Quando eu era criança, um dos meus maiores medos era de entrar no banheiro errado. Se ia a algum restaurante com a minha família, conferia pelo menos três vezes se a placa pendurada na porta do sanitário tinha o boneco de linhas retas e sem vestido desenhado. Um pouco maior, já sabendo ler, fiquei obcecado em busca das palavras mágicas que me permitiriam entrar sem perigo no ambiente: “masculino” e “cavalheiros”. Na minha cabeça pueril, a escolha errada significaria ser acusado de tarado ou, coisa pior, ser chamado de menina.
Depois, a gente cresce um pouco mais, ganha umas rugas, certa experiência, e aprende que entrar no banheiro errado não é grande coisa e que, fora das cabines reservadas às privadas, o toalete é um espaço de convívio social como qualquer outro. As pessoas batem papo enquanto lavam as mãos, falam do tempo, de futebol, perguntam dos filhos.
Talvez por isso soe esquisita para mim essa discussão em torno do uso de banheiros por pessoas transgênero. Esta semana mesmo, o Tribunal de Justiça do RS condenou uma casa noturna por impedir uma cliente de entrar no banheiro feminino.
Ora, se a pessoa se entende como mulher, qual o problema de utilizar o sanitário para mulheres? Convenhamos, ninguém tira a roupa na frente dos outros quando está no banheiro. O que é feito na privada, dentro das quatro paredes da cabine, é trabalho solitário, fica longe dos olhos alheios.
É possível que cause certo desconforto encontrar um homem ou uma mulher transgênero dentro do toalete. Lutar contra ideias preconcebidas é como lutar contra as ervas daninhas – por mais que a gente se esforce, fica sempre um pouco para trás. O que não dá é para transformar um ato tão individual quanto o de ir ao banheiro em um problema coletivo.
Com tantos problemas no país, tanta roubalheira em Brasília, tanta criança na rua passando fome, me impressiona que ainda tenha gente preocupada com quem escolheu um ou outro banheiro.