Sentada à janela do hotel, observava o fim de tarde de primavera em Torquay. Logo à frente, o Atlântico banhava a areia da praia quase deserta, e as lâmpadas coloridas se acendiam ao longo da avenida à beira-mar como se fosse Natal. No fim da via, funcionários montavam a roda-gigante que divertiria os turistas no verão que se aproximava, e, ao longe, era possível avistar grandes encostas contornadas por longas escadarias e encimadas por uma fileira de casas de cor cru.
Suspirei. Depois de lidos 80 e tantos livros de Agatha Christie (1890 - 1976) desde minha adolescência, não conseguia apontar com exatidão quais deles a cidade natal da escritora inglesa me lembrava - o que, afinal, era um dos motivos de eu estar ali. Mas me resignei ao perceber o óbvio para os fãs mais ávidos como eu: Torquay estava tão diluída na base de praticamente todas as narrativas que quase tudo lembrava alguma coisa das obras da autora, mesmo que a cidade não fosse citada pelo nome.
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Quantas vezes Hercule Poirot e Miss Marple resolveram mistérios em destinos litorâneos da Inglaterra? Muitas. Cavernas isoladas, enseadas pedregosas, ilhas particulares e hotéis no topo de encostas, por exemplo, são elementos de vários livros, como A Casa do Penhasco (1932), Morte na Praia (1941) e Morte na Biblioteca (1942). E as referências são ainda mais numerosas ao se visitar Greenway, a casa de veraneio da autora, um paraíso às margens do Rio Dart que serviu de inspiração para obras como Os Cinco Porquinhos (1942), A Extravagância do Morto (1956) e Punição para a Inocência (1958).
No vídeo abaixo, o ator David Suchet visita Greenway, casa de veraneio de Agatha (em inglês)
Mais do que conhecer que lugar inspirou o que na obra de Agatha, um passeio por esta cidade fala muito sobre a vida da garota que veio a se tornar uma das escritoras mais vendidas do mundo até hoje - e que terá seus 125 anos comemorados em 2015. Para lembrar a data, Torquay celebrará o The International Agatha Christie Festival, com uma programação de eventos de 11 a 20 de setembro.
Parte da chamada Riviera Inglesa, no condado de Devon, Torquay era um dos destinos de verão mais disputados da Inglaterra no início do século 20, época em que Agatha Christie ainda morava por lá. Mas, com o tempo, viajar para o Exterior ficou mais simples e barato, e os ingleses passaram a invadir outras praias nos meses mais quentes, especialmente de Portugal e Espanha.
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Por isso, é inevitável notar um ar de balneário decadente na cidade que, hoje, conta com cerca de 65 mil habitantes e está a quatro horas de carro de Londres. Não vá esperando encontrar Ibiza ou Nice - glamour não é exatamente o forte da região. Isso não significa, contudo, que Torquay seja desprovida de atrativos. Para fãs da Rainha do Crime, é até mais gratificante encontrar o lugar conservando um pouco do que era àquele tempo, para se sentir ainda mais dentro do universo descrito por Agatha em seus livros.
O status de cidade natal da escritora é tão obviamente importante para Torquay que há uma espécie de roteiro apelidado de Agatha Christie Mile. Todos os locais que, de alguma forma, foram relevantes para a vida da autora receberam uma placa de identificação (foto abaixo). Há várias espalhadas pelo Centro, até para atrações que não existem mais - como é o caso de Ashfield, a casa em que a escritora cresceu, vendida em 1938 e demolida na década de 1960.
Ainda assim, Agatha não ficou longe de sua amada Torquay, comprando Greenway no mesmo ano de 1938, onde passaria com a família muitos veraneios até sua morte, em 1976.
A seguir, confira alguns dos pontos de interesse aos fãs da escritora.