Recém adicionado ao catálogo da Netflix, Host (2020) é um filme de terror que, literalmente, capta o espírito de seu tempo.
Dirigido e coescrito pelo britânico Rob Savage, com um elenco bastante desconhecido, Host — também conhecido como Cuidado com Quem Chama — tem pontos de contato com outro título lançado em fevereiro pela plataforma de streaming, Malcolm & Marie. Ambos foram rodados durante a pandemia de coronavírus, praticamente na mesma época: junho no caso do drama estrelado por John David Washington e Zendaya, julho no média-metragem (55 minutos) de horror.
Ambos seguiram os protocolos de segurança sanitária: um único cenário, apenas dois atores e uma equipe enxuta em Malcolm & Marie, e direção a distância e cada atriz em sua casa em Host. E ambos refletem sobre efeitos da quarentena.
Em Malcolm & Marie, a covid-19 sequer é citada, mas a longa discussão sobre o relacionamento dos personagens pode espelhar a situação de muitos casais que, de uma hora para outra, viram-se confinados e impedidos de esconder suas mágoas em outros lugares ou com outros afazeres. Em Host, um grupo de amigas em distanciamento social, oscilando entre o tédio e a ansiedade, resolve apimentar suas reuniões via Zoom, o aplicativo de vídeo que ganhou popularidade neste último ano.
O algo novo a que se propõem é uma sessão espírita virtual. Antes de Haley (interpretada por Haley Bishop) chamar a médium Shaylan para o encontro, Rob Savage dá tempo para conhecermos um pouco da personalidade de cada personagem. Radina (Radina Drandova), por exemplo, resolveu aproveitar o lockdown para morar com o namorado, o que vem se mostrando uma decisão precipitada. Jemma (Jemma Moore) usa o humor (nem sempre apropriado) como paliativo. Emma (Emma Louise Webb) gosta de testar filtros assustadores nas chamadas de vídeo, e Caroline (Caroline Ward), para combater a solidão, criou uma "irmã gêmea": ela própria aparece em seu fundo de tela, entrando no quarto, mexendo no celular, abrindo a gaveta de uma cômoda.
A troca de amenidades inicial também permite espiar os ambientes e alguns objetos. Todos esses elementos — os dramáticos e os cenográficos — vão ressoar mais à frente, quando a turma já estiver às voltas com um espírito maligno.
Host deve à forma bastante de seu encanto. O filme se enquadra no subgênero found footage, o das imagens captadas pelos próprios personagens, como em vídeos caseiros, ou registradas por câmeras de segurança. São representantes ilustres dessa vertente A Bruxa de Blair (1999) e as franquias Rec e Atividade Paranormal.
Savage conta toda a história como se fosse o vídeo de uma reunião via Zoom encontrado. O que vemos é o que as câmeras dos computadores, notebooks e smartphones do elenco conseguem enquadrar e mostrar. Diante dessa restrição visual — e um tanto de movimentação —, o espectador não é capaz de antecipar sustos e ameaças.
O diretor também é inteligente ao misturar eventos sobrenaturais aos problemas rotineiros da comunicação virtual, como queda da conexão de internet, interferências na imagem e ruídos. Ninguém —nem as amigas, nem nós — sabe distinguir uma coisa da outra. Até que cadeiras começam a se mexer sozinhas e personagens começam a sumir de cena.