Apenas atingimos o desenvolvimento tecnológico atual porque civilizações do passado deram suas contribuições à humanidade.
O peso desta afirmação histórica se derramou sobre meus ombros após vislumbrar a beleza e a sofisticação das pirâmides de Teotihuacán, localizadas em um sítio arqueológico próximo à Cidade do México.
A área preserva resquícios do maior império mexicano antes da colonização espanhola: entre os anos 200 e 600 d.C., a cidade abrigava 200 mil habitantes em uma área 10 vezes maior do que o Centro Histórico de Porto Alegre.
As pirâmides de Teotihuacán ("o lugar dos deuses"), um dos pontos turísticos mais visitados por quem viaja à Cidade do México, estão dispersas no Vale do México, a 40 quilômetros ou uma hora de ônibus a nordeste da capital mexicana. É um passeio de, pelo menos, metade de um dia. Vale a pena: subir nas pirâmides do Sol e da Lua proporciona uma sensação de viagem no tempo.
O sítio arqueológico oferece um lampejo do maior império mexicano nos tempos pré-hispânicos: o povo teotihuacano. Não se sabe com certeza por que a cidade desfaleceu – quando os astecas a descobriram, a área já estava abandonada. A teoria é de que uma mistura de fatores sociais e de problemas climáticos e econômicos contribuíram para os habitantes migrarem a outras regiões.
Séculos depois, os astecas frequentavam as pirâmides abandonadas de Teotihuacán para peregrinações. Hoje, 2,5 milhões de toneladas de pedra lembram a importância dessa antiga cidade.
Hordas de turistas
Há três formas básicas de visitar as pirâmides: 1) De carro, uma vez que há estacionamento; 2) Comprar um passeio de um dia inteiro que leva ao sítio arqueológico e à Basílica de Guadalupe (saída às 9h, por cerca de 600 pesos mexicanos, ou R$ 120). Este pacote é oferecido na maioria dos hotéis; 3) Metrô à rodoviária (5 pesos mexicanos, ou R$ 1) e, de lá, tomar um ônibus (55 pesos mexicanos, R$ 11) para uma viagem de uma hora às pirâmides, localizadas na cidade de Teotihuacán.
Seja qual for a sua preferência, saia cedo para evitar hordas de turistas. Caso você viaje de junho a setembro, tenha em mente que são comuns as fortes pancadas de chuva entre 14h e 16h – leve guarda-chuva. Escolhi a terceira opção. Recomendo-a se você falar espanhol e anotar todas as instruções.
Primeiro, você deve chegar ao Terminal Central de Autobuses del Norte (Eje Central Lázaro Cárdenas, 27), uma rodoviária no norte da Cidade do México. Você pode pedir um Uber, de preço baixo na cidade, ou ir de metrô. Neste caso, desça na estação Autobuses del Norte, a antepenúltima da linha Amarela na direção "Politécnico".
O recepcionista do hotel afirmou que era mais seguro contratar um pacote turístico, tendo em vista minha cara de gringo. Indaguei uma amiga chilanga (nome dado a quem é natural da Cidade do México) e ela discordou: disse que não havia perigo e me forneceu apenas recomendações básicas adotadas por qualquer pessoa que viva em uma grande cidade do Brasil. Evitar o uso de celular na rua, segurar a mochila ao lado do corpo no metrô, não comprar nem dar dinheiro a vendedores ambulantes... Nada novo.
Hospedado em Polanco, bairro chique que mais parece um canto de Barcelona, fiz duas baldeações em uma viagem de 50 minutos até chegar à estação Autobuses del Norte. Ao sair das catracas, vire à direita e siga a placa que indica o Terminal Norte. Já na saída, você vê, do outro lado da rua, a rodoviária lotada de pessoas (lembre que a Cidade do México é uma megalópole que concentra 20 milhões de pessoas por dia).
A entrada da rodoviária lembra o Terminal Tietê, em São Paulo. Vire à esquerda e caminhe até o final do grande corredor. Procure o pequeno guichê da companhia com um símbolo de pirâmide no letreiro e a palavra "Teotihuacán".
Peça o bilhete de ida e volta (não é possível comprar separado). Importantíssimo: ressalte que você quer ir para as pirâmides de Teotihuacán, e não para a cidade (diga: "Hola, me gustaría ir para las pirámides de Teotihuacán, y no para la ciudad de Teotihuacán, por favor"). Passe pelo detector de metais e dirija-se ao box do ônibus.
Quando cheguei à plataforma, vi-me imerso em uma prazerosa loucura latino-americana: como em um filme em fast-forward, uma multidão de pessoas para lá e para cá, ônibus desembarcando e partindo, filas desmanchadas e, pouco depois, refeitas como que automaticamente, em um ninho de humanas formigas.
Meia hora depois, entrei em um ônibus antigo que fez várias paradas – incluindo em um típico pueblito de construções roxas, laranjas, amarelas e verdes, com mexicanos e seus sombreiros nas ruas. A cada parada, um ambulante entrava para vender paletas, sanduíches ou tocar violão. Tudo muito divertido – até lembrei do folclórico vendedor "cego" que não é cego e que pede dinheiro em viagens ao interior do Rio Grande do Sul. Mas a voz da minha amiga mexicana ao telefone ressoou em meus ouvidos: não comprei nada.
Fôlego e preparo físico
O sítio arqueológico de Teotihuacán é acessado pelos portões 1, 2 e 3. Após uma hora de viagem, o ônibus larga você em uma estradinha de terra, no portão 1. Olhe para o outro lado da rua: é lá onde o veículo passará na volta.
Siga a multidão e chegue à entrada das pirâmides. Pague 80 pesos mexicanos (R$ 17) na entrada – aceita-se apenas dinheiro. Você percorrerá uma rua transversal à linda Calzada de Los Muertos, uma avenida de dois quilômetros que liga a Pirâmide do Sol à da Lua. O nome sombrio foi dado pelos astecas, que acreditavam que as pirâmides eram túmulos construídos por gigantes para os teotihuacanos mortos.
O ponto alto do passeio é subir nas duas pirâmides, ambas com degraus bastante altos. A visita exige um pouco de preparo físico - busque os corrimãos de corda para se equilibrar. A altitude da Cidade do México, cerca de 2,3 mil metros, exige fôlego.
A Pirâmide do Sol, construída por volta de 100 d.C. e hoje a terceira pirâmide mais alta do mundo (atrás de Cholula, também no México, e de Queóps, no Egito), pode ser percorrida até o topo, se você tiver energia para subir os 248 degraus – o equivalente a 22 andares. Há chance de você enfrentar fila: visitei a área em uma manhã de sábado entre nuvens e precisei, na escadaria, dar curtos passos como se estivesse em um metrô lotado.
Uma vez no topo, inspire o ar puro e repare nas árvores do vale. Sente à beira da pirâmide, com as pernas balançando, e foque na brisa que corta o rosto. Como era aquele império pulsante 1,5 mil anos atrás? Sobre o que riam os teotihuacanos, por que brigavam, com o que se importavam? Em vez da cor bege e cinza das ruínas, visualize pinturas coloridas e visgo nas paredes, como era antigamente. No passado, acreditava-se que as pirâmides eram maciças, mas uma rede de túneis foi descoberta no interior.
Volte à base da pirâmide do Sol e vire à direita, na Calzada de los Muertos. Faça pequenas paradas nas ruínas ao largo da avenida, onde há placas com breves explicações de cada edificação. Evite comprar lembranças dos comerciantes ali – há chance de os produtos serem falsificados. E lembre de levar protetor solar: a luz de meio-dia é intensa.
Ao fim da via, você encontra a pirâmide da Lua, erguida por volta do ano 300 d.C. Só é possível chegar à metade, mas vale a pena pela vista por outro ângulo. Os degraus são bem mais altos do que a pirâmide do Sol, então se prepare. Uma vez percorrida a subida, observe, em frente, a Plaza de la Luna, formada por várias plataformas de templos. O altar em frente provavelmente era usado para danças religiosas. Se você tiver tempo, considere visitar o Museu de la Cultura Teotihuacana, ali na área mesmo. Lá, você aprende mais sobre a história dos teotihuacanos.
Na saída do sítio arqueológico, voltei à estradinha de terra da entrada e não avistei nenhuma placa indicando parada de ônibus. Ao ver minha expressão de perdido, um taxista instantaneamente me ofereceu uma viagem de volta à Cidade do México, por um preço aviltante. Neguei e agradeci. "Você voltará de ônibus?", ele me perguntou, simpático. Em seguida, estendeu o braço e apontou, com o indicador, para um ônibus totalmente branco, sem qualquer letreiro, estacionado próximo a algumas árvores. Aproximei-me, confuso. Na porta do veículo, questionei cauteloso o motorista:
— Hola, este autobús va para el Terminal Norte de Autobuses?
— Sí, es aquí, señor, vamonos, por fa’ — respondeu o homem.
Ri do nosso improviso latino-americano, expresso em pequenos detalhes. Na volta à Cidade do México, caí em divagações enquanto mergulhava nas impressões da rica história do México. Há tanto o que descobrir na América.
Saiba mais
- Horário de funcionamento das ruínas: segunda a sexta-feira, das 9h às 17h
- Preço: 80 pesos mexicanos (R$ 17)
- Evite ir no fim de semana, quando há filas para subir nas pirâmides.
- Para entender mais da cidade de Teotihuacán, visite o museu do próprio sítio arqueológico e o Museu Nacional de Antropologia.
- Informações: teotihuacan.inah.gob.mx
*O jornalista viajou à Cidade do México a convite da Aids Healthcare Foundation para receber o prêmio de melhor reportagem em jornalismo impresso do Concurso de Jornalismo Investigativo sobre HIV e Aids na América Latina e no Caribe de 2019