O hábito de colecionar figurinhas apaixonou várias gerações de brasileiros. Na primeira metade do século passado, essa prática foi estimulada pela marca de sabonete Eucalol, produzida pela Perfumaria Myrta S/A, que distribuía figuras estampadas junto com o produto para alavancar as vendas. A empresa foi fundada no Rio de Janeiro, em 1917, pelo imigrante alemão de origem judaica Paulo Stern. A princípio, vendia artigos de outras companhias, como sabonete Marfim, pó de arroz Bijou e água de colônia Parisiense. Em 1923, com a chegada de Ricardo (irmão de Paulo) ao Brasil, os Stern começaram a fabricar uma linha própria de higiene pessoal, que incluía talco e pasta de dente, além de sabonete.
A bem da verdade, a iniciativa de agregar figurinhas às embalagens foi adotada para superar uma dificuldade de mercado. No primeiro momento, o sabonete não teve boa aceitação, e a razão disso é, no mínimo, curiosa. As pessoas estavam acostumadas com sabonetes que vinham nas cores rosa e branco, e não verdes, como o Eucalol (o nome tinha a ver com a essência eucaliptol, de fragrância penetrante, usada na composição do produto). Para reverter o quadro, foi criado um concurso de poemas. “Banho, para uns é de sol/Outros de mar o preferem/Uns banho de igreja querem/Mas eu cá de todo me assanho/Se penso em tomar um banho/ Com sabonete Eucalol” – esse foi o poema vencedor, com direito a prêmio em dinheiro (um conto de réis) e publicação na imprensa sob os auspícios do Eucalol.
Porém, a jogada de marketing não surtiu o efeito desejado e foi preciso buscar outra solução para cativar os clientes. Por essa época, colecionar figurinhas estampadas estava na moda na Europa. Lá, havia a tradição das estampas da Liebig, fabricante de caldo e extrato de carnes, desde 1872, incorporada por marcas de chocolates e cigarros. Sabendo disso, os irmãos Stern instituíram as “estampas Eucalol” em uma última tentativa de salvar as vendas do sabonete (com o tempo, as figuras acompanharam outros produtos, como creme dental e fixador de penteado). Acredite: foi um sucesso estrondoso.
De 1930 a 1957, a Perfumaria Myrta S/A lançou 54 séries de figurinhas, totalizando 2,4 mil estampas. Impressas em cartolina, elas abordavam temas de apelo nacional, como “A Vida de Santos Dumont”, “Aves do Brasil” e “Lendas Brasileiras”, alternados com outros de inspiração universal, a exemplo de “Dom Quixote” e “Compositores Célebres” (neste caso, incluindo o brasileiro Carlos Gomes). Um episódio insólito aconteceu na Segunda Guerra Mundial: em uma série de bandeiras de países, as da Alemanha, da Itália e do Japão (que formavam o eixo inimigo) foram queimadas no pátio da fábrica. Colecionadores que reclamaram dos espaços vazios em seus álbuns receberam de consolo cartões com a indicação de que tais estampas não haviam sido disponibilizadas.
As estampas Eucalol fizeram parte da vida brasileira por quase três décadas. Em Porto Alegre, o acervo do Museu Joaquim José Felizardo conta com cerca de 600 avulsas, além de cinco álbuns incompletos, totalizando mais de mil figurinhas. É uma relíquia que remonta a uma época em que as técnicas de marketing não estavam tão evoluídas como hoje e dependiam da intuição e do arrojo dos empreendedores.