Festa de forte tradição popular tanto em Portugal como nas ilhas dos Açores, o Carnaval aqui chegou quando Porto Alegre ainda era uma vila. Tinha tal importância que, em 1809, o Senado da Câmara solicitou ao governador da capitania que a brincadeira fosse prorrogada por mais 15 dias depois da Páscoa, “para neles poderem os ditos moradores fazerem toda a qualidade de festejos públicos com máscaras e farsas”, conforme ata da Câmara de 7 de fevereiro daquele ano. Pedido feito e atendido.
O Entrudo, festa de então consagrada a Momo, assumia, por vezes, um caráter brutal, com os mascarados invadindo as casas dos amigos sem prévio aviso nem licença, para a pratica generalizada de esguichar água, dos limões de cheiro abastecidos com o líquido, nos residentes, quando não encharcavam tudo com o conteúdo de baldes e pequenas pipas de madeira.
Uma multa, imposta pela Câmara no dia 6 de março de 1811 demonstra que a paciência das autoridades com as estripulias tinha limite, e nem sempre elas eram toleradas. Nesse caso, foram punidos 13 cidadãos “por andarem galopiando dentro da Vila” no dia 26 de fevereiro, abuso relacionado, provavelmente, aos festejos carnavalescos.
Em 1832, os inimigos do Entrudo tiveram seu porta-voz no padre e vereador Juliano de Faria Lobato, que propunha à Câmara e faria aprovar uma postura, segundo ele copiada das normas vigentes no Rio de Janeiro, com o seguinte teor: “Fica proibido o jogo do Entrudo dentro do município; qualquer pessoa que o jogar incorrerá na pena de 2 mil réis a 12, e não tendo com o que satisfazer, sofrerá de dois a oito dias de prisão; sendo escravo, sofrerá oito dias de cadeia, caso seu senhor o não mandar castigar na cadeia com cem açoites, devendo uns e outros infratores ser conduzidos pelas rondas policiais à presença dos juízes de paz, para os julgarem à vista das partes e testemunhas que presenciarem a infração”.
O Entrudo foi proibido no princípio de 1834, mas foram necessários muitos anos para que a letra da lei superasse o costume arraigado. Segundo Athos Damasceno, autor de O Carnaval Porto-alegrense no Século XIX, entre 1858 e 1867, “praticamente sumira da cidade o nefasto uso da ‘molhadela tradicional’. Mas, em 1869, o Entrudo renasceria das cinzas e reapareceria triunfalmante na urbe escandalizada”.
Pedidos de providências às autoridades e para que as multas fossem efetivas não impediram a continuação das suas práticas, que reviveram com sucesso pelo menos até o Carnaval de 1874, ano que demarca o início de um novo ciclo: o dos cortejos das sociedades Esmeralda e Venezianos, que passaram a disputar entre si as atenções e simpatias da população de Porto Alegre.
Fonte: Porto Alegre - Guia Histórico, de Sérgio da Costa Franco