Quem nasceu no início dos anos 1950 – como eu – certamente lembra de fatos e experiências vividas pela primeira vez que, hoje, são até difíceis de acreditar. Por exemplo: eu recordo o primeiro fogão a gás que chegou a minha casa para substituir o velho fogão a lenha. Sim, era um Wallig de quatro bocas, sem o “visoramic” (aquele vidro na porta do forno que permite ver o seu interior). Isso foi lá pelo fim dos anos 1950, e o tal vidrinho só seria novidade na década seguinte.
Lembro também do meu pai descarregando do carro uma enorme caixa de papelão que continha o nosso primeiro televisor. Ele ia se ausentar de casa por algum tempo, acompanhando o governador Brizola numa viagem à Europa, e comprou a televisão para que nos distraíssemos durante a sua ausência. Era um – hoje jurássico – aparelho Teleunião, com gabinete de madeira, uma tela meio arredondada, um seletor de canais mecânico que fazia um barulhão quando era girado – o que era um tanto inútil, porque no início dos anos 1960 só havia um canal, a TV Piratini, canal 5.
Tinha, também, no painel frontal, botões giratórios para quatro comandos: vertical, horizontal, brilho e contraste; além dos botões de volume e liga/desliga. Eventualmente a imagem sumia e ficavam uns riscos pretos e brancos, claro, em zigue-zague, que só desapareciam acionando o horizontal. Acontecia, ainda, de vez em quando, de a imagem rolar na tela, como se fosse um aparelho caça níquel, daqueles com desenhos de frutinhas. Aí, nessa ocasião, era o vertical que deveria ser ajustado. De modo que ver televisão era um infindável senta e levanta. Ah, e tinha uma manha na hora de desligar: caso o botão de brilho não fosse levado até o limite máximo de luminosidade, ao apagar o vídeo, ficava um ponto luminoso no centro da tela, que com o tempo mancharia irremediavelmente o tubo de imagem. A antena era com duas hastes telescópicas de alumínio montadas numa base; deveria ser movimentada sobre o aparelho até que se encontrasse a imagem mais nítida e sem “fantasma”. Fácil não era, mas muito divertido.
Já contei aqui a alegria que me proporcionou a aquisição do meu primeiro rádio portátil. Presente de 15 anos, comprado na Casa Victor, em 1966. Bem mais tarde, quando me casei com Loraine, em 1974, e fomos morar num apartamento, não tínhamos nenhum aparelho de som nem um rádio. O silêncio e a falta de música não duraram muito. Contrariando o bom senso – e o orçamento apertado de recém-casados –, cometi um desatino: entrei na Casa Masson, subi até a sobreloja e comprei, parcelado em 10 vezes, um fantástico rádio Transglobe, da Philco, com nove bandas de sintonia, inclusive FM – o que, então, era uma grande novidade, já que garantia uma qualidade de som até então incomum nos receptores convencionais.
É verdade que quase apanhei ao chegar em casa, mas fui redimido pela boa música que nos embalava na hora de dormir e pelas notícias logo ao acordar. Algum tempo depois, tivemos condições de aperfeiçoar o som lá de casa, agregando à estante o que havia de bacana, para o nosso bico, em forma de som: um amplificador Gradiente Lab 40, um toca-discos Garrard e duas potentes caixas de som. Bah! Que alegria!
Às vezes fico pensando... Será que, ante a avalanche de aparelhos tecnológicos, os jovens de hoje ainda conseguem manter a surpresa diante de alguma novidade. Talvez a velocidade com que as coisas evoluem agora já não permita o singelo prazer de degustar uma coisa de cada vez... Não tenho certeza.