Há um punhado de filmes e séries que podem ajudar a entender a invasão da Ucrânia pela Rússia e a guerra travada no Leste Europeu, que nesta sexta-feira (3) chegou a seu 100º dia. Mas é importante ressaltar que cada um desses títulos apresenta apenas uma visão sobre um tema complexo.
Nessa lista, está o documentário Inverno em Chamas: A luta pela Liberdade da Ucrânia, que concorreu ao Oscar em 2016 e está disponível na Netflix. O filme dirigido por Evgeny Afineevsky acompanha as manifestações que ocuparam as ruas de Kiev entre o final de 2013 e o início de 2014 para protestar contra o governo de Viktor Yanukovych, que buscava estreitar laços econômicos com a Rússia. A violenta repressão acabou provocando uma guerra civil na Ucrânia.
Outro destaque é uma série que não é documental nem militar. Trata-se da comédia Servo do Povo, em cartaz na HBO Max e na Netflix. Lançado originalmente em 2015, o seriado é uma sátira da classe política ucraniana, que estaria mais preocupada em ficar rica do que em servir à nação. Indignados, os cidadãos elegem para a presidência um simples professor de História, após um vídeo dele criticando a corrupção viralizar. E quem intepreta esse personagem? O então ator e comediante Volodimir Zelensky, que depois aproveitaria a enorme popularidade para fazer a realidade imitar a ficção, elegendo-se presidente da Ucrânia em 2019.
O terceiro título que eu recomendo é Klondike: A Guerra na Ucrânia (2022), que ganhou prêmios no Festival de Sundance e no Festival de Berlim e pode ser visto na plataforma Now e alugado (por R$ 12, 90) na Belas Artes à La Carte. O filme escrito, dirigido e editado por Maryna Er Gorbach se passa em 2014. Irka, a protagonista, e seu marido, Tolik, vivem em Donetsk, nas proximidades da turbulenta fronteira entre Ucrânia e Rússia. Na primeira cena, descobrimos que o casal aguarda o primeiro filho. Assim que Tolik diz que quer se mudar para longe da guerra, uma bomba destrói parcialmente a casa dos personagens.
Mas Irka está decidida a ser mãe ali mesmo. Tenta manter uma rotina — ordenha a vaca, limpa a casa — como forma de lidar com o horror e o absurdo da guerra. Une seu instinto de sobrevivência ao amor pelo país. Enquanto isso, Tolik é pressionado por seus amigos separatistas pró-Rússia a se juntar a eles. A tensão aumenta com a visita do irmão de Irka, um soldado nacionalista.
A situação se complica ainda mais quando um avião civil, o Boeing 777 da Malaysian Airlines, cai na região, matando 298 pessoas, provavelmente abatido por engano. A tragédia não é fictícia: aconteceu em 17 de julho de 2014. Se Klondike fosse um filme de Hollywood, veríamos cenas de ação e catástrofe, mas aqui essas coisas são pano de fundo. O foco está no impacto da guerra em uma família comum.
Os duelos verbais entre Tolik e Yarik oferecem algum alívio cômico, como quando o primeiro diz que o filho vai se chamar Vladimir (em alusão a Putin), e o cunhado retruca: "Vladimir. É um belo nome. Significa merda".
Mas a frase que marca o filme é outra, soturna e desoladora:
— A guerra só vai acabar quando os inimigos estiverem mortos.