Por Pedro Haase Filho, interino
O jornalista, escritor e roteirista porto-alegrense Rafael Guimaraens, autor de vários livros baseados em fatos históricos da cidade, tem especial predileção por um sítio: a escadaria da Rua João Manoel, que liga as ruas Duque de Caxias e Coronel Fernando Machado, nas cercanias do Alto da Bronze, no Centro Histórico de Porto Alegre.
Fascinado pelas formas que delineiam a construção, o local chega a lhe aguçar a criatividade de roteirista ao lembrar que, certa vez, “num rompante poético, comparei a escadaria a um filme romântico, que inicia com uma árdua caminhada, chega na virada dramática em que cada um vai pro seu lado e se reencontram no topo”.
Conhecida como “A Escadaria do Amor”, os três primeiros lances, de baixo para cima, são centrais e ladeados por muretas baixas, pilaretes e ajardinamento. A partir do terceiro lance, os degraus descentralizam-se e, divididos, evoluem pelas laterais, com peitoril em ferro trabalhado. Os degraus sobem contornando e se unem novamente para outro lance, centralizado na escadaria, chegando ao belvedere. A mureta, balaústre que delimita a escadaria, e o belvedere, transversalmente, são em alvenaria, com tratamento em vazados e balcão de apoio, diferenciando-se das muretas ao nível da Rua Coronel Fernando Machado, que são lisas.
A descrição anterior do logradouro consta do trabalho A Arquitetura de Christiano de la Paix Gelbert em Porto Alegre (1925-1953), apresentado por Taísa Festugato ao Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional da UFRGS. La Paix Gelbert era desenhista-chefe da prefeitura na época e foi autor de vários outros projetos marcantes da cidade, como o Viaduto da Avenida Borges de Medeiros, o Centro de Saúde Modelo e o HPS.
Atento às efemérides da cidade, Guimaraens lembra que a escadaria completa 90 anos de existência em 2019. Durante décadas, o local atraiu namorados pela extraordinária visão da baía do Guaíba e pelo recanto escavado entre as escadas paralelas do segundo nível, que permitiam alguma intimidade aos casais.
Hoje, a realidade é bem diferente. A rápida urbanização da cidade cercou a escadaria de prédios altos, que a espremeram e roubaram a vista do Guaíba. Tombada como Patrimônio Histórico, a “Escadaria do Amor” sofre com o vandalismo e com o descaso do poder público. Recentemente, passou a contar com a mobilização da comunidade do entorno, com ações de limpeza e atividades de convívio, procurando mostrar à população a importância de preservar os espaços públicos de caráter histórico.