A cena mais surreal da partida entre Brasil e Equador aconteceu antes de a bola rolar, quando o presidente da CBF, Rogério Caboclo, e o técnico Tite se encontraram, conversaram e o dirigente até deu tapinha no ombro do treinador à beira do gramado do Beira-Rio.
Em meio a uma crise que os coloca em lados opostos não só em função da realização da Copa América em território nacional, poucos acreditavam que haveria algum contato tão público entre ambos em Porto Alegre. O que mais chamou a atenção, aliás, foi a presença de Caboclo tão próximo aos jogadores, algo que não é tão comum em tempos normais e, por isso, se tornou surpreendente em meio a um litígio inédito.
Rogério Caboclo talvez tenha aparecido no campo para ser visto aparentando altivez no dia em que mais um pedaço de seu mundo desabou. A denúncia formalizada por uma funcionária da CBF de assédio moral e sexual, com rico e escabroso relato, tem tudo para comprometer de vez a sequência do mandato presidencial na confederação.
Caboclo já tinha nas costas um desgaste com dirigentes de clubes, a distensão com a comissão técnica da Seleção e a forte contrariedade dos jogadores. Só faltava um escândalo em sua vida pessoal.
Agora ele tem também, e dentro da entidade, o que lhe tira até a simpatia do corpo funcional e até com seu guru político, o banido ex-presidente Marco Polo Del Nero. Resta pouco para ele. Uma deposição é previsível, seja por uma licença estratégica ou por renúncia.
O inferno que passou a ser a vida de Rogério Caboclo e seu nítido enfraquecimento chegará ao insustentável quando patrocinadores da CBF ou da Seleção começarem a pressionar. Um dirigente que assedia moral e sexualmente uma pessoa contamina o produto que é vendido. Aí vai mexer no dinheiro da entidade e isto é pecado mortal, imperdoável.
Com Caboclo frágil, seus desafetos ou opositores se fortalecem. O técnico Tite, por exemplo, talvez elimine de vez a dúvida entre seguir ao lado de quem não é mais seu aliado ou pedir para sair. O problema pode estar saindo antes, e a noite de terça-feira (8) deixará de ser a de despedida. O sonho do treinador e seu maior projeto da carreira não sofrerá interrupção, desde que quem siga no comando não seja mais hostil do que quem está desmoralizado e por sair da presidência.
Tite seguirá tendo motivos para pensar sua continuidade, mas estará com a certeza de que seu grupo de jogadores é leal e que, no fundo, também comunga do mesmo sonho. A cumplicidade no trabalho está fortalecida e pode estabilizar com a perspectiva de mudança no comando da CBF.
Até uma participação na rejeitada Copa América passa a ser possível, desde que marcada fortemente a posição e a rejeição dos profissionais que, segundo o capitão Casemiro, reconhecem hierarquias. Se o treinador estava à beira de pedir demissão, valerá esperar o comandante supremo espirrar do cargo por motivos muito mais graves.