A mãe fala em tom divertido, mas é bom que as visitas levem o recado a sério.
– Caminho pisando em ovos! – descreve Luciane Carvalho, 38 anos, sempre olhando para baixo, para ver onde está o nenê mais próximo ou o cachorro, Bud, um híbrido de poodle e lhasa apso de 12 anos que anda carente diante de tanta concorrência por atenção.
Mãe de quadrigêmeos gerados a partir de inseminação artificial, em uma produção independente, a administradora de empresas está em uma semana especial: o quarteto completou um ano nesta quarta-feira (29). Nicolas, Antonella, Sofia e Valentina estão adentrando uma fase de maior independência, por isso é preciso se deslocar pela casa, em um condomínio de Alvorada, com cuidado – Sofia e Nicolas já engatinham, e a menina inclusive consegue se desvencilhar do cinto da cadeirinha e escapar.
GaúchaZH acompanha a trajetória de Luciane desde julho do ano passado, quando a gestante estava internada no Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, em repouso absoluto, para garantir que a gravidez fosse mantida pelo maior tempo possível. A aventura havia começado quando a administradora procurou uma clínica de reprodução assistida, onde teve o sêmen de um doador desconhecido introduzido em seu útero após receber uma medicação para estímulo da ovulação. Ela imaginava engravidar de um, no máximo dois. O resultado foi um susto: seu organismo respondeu de forma maior, gerando quatro fetos. Os bebês nasceram com 33 semanas. Na manhã do domingo passado (26), Luciane recebeu a reportagem para contar como foram os últimos 12 meses.
A alegria pela realização do sonho da maternidade teve de ser conciliada com o luto pela morte do pai, João Luiz Carvalho, 68 anos, nove dias depois da cesariana. Os primeiros três meses foram o período mais difícil, recorda Luciane. Tudo era novidade – e em ritmo frenético.
– Eu dava o peito para dois de cada vez, mais mamadeira, depois esperava 15 minutos para arrotarem, trocava as fraldas. Quando terminava o quarto, já estava na hora de voltar para o primeiro.
Ajuda para lidar com os bebês
Berenice Scheffer Carvalho, 67 anos, mãe de Luciane, é personagem fundamental no dia a dia, além de amigos e familiares. A administradora conta ainda com duas babás. De volta ao trabalho, ela fez um acordo com a empresa e reduziu o expediente. Quem chega para visitar a turminha acaba sempre ajudando em alguma tarefa, como dar banho. A hora da higiene segue o modelo de uma linha de produção, envolvendo até três pessoas, num processo que dura em torno de uma hora entre despir, lavar com o chuveirinho, secar, colocar a fralda e vestir.
– Estamos rodeados de anjos – define Berenice, que retorna brevemente para sua residência em Cidreira, no Litoral, a cada 15 dias.
Não paro um minuto, mas foi mais fácil do que eu pensava.
LUCIANE CARVALHO
Mãe dos quadrigêmeos
Trabalhando à tarde, Luciane acompanha mais a rotina matutina dos filhos: leite às 7h (eles já seguram as mamadeiras), fruta às 10h (para dois de cada vez), almoço às 11h (um por um no cadeirão). Informações relativas a mamadas, cocô, troca de fraldas, vômito e febre são anotadas em planilhas, hábito que ajuda os cuidadores a desvendar o motivo de um episódio de choro, por exemplo. Entre os maiores desafios, está o pranto coletivo – e aí tem preferência aquele que começou a se lamuriar primeiro, porque provavelmente é quem está com algum desconforto e acabou por inspirar os demais a abrirem o berreiro também.
– Não paro um minuto, mas foi mais fácil do que eu pensava. Tive muita ajuda dos quatro. Pensei que pudessem ser mais difíceis, mas são muito bonzinhos. E nunca imaginei que as pessoas se mobilizariam tanto para me ajudar – emociona-se Luciane.
Um olho nos pequenos, outro nas redes sociais
A mãe também aproveita a manhã para se dedicar à atualização das redes sociais. As páginas 4 Vidas na Minha Vida têm 115 mil seguidores no Instagram e 75 mil assinantes no YouTube, e os anúncios de produtos já rendem uma verba que reforça o orçamento doméstico. Na hora de sair para o emprego, Luciane segura a vontade de apertar bem forte os filhos e dá um tchau geral, meio de longe, para não agitá-los.
Como mãe, me sinto totalmente realizada. Eles superaram todas as minhas expectativas. São quatro trazendo tanta coisa nova na minha vida que não se torna demais.
LUCIANE CARVALHO
Mãe dos quadrigêmeos
– Chego lá (na empresa) e faço um trabalho psicológico para conseguir me desligar. E consigo. Tenho a mãe aqui, sinto muita segurança – relata a administradora, que telefona apenas uma vez até a noite para saber se está tudo bem.
Os quadrigêmeos ainda usam fraldas (seis cada um ao dia) do estoque de milhares de unidades recebidas em doações. Quando o leite especial fornecido pelo Estado esteve em falta, Luciane pediu ajuda aos seguidores virtuais, que prontamente responderam. Em menos de 24 horas, ela arrecadou o suficiente, em latas e dinheiro, para seis meses. Na festa do próximo sábado – toda a celebração foi organizada a partir de parcerias, com custo zero para a família –, sugeriu-se que os convidados presenteiem os aniversariantes com lenços umedecidos, fraldas tamanho G e brinquedos educativos.
Os traços mais marcantes das crianças vão se sobressaindo. Sofia é a mais sapeca e ativa. Nicolas, o comilão, ri de tudo. Valentina é tranquila e simpática, e Antonella se destaca sendo carinhosa e dengosa. Luciane anseia pelos dias em que não necessitará tanto dos outros, podendo desfrutar de uma convivência mais independente com a prole.
– Penso em nós cinco no sofá comendo pipoca e vendo filme – projeta, sorrindo. – Como mãe, me sinto totalmente realizada. Eles superaram todas as minhas expectativas. São quatro trazendo tanta coisa nova na minha vida que não se torna demais.