Gostei muito da entrevista de Michel Temer no Timeline, da Rádio Gaúcha. O Potter, o David e a Kelly têm uma levada ótima, leve e profunda ao mesmo tempo. Lá pelas tantas, o ex-presidente externou uma ideia que deveria nos fazer pensar: o Brasil virou o país das ilações. Se referia à atuação do STF ao vetar a nomeação de um diretor-geral da Polícia Federal e a outros episódios desse grande bate-boca em que se transformou a cena pública nacional. Essa lógica nefasta que contaminou o país é um subproduto e, ao mesmo tempo, alimento da polarização.
Assim, se alguém critica Bolsonaro, vira automaticamente petista. Se critica a esquerda, vira bolsominion. Na gritaria das redes sociais, até rende o aplauso fácil das bolhas. Mas quando esse tipo de mecanismo – a ilação premiada – chega às relações institucionais, uma luz de alerta se acende. O STF, baseado em algo que alguém disse e que talvez virasse um possível ato ilícito no futuro imponderável, resolve decidir sobre atos corriqueiros de atribuição exclusiva do governo.
Agora, o Planalto reluta, corretamente, em entregar a gravação de uma reunião ministerial ao STF. Mesmo que as motivações bolsonaristas sejam circunstanciais, o debate carrega uma relevante dimensão de futuro. O STF se aprofunda em analisar a árvore e fica, a cada dia, mais cego para a floresta. São princípios que devem reger a atuação de uma Suprema Corte, e não os fins. Imaginemos que, daqui para a frente, diante de qualquer suspeita, um ministro togado poderá determinar que um outro poder abra as sua entranhas.
Jair Bolsonaro é uma catástrofe em termos de comunicação. É impulsivo, desagregador e violento ao se expressar, atropela o bom senso e a lei ao chancelar atos obscuros de apoio à ditadura, inventa inimigos compulsivamente e se boicota a cada dia. Mas isso não impede uma análise do mérito, que nesse caso, é absolutamente correto. O STF tem a última palavra sobre a Constituição, mas quer ter todas. Desse jeito, vai acabar falando sozinho.