Tem 14 lugares a mesa de jantar da casa de Clara Guaragna Kayser, 69 anos, e Sérgio Valério Kayser, 74, no bairro Santa Tereza, em Porto Alegre. Quase metade das cadeiras, seis, é para os netos, uma “escadinha” que começa em Fernanda, 23, e desce até Maria Antônia, dois. Reunir a turma para as refeições, jogos de futebol e comemorações de aniversário é um dos principais prazeres do casal.
À medida em que a gurizada foi crescendo e assumindo diferentes compromissos, ficou mais difícil juntar todos para refeições no mesmo horário, mas o vaivém é constante.
— A nossa casa é um ponto de encontro. Eles estão sempre aqui. Esse convívio é muito importante para mim e me faz muito bem — comemora Clara.
A avó relembra os cuidados mais próximos da maternidade quando fica responsável pela duas menores, em alguns turnos da semana, enquanto a nora trabalha. Troca fraldas, prepara refeições, brinca. Para Clara, a sensação é de voltar no tempo.
— Rejuvenesço no convívio com eles. É uma felicidade no dia em que sei que elas vêm aqui. Revivo tudo o que já vivi. Para mim, isso é vida — afirma a professora aposentada.
Com os netos mais velhos, há caronas da escola para outros cursos e muita conversa. Mas, quando é preciso, os limites ficam claros.
— Não sou daquelas avós que passa a mão na cabeça. Se tiver que xingar, eu xingo — diz Clara.
Afetividade e autoridade
Nesta sexta-feira (26) é celebrado o Dia dos Avós. São inúmeros os benefícios da relação próxima entre avós e netos, para todos os envolvidos. No caso dos idosos, é possível destacar a melhora da saúde mental, a sensação gratificante de continuidade da vida, a convivência e o aprendizado com outras gerações e a participação construtiva na educação de crianças e adolescentes.
Tânia Wolff, psicóloga do Centro de Estudos, Atendimento e Pesquisa da Infância e da Adolescência (Ceapia), onde coordena o Setor de Atendimento a Pais, destaca que se pode inferir que, se há uma convivência saudável entre avós e netos, significa também que existe uma boa relação entre esses idosos e seus filhos.
— Quando tem essa relação próxima, é porque já existe uma relação de respeito desses avós com seus próprios filhos para esses filhos confiarem nos seus pais — observa Tânia. — Para os avós, é uma sensação de perpetuação através dos netos. É algo que dá satisfação — complementa.
Como avós, os idosos encarnam duas representações bem marcantes: a afetividade e também a autoridade. É importante dosar esses elementos, tendo sempre como referência as regras e condutas estabelecidas pelos pais das crianças.
— É uma coisa mais solta, mas depende muito da dinâmica da família e do jeito do vô e da vó. Tem casa em que se pode fazer tudo o que os netos querem. Os avós têm que estar alinhados com os pais dos netos, incluindo genros e noras. Um cuidado importante: os avós podem não concordar com os pais, mas não podem desautorizá-los — recomenda Tânia.
Psicóloga e professora da Escola de Ciências da Saúde e da Vida e da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Irani Argimon constata que, hoje em dia, crianças e adolescentes convivem com até três gerações acima da sua, graças ao aumento da expectativa de vida. Essa experiência intergeracional é bastante rica.
— Com a gurizada, os avós conseguem entrar numa outra linguagem, num vocabulário atual, e isso te faz pertencente — comenta Irani.
Algo que também aproxima é a possibilidade de os mais jovens ensinarem sobre tecnologia aos mais velhos. Como a vida contemporânea é mediada por telas, os avós precisam ter o conhecimento suficiente desse universo para conseguirem interagir e estarem mais presentes.
— Assim como os avós podem pegar na mão dos netos para conduzi-los em algumas situações, os netos também dão a mão para os avós e os levam para esse mundo — diz Irani.