Cenas que há cerca de um mês pareciam distantes da realidade dos brasileiros agora são corriqueiras na entrada de hospitais, lojas e supermercados — inclusive no Rio Grande do Sul. É o caso dos termômetros digitais infravermelhos, semelhantes a um controle remoto ou a uma pequena pistola de plástico, usados na tentativa de detectar possíveis casos de infecção e, com isso, evitar a propagação do coronavírus.
A adesão a esses equipamentos chamou a atenção do mundo quando a pandemia estourou na China. Imagens de pessoas uniformizadas apontando os aparelhos em direção à testa de viajantes em aeroportos e estações de trem se tornaram icônicas.
Por aqui, a adoção do método de controle também vem ocorrendo, ainda que de forma mais limitada. Empreendimentos como a rede de supermercados Asun praticam a medição há cerca de três semanas em todas as suas lojas, situadas em Porto Alegre, na Região Metropolitana e no Litoral, entre outras medidas de segurança (como disponibilização de álcool gel, uso de máscaras e limpeza constante de carrinhos e cestinhas, entre outras iniciativas).
— Faz uns 20 dias que compramos 30 termômetros. Cada uma das nossas unidades recebeu um. Entendemos que é mais uma forma de reforçar a segurança, além das ações que já estamos adotando. Temos sido muito cuidadosos, desde o início — afirma o proprietário, Antonio Ortiz, que se orgulha de ter sido "o primeiro a instalar pias na frente das lojas para que as pessoas possam lavar as mãos".
Quanto aos termômetros, nenhum funcionário começa a trabalhar sem antes registrar a temperatura, e os clientes também são convidados a passar pelo exame ao acessar os mercados. A estratégia, segundo o gerente de Gestão de Pessoas da rede, Duilio Cerva Neto, vem sendo bem recebida.
— O aparelho, que é certificado pelo Inmetro, emite uma espécie de laser. Não há nenhum contato com a pessoa, e o resultado sai na hora. Se a temperatura estiver acima do normal, soa um bipe diferente. Foram poucos casos até agora. Se é com um colaborador, a gente diz para ir para casa. Se é um cliente, não podemos simplesmente impedir a entrada, porque poderia ser grosseiro e porque não é um médico tirando a temperatura. Mas a gente orienta a procurar atendimento de saúde na hora. O pessoal está gostando, porque dá maior segurança — diz Neto.
Infectologistas como Renato Cassol, coordenador do Controle de Infecção do Hospital Nossa Senhora da Conceição, na Capital, consideram a iniciativa válida. Cassol lembra que o Grupo Hospitalar Conceição (GHC) também vem utilizando esse tipo de expediente entre os visitantes.
— É uma forma de rastreio de pacientes febris bem eficaz, já instituída e testada em diversos aeroportos do mundo todo. Sabemos que febre é o sintoma mais frequente em covid-19 — afirma o especialista.
Ainda assim, esse tipo de alternativa, por si só, não é garantia de 100% de eficácia, embora seja "melhor do que nada", nas palavras de Cassol. É importante buscar marcas com certificação e seguir as recomendações do fabricante para o manuseio correto do equipamento.
Os dispositivos são munidos de sensor infravermelho, que mede a temperatura a partir do calor que emana da superfície corporal. Se não for bem posicionado, pode fazer leituras equivocadas e induzir a erros.
Além disso, se a pessoa cuja temperatura está sendo medida tomou algum tipo de antitérmico, não será identificada como possível infectada, mesmo que tenha covid-19. Outra ressalva diz respeito aos sinais da doença. Nem sempre a febre está entre eles, embora apareça na maioria dos casos. Por isso é importante que, nos locais onde há medição, sejam incentivadas medidas complementares, a exemplo do que faz a rede Asun.
— Se o aparelho for preciso, é uma maneira de detectar pessoas doentes. Tem sido usado no mundo inteiro e funciona como uma triagem inicial. No entanto, algumas vezes, a transmissão do vírus pode ocorrer a partir de pessoas sem sintomas. Ou seja, esses termômetros podem ser ferramentas úteis, mas devem ser aliados a outras medidas, como uso de máscara e de álcool gel — ressalta Luciano Goldani, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Quem passar imune por um desses dispositivos não deve deixar os cuidados de lado.
— As pessoas passam no teste, acham que não têm o vírus e relaxam nas medidas de distanciamento, lavagem de mãos, etc. Isso é o que não pode acontecer — reforça Goldani.
Como saber se a medição é confiável
- O equipamento deve ser certificado. O selo do Inmetro, por exemplo, é um bom indicativo de que passou por testes e aferições.
- É importante que o manual do fabricante seja seguido à risca por quem estiver fazendo a triagem, respeitando a distância recomendada entre o aparelho e a testa da pessoa
- A presença de cabelos, suor ou sujeira na testa pode prejudicar a medição, assim como medicamentos utilizados previamente (como antitérmicos)
- Mesmo que o aparelho detecte temperatura normal, isso não significa que a pessoa não tem covid-19, porque pode estar assintomática e nem sempre há febre
- Por isso, é necessário ter em mente de que nada disso substitui medidas de prevenção como a lavagem frequente de mãos e o uso de máscara