A memória é tudo para o ser humano. Eu, você, ninguém é nada sem suas lembranças. Que bom que estão aí os museus, os livros, as fotografias, as revistas e os filmes para nos ajudar a lembrar e a nos diferenciar das máquinas e dos robôs. E tem este espaço aqui, que conserva tesouros minerados por jornalistas e por leitores que não querem participar dessa geração digital do esquecimento.
Pode ser apenas uma impressão minha, mas sinto uma resistência de muita gente em entregar completamente os pontos para as nuvens. Parece que coisas físicas, tipo fotos, revistas, livros e jornais lutam e resistem a essa avalanche digital. Dia desses, estava no correio para despachar duas cartas para amigos quando vi uma jovem com várias cartas. Eram envelopes lindos, artesanais. Perguntei onde comprara e ela disse que era produção própria. Ela faz parte de um grupo chamado As Loucas da Papelaria. Confesso que também não resisto a uma boa papelaria.
Em meu antigo bairro, o Floresta (em Porto Alegre), havia uma papelaria que ficou em minha memória. A Bolívar. Ficava na Cristóvão Colombo, quase diante da Gaspar Martins. O cheiro de papel e lápis lá dentro era maravilhoso. Prateleiras e prateleiras de papéis. A coisa de sentir, do tato, não pode desaparecer. Agora, há poucos dias, fui buscar umas fotos em uma loja de artigos fotográficos e senti que havia um movimento além do normal. O pessoal da loja afirmou que o pedido de cópias fotográficas aumentara de 10 mil para 16 mil por mês. Um aumento de 60%.
A memória, o fundamento de tudo, parece precisar da coisa material para despertar, ser plenamente ativada, para ser integral, genuína. Esse material, não virtual, pode ser uma cadeira, um rádio, um copo, uma escada, uma calçada ou uma velha caixa de sapatos abarrotada de fotos amareladas.
Sinto como se houvesse um movimento, uma brigada do papel, apesar da quebradeira de livrarias. Acredito que haverá uma volta da livraria de bairro. É loucura? Não sei. Por enquanto, temos nossos abrigos para guardar nossas memórias.
Colaboração de Inácio Knapp
Aproveito o texto esperançoso e confiante do Knapp para recuperar esta imagem de uma sala de aula da década de 1950, que nos foi gentilmente enviada pelo leitor Carlos Adib. A ilustração de Ernest Zeuner (1868-1950) faz lembrar como era o ambiente de uma escola no período da nossa infância.
Nesta época de volta às aulas, é inevitável sermos invadidos pela nostalgia e recordarmos o grande momento que era o início do ano letivo. Começava nas livrarias e papelarias nas quais, ávidos, acompanhados de nossos pais, adquiríamos o material escolar: livros, cadernos, lápis – alguns com a tabuada impressa, outros com uma borracha no topo –, estojo, pasta, merendeira... e como não lembrar do agradável aroma da sala de um jardim de infância? Cheiro de massa de modelar, tinta têmpera e saudade...