Montanhas nevadas sem esquiadores, enormes hotéis fechados, lojas à espera. No sopé da cordilheira dos Andes, a cidade argentina de Bariloche estava coberta de neve, mas não haverá avalanche de turistas neste inverno em meio à pandemia de covid-19.
— Hoje estamos fechados, com atividade zero, trabalhando com a promoção — lamenta Belén García Bertone, 36 anos, terceira geração de hoteleiros e presidente da Câmara de Turismo de Bariloche.
Localizado no Parque Nacional Nahuel Huapi, no meio de montanhas e lagos, 1,8 mil quilômetros a sudoeste de Buenos Aires, San Carlos de Bariloche é o quarto destino turístico da Argentina mais visitado por estrangeiros. Brasileiros e uruguaios até têm essa localidade como sua segunda preferência, atrás de Buenos Aires, segundo operadores turísticos.
Quando o ano de 2020 começou e o coronavírus parecia um alien, Bariloche estava animada para melhorar em julho o bom desempenho da alta temporada do ano passado. Em julho de 2019, recebeu 112 mil turistas — dos quais 15 mil chegaram em 51 voos diretos do Brasil —, e sua capacidade hoteleira de 30 mil lugares estava quase cheia, segundo o escritório do prefeito.
— A cidade é linda, linda. Temos uma queda de neve significativa, a temporada de neve começa, mas é uma cidade sem turistas. Você chega a pontos como o Centro Cívico, a colina da Catedral ou o Llao Llao (hotel) e eles estão vazios — diz José Lepio, 46, dono de um restaurante no imponente Cerro Catedral.
Pior do que um vulcão
A 20 quilômetros do centro de Bariloche, o Cerro Catedral oferece 120 quilômetros de pistas de esqui espalhadas por 600 hectares. Nesta época do ano, os preparativos são geralmente febris. Hoje, apenas grandes extensões de neve são vistas.
— Temos uma escola de esqui há 22 anos e hoje estamos aqui pela primeira vez sem turismo. Tivemos tudo: cinzas de vulcões, gripe A, hantavírus, mas isso é impensável — afirma Néstor López Dávalos, presidente da Associação Empresarial Cerro Catedral.
Segundo López Dávalos, são necessários entre 7 mil e 8 mil visitantes diários para o empreendimento funcionar.
— Sem turistas, realmente não sabemos o que vamos fazer. Muita gente vai ficar sem emprego — adverte.
Em Bariloche, com 140 mil habitantes, o turismo emprega cerca de 15 mil pessoas diretamente e gera outros 34 mil empregos indiretos, segundo a Câmara de Turismo, que estima as perdas que sofrerá este mês em 3,6 bilhões de pesos (cerca de US$ 48 milhões). Julho era geralmente o melhor do ano. Estima-se que o equivalente a US$ 40 milhões já foram perdidos no trimestre de abril a junho, na baixa temporada, período em que, em 2019, 65 mil turistas foram recebidos.
De acordo com García Bertone, que cita as memórias de seu pai, também hoteleiro, é preciso voltar a 1978, quando Argentina e Chile estavam prestes a entrar em guerra devido a um conflito de fronteira e Bariloche tinha um terço de sua população atual, para encontrar uma cidade tão vazia de turistas.
Mais recentemente, em 2011, o aeroporto foi fechado por vários meses devido às nuvens de cinzas deixadas pela erupção do vulcão Puyehue, a 90 quilômetros de lá. Um surto de hantavírus, uma doença endêmica que deixou 11 mortos em uma cidade vizinha, afastou os visitantes em 2018.
Em 2009, a gripe A causou a suspensão temporária do turismo estudantil, outro setor essencial da economia de Bariloche. Ao longo de todo ano, a cidade andina recebe entre 80 mil e 100 mil estudantes em viagens recreativas que comemoram o final do Ensino Médio e que incluem um circuito de boates, agora fechado.
A cidade também oferece esportes de aventura e foi declarada a capital nacional do chocolate. Menos turístico, mas também característico, é o Centro Atômico de Bariloche, berço da engenharia nuclear argentina.
Fronteiras fechadas e futuro incerto
O confinamento obrigatório decretado em 20 de março na Argentina reduziu as expectativas para o ano. As fronteiras foram fechadas e os voos comerciais e o transporte de longa distância foram suspensos. Cerca de 8 mil turistas tiveram que ser evacuados de Bariloche. Depois de cem dias, não há mais caminhantes.
— Estamos prontos para começar, mas é um futuro incerto. Não sabemos qual protocolo seguiremos quando isso começar ... ou se começar — afirma Lepio.
"O inverno está de volta! E nos veremos em breve!", convida o site de turismo de Bariloche, que se esforçou para oferecer uma "visita virtual" com fotografias que destacam as belas paisagens andinas da Patagônia.