Desde 2014, com a criação da campanha Janeiro Branco, iniciativa social liderada pelo psicólogo e palestrante mineiro Leonardo Abrahão, a depressão na terceira idade passou a ser um assunto que ganha cada vez mais atenção. A doença, que apresenta sintomas diferentes nesta faixa etária, preocupa médicos e familiares. Segundo especialistas, o convívio com animais de estimação ajuda na redução do estresse e na melhora de quadros de depressão e ansiedade.
A relação da aposentada Gioconda Dourado, 73 anos, e sua mascote, Sophia, é a prova de que a companhia dos animais pode ser muito benéfica. Gioconda e Sophia são inseparáveis, uma sempre ao lado da outra.
— Ela precisa de companhia e eu também. Moramos só nós duas e onde eu vou, ela vai atrás. Não posso ficar muito tempo sozinha em um cômodo que ela vai espiar onde eu estou ou o que estou fazendo. Não sou de me sentir sozinha, mas tenho certeza que, se fosse, ela ajudaria com esse sentimento — conta a aposentada.
A percepção da idosa é confirmada pela psiquiatra Graziela Stein:
— A interação entre os humanos e seus pets estimula o aumento da serotonina, responsável pela sensação de bem-estar, o aumento da ocitocina, que é um neurotransmissor relacionado ao sentimento de amor, e a liberação de endorfinas que reduzem as sensações dolorosas. Essa conexão, portanto, melhora quadros de ansiedade, depressão e, até mesmo, dor crônica, condições comuns em idosos.
Além disso, ter um bichinho de estimação pode ajudar a combater outras dificuldades comuns na terceira idade, como a falta de vontade para realizar atividades que antes eram consideradas prazerosas, diminuição das interações com outras pessoas, quietude, isolamento, perda de autonomia e a vontade de passar mais tempo na cama. As necessidades básicas de um pet incluem passeios, alimentação e cuidados com a saúde e garantir que os bichinhos tenham essa estrutura exige que os idosos sejam mais ativos.
— O envelhecimento é um período mais frágil, e o idoso costuma perder a independência. Ter um pet faz com que o idoso tenha mais responsabilidade e um compromisso além de si mesmo. Ter essa responsabilidade auxilia nesse processo de não perder a autonomia e de se sentir útil — defende a geriatra do Hospital Mãe de Deus Anna Vitória Mineto.
A médica afirma que, na geriatria, outra preocupação são os sintomas da demência. Os bichinhos podem ajudar os idosos com este quadro a reduzir a agitação e a agressividade, além de estimular o afeto e as relações de carinho.
Assim como os humanos, os animais mamíferos - como cachorros e gatos - também têm o sistema límbico desenvolvido. Isso significa que as pessoas e os mamíferos são capazes de produzir respostas emocionais de formas parecidas.
— Todas as emoções básicas que os humanos sentem, como amor, medo, felicidade e tristeza, os pets também sentem. O que os humanos sentem pelos animais é, sem dúvida, amor. E os pets retribuem — afirma Graziela.
Com isso, é normal que, na terceira idade, as pessoas já não tenham a mesma energia para manter outras conexões afetivas e acabem preferindo os bichinhos.
— As relações com os pets não costumam ter tanta frustração quanto as relações humanas, nas quais existem expectativas que podem causar decepções. Os animais acabam sendo um vínculo de amor constante. É claro que a frustração é importante para estimular o crescimento emocional, mas as decepções constantes podem causar males e dores profundas que os idosos costumam carregar por muito tempo. Muitas vezes, eles cortam contatos com entes queridos para evitar esses sentimentos ruins e acabam ficando ainda mais isolados — explica a psiquiatra.
Para Graziela, os pets não curam as dores do coração, mas ajudam a amenizar. Independentemente do motivo, o isolamento e o sentimento de solidão são sintomas conhecidos da depressão na velhice. Os bichinhos de estimação são uma forma de garantir que pessoas idosas tenham companhia.
Parceria entre animais de estimação e idosos
Gioconda Dourado divide a vida com Sophia, sua cachorrinha, há 13 anos. Adotar a Sophia não foi ideia dela, mas sim do filho, que hoje é casado e mora com a família. Depois que ele saiu de casa, Gioconda e Sophia ficaram sozinhas e passaram a ser parceria uma da outra.
Há poucos anos, Sophia teve um problema de bexiga e agora está com um problema na coluna. Com essas questões de saúde, a cachorrinha necessita de cuidados como visitas mais constantes ao veterinário e fisioterapia. Gioconda tem problema no joelho que limita sua locomoção, mas, mesmo assim, garante que a companheira canina tenha o que precisa.
— A fisioterapeuta e a veterinária vêm aqui em casa sempre que ela precisa. Mas consigo levar ela para fazer os passeios diários e sempre que saio a levo comigo, quando posso. É uma companhia interessante — relata.
O amor pelos animais e a satisfação em estar perto deles também definem a profissional de recursos humanos Cleci Fraga dos Santos. Aos 66 anos, a melhor parte do dia dela é chegar em casa do trabalho e ser recebida pelos três gatinhos, Lili, Kiko e Bela, e pela cachorrinha Daia.
— Eu nunca me sinto sozinha. As pessoas sempre falam que eu vivo sozinha, mas não me sinto sozinha. Talvez, se eu não os tivesse, me sentiria. Mas meus bichinhos estão sempre comigo. Quando tirei a vesícula e fiquei uns dois dias sem poder caminhar, a Daia não saiu do meu lado na cama por nada — lembra ela.
Cleci sempre morou sozinha com seus pets. Para ela, que se considera mais carinhosa com os animais do que com os humanos, os bichinhos, além de companhia, são fonte de um amor genuíno que tornam os dias melhores.
— Esse sentimento que tenho por eles e que eles têm por mim não tem preço. Nunca cheguei em casa, vi uma arte que eles fizeram e fiquei brava. Eles não dão desgosto nenhum, é só amor.
Ela afirma, também, que faz bem poder cuidar de uma outra vida. Cleci gosta tanto dos bichinhos que tenta cuidar até dos animaizinhos de rua, para os quais sempre leva ração e dá carinho.
— Tenho um compromisso com aquelas vidinhas, que dependem de mim para comer e beber água. Me sinto bem podendo cuidar deles, e dar a eles o que eles precisam.
Cuidados para idosos com pets
A geriatra Anna garante que não há contraindicações de idosos que gostam de animais conviverem com pets ou morarem sozinhos com seus bichinhos, caso tenham condições para isso. É importante, porém, que a pessoa seja capaz de garantir as suas necessidades básicas e a dos bichinhos.
— Os animais têm que ser dóceis e mansinhos. O ideal é que pacientes não tenham condições pulmonares ou sistema imunológico enfraquecido para evitar pegar doenças, e que bichinhos tenham acompanhamento veterinário. Idosos com doenças pulmonares e alergias devem evitar contato. E, claro, aqueles que não gostam de bichinho, por algum motivo, não precisam forçar essa relação — defende.
A especialista também chama atenção para o perigo de quedas e lesões que cachorros muito grandes podem causar. Para isso, ela recomenda que haja supervisão na hora dos passeios e brincadeiras. A veterinária da Sophia, Paula Cristina Padilha Moisés, conta que as preocupações dos idosos pais de pets é com as limitações que a idade pode trazer, como o caso da Gioconda. Ela sugere que o idoso e a família avaliem que tipo de pet adotar, considerando o tamanho, o temperamento e as necessidades.
— Pensando nas limitações que alguns idosos podem ter, de maneira geral, o ideal são animais menos enérgicos pois isso facilita a boa convivência e manejo desses idosos com os seus pets. Adotar gatos, que são mais caseiros, ou cachorros já adultos pode ser uma boa ideia para saber qual o temperamento do bichinho — aconselha. Essas dicas são importantes para garantir boa convivência entre os animais de estimações e idosos.
*Produção: Yasmim Girardi