A sintonia entre as belezas naturais do trajeto e as peculiaridades de uma viagem de trem tornam especial o percurso entre Curitiba e Morretes, no litoral paranaense. Minha experiência foi em um sábado com temperatura abaixo de 15ºC e um chuvisqueiro típico da região sul do Brasil. Por mais que o clima não fosse o ideal, a movimentação era intensa na área de embarque. Lá, era possível observar a diversidade entre os que optam pelo passeio, o segundo mais procurado do Paraná, apenas atrás das Cataratas de Foz do Iguaçu. Paulistas, mineiros, austríacos, franceses e canadenses compunham o heterogêneo público, bem recepcionado por dois guias bilíngues.
No último dos 28 vagões, há um espaço diferenciado. Na litorina de luxo Barão do Serro Azul, além da decoração inspirada nos anos 1930, uma varanda panorâmica de seis metros possibilita contemplar a paisagem. Dos 32 lugares disponíveis, apenas três ou quatro estavam livres.
A viagem que percorre a ferrovia inaugurada oficialmente em 2 de fevereiro de 1885 começa pontualmente às 8h30min e estende-se por três horas e meia (ou mais, já que os trilhos são compartilhados com trens de carga). Pode até parecer cansativo, mas o cenário compensa.
Além da distribuição do lanche e do serviço de bordo, com água, refrigerante e cerveja liberados, os guias do trem de luxo são também responsáveis por contar um pouco sobre a construção da estrada de ferro, uma das cem mais importantes obras de engenharia do Brasil, e sobre os aspectos geográficos e históricos do local. A cada instante, eles pronunciam a frase mais ouvida durante o percurso:
— Preparem as câmeras!
É que o passeio percorre a maior área contínua de Mata Atlântica preservada do país. E nos 13 túneis – o mais extenso com 500 metros – ou a cada ponte ou cascata, o deslumbramento fica evidente nos passageiros. É uma difícil missão saber se vale mais a pena registrar o momento em uma fotografia ou simplesmente apreciar a natureza.
Merecem ser citados como destaques o conjunto montanhoso do Marumbi, a Cascata Véu da Noiva e o grande ápice: a Ponte São João. Também inaugurada em 1885, ela tem um vão livre. Ou seja, de dentro do trem, você olha para baixo e vê apenas um abismo de 110 metros de altura. Importada da Bélgica, a ponte se destaca em meio à vegetação que cobre toda a Serra.
Tradição e história
Encerrado o passeio no trem que partiu de Curitiba, o visitante desembarca em duas cidadezinhas muito simpáticas. Primeiro, em Morretes. Com pouco mais de 15 mil habitantes, tem cara de interior, com casinhas coloniais coloridas, muito artesanato e feirinhas. Como os turistas costumam chegar na hora do almoço, nada melhor do que servir um prato típico do Paraná: o barreado. É um prato à base de carne e condimentos, onde o cozimento é feito de forma lenta, em panela de barro, e pode demorar até oito horas. Ele é acompanhado de banana e de farinha de mandioca (que, ao ser acrescida, lembra um pirão).
Depois de conhecer Morretes, a gente faz uma curta viagem de 15 quilômetros até Antonina. No início de 2012, a cidade obteve o reconhecimento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que decretou o tombamento do seu centro histórico.
A região foi uma das primeiras áreas exploradas pela coroa portuguesa no sul do Brasil, por ser considerada estratégica na busca por índios e metais preciosos.
Atualmente, Antonina tem forte vocação cultural, realiza o Carnaval mais famoso do Paraná e mantém viva a tradição das serestas.
Saiba mais
- Fabricado originalmente em 1954, o trem de luxo do Barão de Serro Azul foi comprado em um leilão em Vitória (ES) e tem em seu nome uma homenagem a Ildefonso Pereira Correia (1849-1894). Um dos maiores produtores de erva-mate do mundo, ele foi morto durante a Revolução Federalista na ferrovia Paranaguá-Curitiba.
- Durante o passeio, o melhor é estar do lado esquerdo do trem, para ver de perto as principais atrações.
- O retorno para Curitiba aconteceu ao final da tarde, de van, pela Estrada da Graciosa, antigo percurso dos tropeiros e cuja construção, em meio à Mata Atlântica, ocorreu no século 19.
- Em média, cerca de 180 mil passageiros realizam o passeio de Curitiba a Morretes por ano. Em feriados e sábados de maior movimento, são 2 mil pessoas diariamente.
- O valor do pacote pela Serra Verde Express, que inclui a viagem no trem de luxo de Curitiba a Morretes, almoço com barreado, city tour nas duas cidades litorâneas e retorno à capital, custa R$ 394 (adulto) e R$ 259 (crianças). Mas existem também valores mais acessíveis. Na classe turística, por exemplo, os pacotes ficam entre R$ 219 e R$ 297.
*O jornalista viajou a convite da Serra Verde Express