Ao planejar uma viagem, você muitas vezes já deve ter ido atrás daquelas dicas especiais “dos locais”. Sabe aquele lugar ou aquele programa que não estão no check-list do turismo de massa? É uma tendência: as pessoas, cada vez mais, querem ir além dos roteiros tradicionais.
Pensando nisso, o Airbnb, que há 10 anos permite que o morador alugue um dormitório ou um imóvel ao turista, resolveu também fazer com que ofereçam tours diferentes para os viajantes em suas cidades. O projeto, chamado de Experiências, chegou ao Brasil em junho de 2017 para ser testado no destino mais turístico do país: o Rio de Janeiro.
– Percebemos que o anfitrião se oferecia para levar o hóspede a locais de sua preferência. Lugares de que ele gostava, que não são tão conhecidos, menos turísticos. E a resposta era sempre muito positiva. Com isso, quem recebe o turista compartilha uma paixão em locais a que já está acostumado a ir. Daí surgiu a ideia de oferecer isso para toda a comunidade, hospedada ou não no Airbnb – afirma Márcia Motta, gerente de mercado da empresa para Brasil, Chile e Argentina.
Hoje, o serviço é oferecido em mais de 40 cidades brasileiras. Só no Rio, são cerca de 160 experiências diferentes e, segundo a empresa, 93% das reservas têm 5 estrelas, nota máxima na avaliação dos usuários.
GaúchaZH embarcou nessa e foi conhecer a Cidade Maravilhosa na companhia de um cantor e compositor que vive a Bossa Nova da Zona Sul, de um gaúcho que largou a gerência de um restaurante para fazer trilhas e viver em uma “praia secreta” e de um jornalista que viajou o mundo experimentando “de tudo um muito” e nos apresentou os melhores petiscos de botequim de Copacabana.
Meu escritório é na praia
“Parece o Armandinho.” Foi o que pensei quando Diego Losch nos recebeu, na entrada da Floresta da Tijuca. Um magrão de 38 anos que largou o emprego de gerente de restaurante para fazer o que realmente lhe dá prazer.
– Hoje, meu trabalho é fazer as pessoas felizes – conta Diego, com um imenso sorriso e um carregado sotaque porto-alegrense.
A Experiência oferecida pelo gaúcho começa com uma trilha de mata densa, degraus altos, desenhados pelas chuvas e galhos caídos no caminho – um desafio até mesmo para os mais preparados. O equipamento do guia? Camiseta com gola caída, bermuda floreada de surfista e pés descalços.
– O contato com a terra faz com que eu sinta a energia. É como se meditasse o tempo inteiro na trilha, unicamente com o som dos pássaros e do vento – diz Diego.
Após 45 minutos de escorregões sem maiores sustos, a recompensa é a vista do Rio de Janeiro que Tim Maia eternizou: do Leme ao Pontal. A uma altura de 696 metros, tem ao seu lado a Pedra da Gávea, que parece estar tão próxima, mas quase 150 metros mais alta. Um piquenique compartilhado, com o lanche de todos os integrantes da trilha repõem as energias gastas na subida.
Ao selecionar os passeios a serem oferecidos, o Airbnb faz o pedido que parece ser o mais óbvio: compartilhem aquilo que vocês amam fazer. Diego propõe, depois da refeição, uma meditação de cerca de 10 minutos. Quase 700 metros acima do nível do mar, relembrando as paisagens que me rodeavam, senti como se planasse sobre a zona sul do Rio, enquanto os pensamentos se dispersavam. A experiência de alguns foi de apenas ouvir e sentir o silêncio. Abrir os olhos e ter a imensidão do azul me fez ter certeza de que decolei.
O cansaço já mais exposto na descida é coroado ao descobrir que há, sim, no Rio de Janeiro, uma faixa de areia disponível sem que se pague R$ 20 pelo aluguel de uma cadeira de praia.
– Eu disse para o vendedor: “Meu irmão, eu moro aqui no Rio”. Sem constrangimento, ele pediu desculpas e deixou por R$ 5 – confessa o fotógrafo Gustavo Wittich, responsável pelas belas imagens desta reportagem.
A praia “secreta” que desvendamos é Joatinga, onde a Experiência se encerra, na sacada do apartamento de Diego.
– Meu escritório é na praia, e viver aqui não tem preço – diz.
Planeje-se
- Experiência: Explore a Beleza da Cidade Maravilhosa, por Diego Losch
- Preço: R$ 149
- Inclui: transporte até a entrada da Floresta da Tijuca, trilha guiada, meditação, piquenique (cada pessoa leva o que quiser compartilhar), transporte até a praia da Joatinga e equipamentos de esporte
- Duração: cerca de 3h30min
No ritmo da bossa nova
Para conhecer sobre a bossa nova, nada melhor do que seguir o velho ditado: quando em Roma, faça como os romanos. Os costumes, os hábitos e a história de gênero musical característico da zona sul do Rio são rememorados pelo músico Cecelo Frony, com um passeio pelos pontos onde o ritmo surgiu, na tranquilidade de quem considera a Cidade Maravilhosa seu local favorito no mundo.
– A bossa nova para mim é uma volta de bicicleta à beira-mar em Ipanema, sem me preocupar com nada, acreditando que tenho uma vida perfeita – diz Cecelo.
Cantor e compositor, ele já tocou ao lado de nomes como Fagner, Erasmo Carlos e Baby Consuelo. A caminhada começa despretensiosa, com Cecelo mostrando as flores penduradas por cordões nas árvores de Ipanema, em uma espécie de competição entre os porteiros do bairro. Até que avistamos uma placa com os dizeres “Patrimônio Cultural Carioca” grudada na parede de um bar com vitrais de madeira e azulejos coloridos.
– Neste bar, que hoje se chama Garota de Ipanema, Vinicius e Tom compuseram Garota de Ipanema, em um guardanapo. A canção fala do andar na praia da mulher carioca, o pisão na areia fofa das praias do Rio, o rebolado – conta ele com uma voz suave, entoando a primeira estrofe do hino da bossa nova, “Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça...”.
Cecelo é natural de Teresópolis, na serra do Rio, mas se considera carioca da gema por viver na cidade há 39 anos. É mais um anfitrião do Airbnb que mudou o rumo da vida para trabalhar no que ama.
– Sou formado em Jornalismo, e um dia recebi uma proposta de emprego em um grande jornal. Encontrei a chefe de Redação e questionei: “Dá para faltar? Se não dá, então eu não quero” – brinca o artista, que troca os dias pela noite em seu estúdio, em uma aconchegante residência da metade do século passado, onde vive e compõe.
Nesse ambiente, é revelada a receita do bolo: as raízes da bossa nova vieram do samba.
– O termo “bossa” veio do francês e foi usado para designar “algo novo”. Quando se adicionaram acordes de jazz no samba, as pessoas se acostumaram a pedir: “Toca essa bossa nova, mostra essa bossa nova que você tocou, faz no violão essa bossa nova aí”, e assim se batizou o ritmo, entre os anos 1950 e 1960 – explica.
Planeje-se
- Experiência: Segredos da Bossa Nova, com Cecelo Frony
- Preço: R$ 109
- Inclui: caminhada e visitas à Lagoa Rodrigo de Freitas e ao estúdio do anfitrião
- Duração: cerca de três horas
Comer e beber sem parar
Juntar pessoas em um bar, comer e beber – tudo com o exagero que uma boa gastronomia merece. É isso que alerta a descrição da Experiência de Paulo Mussoi: “Venha de estômago vazio, porque a ideia é comer bastante”.
O tour promete passar por quatro tradicionais botequins portugueses – os pé-sujos – em Copacabana. Vale citar que o meu grupo entregou os pontos no segundo bar, de estômago cheio e com muitas risadas na conta.
– Levava amigos de maneira informal a meus botequins favoritos e resolvi organizar isso em uma Experiência do Airbnb. Reservamos mesas dos meus locais favoritos no fim de tarde e, além da boa comida e da bebida, trazemos uma experiência gastronômica, pois todos resumem muito bem a história do botequim carioca e a sua essência – explica.
Mussoi tem em seu currículo uma viagem por 150 cidades de 20 países, visitando os mais diversos bares, além de assinar no jornal O Globo a coluna Pé-Sujo, especializada em botequins.
Os locais não têm a sofisticação de grandes bares próximos à orla, mas a experiência vale – e muito – pelos sabores e pela peculiaridade das receitas: alho marinado 24 horas no óleo, polvo ao vinagrete, linguiça ao vinho e sardinha portuguesa assada em azeite são algumas que me deixaram apaixonado pelo Adega Pérola, fundado por uma família portuguesa em 1957 e salvo por um grupo de amigos frequentadores do local. Deu sede? Uma rodada de cervejas artesanais de produtores do Estado acompanham os petiscos.
– Soubemos que viraria mais um bar dessas grandes redes do Rio e nos unimos para comprar. Não podíamos deixar que fechasse. Ele decaiu muito após a morte dos portugueses que o fundaram, e hoje estamos muito felizes de termos o selo de Patrimônio Histórico Carioca – relembra o empresário Marcelo Paulos.
A ida para o segundo botequim contou com uma caminhada de cerca de cinco minutos, que nos ajudou a encontrar aquele espaço secreto no estômago de quem já estava saciado, mas com desejo de comer mais.
– No Pavão Azul, vocês vão comer o melhor bolinho de bacalhau do Rio – prometeu o guia, provocando olhares duvidosos do grupo.
E não é que ele tinha razão?
– Patanisca é um bolinho de bacalhau que não conta com batata na receita. Por isso, tem muito mais gosto do peixe do que os bolinhos comuns – revela o simpático garçom do bar, que, após tantas cervejas, confesso não lembrar o nome.
Depois de muitos bolinhos de feijão e do também famoso risoto de camarão, a digestão é feita com as premiadas cachaças da destilaria Sete Engenhos. De sobremesa, os pasteizinhos de Santa Clara nos fazem pedir arrego e um táxi de volta para casa.
Planeje-se
- Experiência: Sabores de Botequim em Copacabana, com Paulo Mussoi
- Preço: R$ 279
- Inclui: cervejas, cachaças, drinks e até 10 tipos de petiscos em quatro bares
- Duração: cerca de quatro horas
Saiba mais sobre o projeto
-No Brasil, o Experiências começou no Rio de Janeiro e, um ano depois, em junho de 2018, passou a ser oferecido em outras cidades. Hoje, há 345 experiências disponíveis – pouco se compararmos às mais de 15 mil oferecidas no mundo inteiro, em ao menos 800 cidades. Na América do Sul, Buenos Aires e Santiago também contam com o serviço.
-No Rio Grande do Sul, ainda há poucas Experiências oferecidas. Entre elas, os usuários da plataforma podem encontrar rafting em Três Coroas, cultivo de alimentos orgânicos em Bento Gonçalves, passeios com a história de Pelotas e oficinas de pintura e escrita em Porto Alegre.
-A ideia é ampliar esse número, principalmente se levarmos em conta a hospitalidade do gaúcho: a cidade de Farroupilha, na Serra, ficou em segundo no ranking das mais hospitaleiras do Brasil em um levantamento feito pelo Airbnb que leva em conta as classificações dos usuários aos anfitriões nos últimos 12 meses. Para chegar à lista, a plataforma avaliou as classificações cinco estrelas creditadas por seus usuários aos anfitriões nos últimos 12 meses.
-Quem tiver bons programas e quiser virar parceiro da Airbnb pode se inscrever em airbnb.com/brasil. Indispensável seguir os três pilares: 1) credibilidade: ser um anfitrião que conheça a cidade ou o passeio oferecido e que compartilhe aquilo que tem paixão por fazer; 2) o visitante precisa ter fácil acesso ao pacote oferecido, e os locais menos conhecidos, que tragam experiências únicas são os mais valorizados; e 3) hospitalidade: seguindo à risca o propósito da Airbnb, se sentir em casa em qualquer lugar do mundo.
*O jornalista viajou a convite do Airbnb