias. Foi uma arte que se desenvolvi paralelamente, muito por conta disso.
A seleção das imagens que integram a exposição ficou por conta do historiador da arte José Francisco Alves, que assina a curadoria de Nu. Para ele, a mostra é mais uma prova da versatilidade artística de Bebeto Alves, um dos expoentes da música popular gaúcha, com mais de 30 discos lançados e duas vezes vencedor do Prêmio Açorianos de Música, que se firma com louvor também em outros nichos artísticos.
— O Bebeto músico tem uma multiplicidade muito grande, que vai desde o rock, o pop, até trabalhos inteiros em cima do que seria a música nativista. Ele tem uma energia criativa muito forte, que não sossega, e faz mudar a sua linguagem de uma forma coerente, que se entende. Isso se expressa também no trabalho dele nas artes visuais — avaliou o curador à época da abertura.
O Bebeto artista visual também era conhecido do público. Afinal, o músico assinou mais de uma dezena de exposições, entre mostras individuais e coletivas. A fotografia foi onde se encontrou, mas, inquieto, ele nunca fez mais do mesmo.
Em Nu, agregou novas técnicas às imagens capturadas por meio da manipulação digital. Como resultado, fotografias que confundem e instigam o olhar do espectador: ora parecem capturas do cotidiano, ora parecem colagens e ora parecem pinturas, podendo ainda parecer tudo isso ao mesmo tempo.
— Com a sua inquietude, Bebeto investiga tudo o que as ferramentas de manipulação de imagem podem dar, até o ponto em que chegou agora. A novidade é que, nestas fotografias, ele usa softwares de desenho. Ele já fazia um trabalho de manipulação com sobreposição de efeitos, criando camadas, mas agora está intervindo nas imagens através do desenho digital — explica José Francisco Alves.
Aos 68 anos, Bebeto Alves não parou de criar nem mesmo nos últimos dias, nos quais esteve sob internação hospitalar para tratar problemas de saúde. Conversou com a reportagem de GZH diretamente do hospital, com a ajuda da esposa, Simone Schlindwein, e assumiu-se como um criador compulsivo:
— No ano passado, fui diagnosticado com uma doença grave e houve uma mudança muito grande de perspectiva. Desde então, sigo em tratamento, entre idas e vindas ao hospital. Mas estou o tempo todo em processo de criação. No hospital ou em qualquer lugar, nunca deixei de criar.