O texto a seguir é uma colaboração de Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite, pesquisador e coordenador do setor de imprensa do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa:
“A imprensa cumpriu um papel importante na fase pré-revolucionária e durante a Revolução Farroupilha (1835-1845). A partir do surgimento, em 1º de junho de 1827, do primeiro jornal da Província de São Pedro – o Diário de Porto Alegre – facções políticas, como liberais moderados, restauradores (Caramurus) e liberais exaltados (Farroupilhas), passaram a expressar suas ideias por meio da imprensa da Capital e do Interior. Estes jornais foram o embrião do jornalismo político-partidário no Estado.
Os jornalistas Carlos Reverbel (1912–1997) e Elmar Bones, autores do livro Luiz Rossetti: o Editor sem Rosto & Outros Aspectos da Imprensa no Rio Grande do Sul (1996), informam acerca dos anos de 1827 a 1850. ‘Neste período, foram lançados 61 jornais em Porto Alegre e 37 em outros pontos da então província, acrescido de três títulos de jornais fundados pela República Rio-Grandense.’ De 1838 a 1843, circularam os seguintes órgãos oficiais: O Povo (Piratini: 1838–1839 e Caçapava: 1839–1840); O Americano (Alegrete: 1842–1843) e Estrella do Sul (Alegrete: 1843).
Há 184 anos, o primeiro óbito, ao iniciar a Revolução Farroupilha, na madrugada de 20 de setembro de 1835, no combate da Ponte da Azenha, foi o do jornalista Antônio José Monteiro, o ‘Prosódia’, responsável pelo jornal legalista O Mestre Barbeiro (1835). Considerado o menor jornal publicado na imprensa gaúcha, segundo o escritor Sérgio Dillenburg, media: 16x11 cm.
O Noticiador (1832–1836), fundado na cidade de Rio Grande, foi o primeiro jornal a ser publicado no interior da província. Seu redator e criador, Francisco Xavier Ferreira (1771–1838), o ‘Chico da Botica’, foi um dos responsáveis pela estruturação da maçonaria na província. Criticou o tráfico negreiro e combateu o centralismo do Império. Ele presidia a nossa Assembleia Legislativa, na ocasião em que a Capital foi retomada pelos imperiais em 15 de junho de 1836. Enviado para o Rio de Janeiro, ele faleceu na prisão.
Criado na fase pré-revolucionária, O Constitucional Rio-Grandense (1828–1831), dirigido por Vicente Ferreira Gomes, o ‘Carona’, defendia a monarquia constitucional. Trisavô da jornalista Célia Ribeiro, foi objeto de pesquisa dela que resultou no livro O Jornalista Farroupilha: Vicente Ferreira Gomes 1805-1837. A presença do imigrante teuto na Revolução Farroupilha (1835–1845) está registrada no jornal O Colono Alemão (1836). Criado por Hermann Von Salisch (1797–1837), o jornal insuflava os colonos a lutar na guerra e era impresso em Porto Alegre, pois não havia tipografia em São Leopoldo, cidade onde circulava.
Importante destacar o nome da primeira jornalista no Brasil, a gaúcha Maria Josefa Barreto Pereira Pinto (1787–1837), nascida em Rio Pardo ou, segundo outros historiadores, em Viamão. Redatora do jornal legalista Belona e irada contra os sectários de Momo (1833–1834), defendia a volta de dom Pedro I, que, em abril de 1831, havia abdicado ao Império.
Quanto à circulação de jornais legalistas, como O Campeão da Legalidade (1837–1839), Walter Galvani, em seu livro A Difícil Convivência (2013), registra que centros urbanos, como Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre, durante a guerra, permaneceram, em grande parte do tempo, nas mãos das forças imperiais. A ideia de que toda a província aderiu à causa farroupilha é um equívoco. Além do jornalista, outros historiadores publicaram importantes trabalhos sobre esta temática.
Em Piratini, primeira capital farroupilha, no dia 1º de setembro de 1838, foi impresso o primeiro número do jornal O Povo, órgão oficial da República Rio-Grandense. A sua tipografia foi adquirida no Uruguai com a venda de 17 escravos por Domingos José de Almeida (1797–1871). Totalizando 160 edições, O Povo foi organizado pelo próprio Domingos José de Almeida, que foi ministro da Fazenda e depois do Interior da República Rio-Grandense.
Os italianos Luigi Rossetti (1800–1840) e João Batista Cuneo (1809–1875) foram os seus redatores. Em função da logística da guerra, a Capital foi transferida para Caçapava, em 1839. Neste período, O Povo exibia, em seu cabeçalho, ‘Liberdade, Igualdade e Humanidade’, inspirado no lema da Revolução Francesa de 1789. Cientista e militante político, o conde Lívio Zambeccari era natural da Bolonha e escreveu nos jornais O Recopilador Liberal (1832–1836), O Continentino (1831–1832) e O Republicano (1834), que eram impressos em Porto Alegre.
Grande parte destes jornais está sob a guarda do Museu da Comunicação Hipólito José da Costa e do Instituto Histórico e Geográfico do RS que, por meio de seus acervos, contribuem com a produção historiográfica do Brasil e do Exterior".