Pouco mais de nove meses depois do assassinato de João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, em uma unidade do hipermercado Carrefour, na zona norte de Porto Alegre, o que mudou para evitar que a situação se repita? O caso teve destaque no cenário nacional e internacional, assim como ocorreu no assassinato de George Floyd, nos Estados Unidos, em maio de 2020. E o que as vítimas tinham em comum? A cor da pele.
Hoje, o Grupo Carrefour pontua o passo mais importante dado desde o acontecido na unidade do bairro Passo D’Areia. Trata-se da internalização dos seguranças que trabalham dentro dos hipermercados – não só do Carrefour, mas também do Atacadão, outra bandeira do grupo. A internalização é a contratação de colaboradores pela própria empresa, não por meio de empresas terceirizadas. Além disso, a organização não mudou só no papel. Agora, esses colaboradores internos são chamados de agentes de prevenção, não mais seguranças.
A ideia, conforme Jérôme Mairet, diretor de gestão de riscos do Carrefour Brasil, é promover um ambiente seguro e acolher melhor os clientes.
– Chegamos ao entendimento de que essas pessoas que trabalham dentro da loja têm um papel muito mais de dar atendimento ao cliente, do que a missão de segurança. Por isso, internalizamos essas pessoas que no passado eram terceirizados, aproximando o contato com o cliente – explica Jérôme.
Mas apenas uma troca de nomes das funções e novos uniformes não significa mudança de comportamentos. Por isso, a empresa também iniciou a criação de novos processos, protocolos e treinamentos para quem foi contratado. E isso passou pela contratação de novas caras para o grupo, como Claudionor Alves, diretor de segurança corporativa e prevenção de perdas e riscos. Com 30 anos de experiência de mercado em grandes empresas, Claudionor também é um homem negro. Algo, infelizmente, ainda incomum em cargos de liderança no Brasil. Assim como as mudanças com a chegada dele, a diversidade entre os colaboradores também mudou.
– Em relação ao Rio Grande do Sul, já internalizamos 100% das nossas unidades. E dentro desse grupo, 70% das novas contratações são de pessoas autodeclaradas negras ou pardas, algo bem acima da média brasileira. E ainda dentro desse todo, 45% são mulheres, outra mudança que tivemos neste setor, normalmente ocupado em sua maioria por homens – pontua Claudionor.
Câmeras corporais gravam o dia a dia
Visando não só a segurança dos clientes, mas também dos colaboradores, o Carrefour deu início a mais uma etapa nas mudanças nos protocolos adotadas desde a morte de João Alberto. É a instalação de câmeras portáteis nos uniformes dos agora chamados agentes de prevenção. Chamadas de bodycams – câmeras corporais, em tradução livre – os equipamentos permitem gravar o dia a dia nas lojas da rede, sendo uma ferramenta extra em situações que se tornem necessária a averiguação da postura tanto do colaborador quanto do cliente em situações de conflito.
– Atualmente, ainda estamos testando a iniciativa, com cerca de quatro colaboradores por loja com bodycams – diz Claudionor.
O investimento do grupo na aquisição dos equipamentos foi de cerca de R$ 5 milhões.
Compartilhamento com outros setores
Com o trabalho já em execução e colhendo resultados – Claudionor e Jérôme citam que a aprovação dos novos protocolos têm sido alta entre clientes e colaboradores –, o Carrefour começa a pensar no futuro.
O grupo quer disseminar para outras empresas do varejo a nova cultura criada na empresa.
– Estamos trazendo empresas de segurança e outros varejistas para conhecer o modelo que estamos aplicando aqui. Também criamos um comitê que trabalha essa interligação com outros varejistas. O nosso objetivo é iniciar uma grande mudança no Brasil neste setor – projeta Jérôme.
Para que os trabalhos também tenham sequência, o Carrefour fechou contrato com uma empresa que fará a checagem de documentação de empresas terceirizadas que venham a trabalhar no grupo – a segurança externa das unidades segue sendo feito por empresas de vigilância terceirizada. Além disso, auditorias externas periódicas vão conferir se a empresa está seguindo os novos protocolos com os quais se comprometeu. E ações sociais também estão em funcionamento, como explica Claudionor:
– E em Porto Alegre e Região Metropolitana, também estamos fazendo um trabalho junto a comunidade.
Através da ONG ODABÁ - Associação de Afroempreendedorismo, está sendo realizado um torneio de futebol com objetivo de integrar empresa e comunidade próximas dos locais onde temos lojas.