O contato com superfícies contaminadas ou com gotículas respiratórias de pessoas infectadas são os principais meios de contágio do coronavírus. No entanto, a possibilidade de outro tipo de transmissão tem ganhado maior relevo entre pesquisadores e médicos nas últimas semanas. É o contágio por aerossóis, ou seja, micropartículas invisíveis a olho nu expelidas por tosse, espirros ou até fala, que conseguem se mover pelo ar e permanecer nos ambientes por alguns minutos — ou talvez horas.
A chance de transmissão do coronavírus pelo ar não chega a ser uma novidade. O uso de máscaras com filtros mais potentes para profissionais da saúde, como a N95, por exemplo, foi indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em situações geradoras de aerossóis desde o início da pandemia. O tema, no entanto, tornou-se mais conhecido pelo público em geral desde o início da semana, quando um vídeo da televisão japonesa NHK World começou a circular pelas redes sociais.
Com áudio em japonês e legendas em inglês, o vídeo mostra como os aerossóis podem se propagar e se manter por alguns minutos em um ambiente fechado depois de um espirro ou tosse. As imagens também demonstram que até mesmo uma conversa entre amigos com tom de voz mais alto pode disseminar as micropartículas. Porém, não há estudos categóricos que demonstrem o grau de relevância da disseminação do coronavírus pelos aerossóis.
Nos Estados Unidos, também circulam notícias alarmantes baseadas na proliferação de aerossóis. O jornal New York Post chegou a publicar que o distanciamento social de dois metros poderá ser considerado inadequado em breve, com a chance de ser estendido a até oito metros. Trata-se de uma interpretação equivocada de um artigo publicado no Journal of the American Medical Association. O estudo afirma que o coronavírus pode se propagar pelo ar por alguns metros em situações hospitalares específicas, mas a pesquisa tem como objetivo discutir protocolos adequados dentro do sistema de saúde, como uso de máscaras e triagem de pacientes. Em nenhum momento o estudo dá indicações de que as recomendações hospitalares devem ser estendidas a outros ambientes.
— O que se pode dizer é que esse aerossol é irrelevante ao ar livre. Se você mantiver o distanciamento de dois metros entre as pessoas, em um ambiente aberto, não há por que se preocupar. Os problemas começam quando a gente fala de ambientes fechados, principalmente em ambientes hospitalares — explica o médico Wladimir Queiroz, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).
No vídeo da televisão japonesa, grandes nuvens de aerossóis se dissipam pelo ambiente depois de um espirro ou tosse. Queiroz observa que esse volume de partículas pode ser bastante minimizado por meio da etiqueta respiratória.
— De propósito, por conta do experimento, ninguém no vídeo tem a menor etiqueta respiratória. E esse é um fator importante. Se você espirrar na sua roupa, protegendo com a parte anterior do cotovelo, vai diminuir muito a emissão partículas, inclusive dos aerossóis — avalia o médico.
Queiroz observa que os estudos a respeito do tema ainda são poucos, mas faz recomendação para evitar um possível contágio:
— A transmissão pelo ar pode ser possível, mas epidemiologicamente é pouco provável. Teria muito menor importância do que a transmissão por gotículas, por exemplo. É um ponto ainda difícil de comentar frente ao pouco conhecimento científico que se tem a respeito. Mas, enquanto não temos dados suficientes, deve-se reforçar a ideia de que as pessoas precisam estar em ambientes arejados, com janelas abertas. Isso faz com que o ambiente domiciliar ou de trabalho fique mais próximo do ar livre. O aerossol seca rapidamente se o ambiente for bem arejado. E, é claro, é preciso manter o distanciamento social.