Todos os filmes-catástrofe se parecem, mas uns sobrevivem mais um pouco. É o caso de Destruição Final: O Último Refúgio (Greenland, 2020), que estreou recentemente no Amazon Prime Video (e ainda está em cartaz nos cinemas).
E não sou só eu quem acha isso. No Rotten Tomatoes, a obra tem 76% de aprovação, um número bem alto na filmografia recente de seu astro, o escocês Gerard Butler. De 2009 para cá, tirando as participações como dublador na franquia de animação Como Treinar seu Dragão e o drama de guerra shakespeariano Coriolanus (2011), todos os títulos estrelados pelo eterno Leônidas de 300 (2006) ficaram abaixo de 50% no site agregador de críticas.
A trama de Destruição Final foi escrita por Chris Spalding, roteirista de Enterrado Vivo (2010), e dirigida por Ric Roman Waugh, que trabalhou com Butler em Invasão ao Serviço Secreto (2019), terceira aventura do agente Mike Banning. Aqui, o ator deixa de lado as armas e (nem tanto) os punhos para encarnar o engenheiro civil John Garrity. O que não muda é que seu personagem está diante de uma grande ameaça, mas agora em nível realmente global.
Um enorme cometa está se aproximando da Terra. O que começa como uma curiosidade midiática — tipo a passagem do Halley, em 1986, os mais velhos devem lembrar — logo se transforma em tragédia e tormento. Alguns fragmentos do corpo celeste causam apenas pequenos danos materiais, mas outros, muitos outros, provocam ondas de devastação. Uma cidade americana é simplesmente riscada do mapa. E há a previsão de que um pedaço grande poderá acabar com o mundo como o conhecemos.
Um dos trunfos de Destruição Final é não enrolar, como acontece geralmente com os títulos do gênero. De partida, apresenta o perigo coletivo e os dramas individuais: John está em processo de separação da esposa, Allison (a brasileira Morena Baccarin, dos seriados Homeland e Gotham e dos filmes do Deadpool). O filho do casal, Nathan (Roger Dale Floyd), tem diabetes e precisa tomar insulina regularmente — sua situação médica será gatilho, mais à frente, para alguns dos principais momentos de aflição.
O que nos leva a outro trunfo do longa-metragem, a economia. Os números comprovam: Destruição Final custou US$ 35 milhões, contra, por exemplo, os US$ 120 milhões de outro filme-desastre com Gerard Butler, Tempestade: Planeta em Fúria (2015). Sem um orçamento astronômico (perdão pelo trocadilho), o diretor Ric Roman Waugh faz um uso parcimonioso dos efeitos de computação gráfica, evitando aquelas exageradas sequências apocalípticas que pautam os filmes de um Roland Emmerich (Independence Day, O Dia Depois de Amanhã, 2012...). O foco está na família Garrity e na sua relação com os demais personagens (encarnados por atores como David Denman, Hope Davis, Holt McCallany e o veterano Scott Glenn, 80 anos) enquanto lutam pela sobrevivência.
Essas interações são tensionadas por um terceiro trunfo: o engenheiro, sua esposa e o menino estão entre os raros cidadãos dos Estados Unidos selecionados para uma espécie de Arca de Noé. Chegar a ela em meio ao caos será a odisseia dos Garrity, temperada pelo desespero dos vizinhos preteridos e pela inveja dos estranhos com quem cruzam no caminho. Por que eles e não nós (ou por que nós e não eles)? Como é saber que as pessoas com quem convivemos estão condenadas à morte? A dignidade vale mais do que a chance de escapar? São reflexões que conseguem ser pelo menos ensaiadas enquanto John, Allison e Nathan correm em busca do último refúgio.