Lilo & Stitch (2002), disponível no Disney Plus, é um dos próximos longas-metragens de animação da Disney a ganhar uma refilmagem no que se convencionou chamar de live-action. Poucos desses títulos usam apenas atores de verdade, como Mulan (2020), que está para estrear na plataforma de streaming — no próximo dia 4 —, alguns sequer empregam um elenco de carne e osso, caso de O Rei Leão (2019). E há aqueles em que as estrelas não são humanas nem geradas por computação gráfica, vide A Dama e o Vagabundo (2019), que manteve a magia e o romantismo do clássico desenho de 1955.
Pelo que se sabe, Lilo & Stitch deve misturar atores e personagens digitais, tipo Aladdin (2019). O diretor e o elenco ainda não foram anunciados, mas é certo que Chris Sanders, correalizador da animação original ao lado de Dean DeBlois, voltará a emprestar sua voz ao endiabrado alienígena que vai parar no Havaí.
Nesse Estado americano localizado no Oceano Pacífico, ohana quer dizer família. E família quer dizer nunca abandonar nem esquecer. Pois bem, depois de assistir a Lilo & Stitch, você nunca mais esquece da família que uma menininha órfã, tão adorável quanto tinhosa, encontra ao dar abrigo a um patinho feio que veio do espaço.
Indicado ao Oscar da categoria, Lilo & Stitch não chegou a ser um grande sucesso de bilheteria. Arrecadou US$ 273 milhões, 42% do que fez a mais recente aventura Disney pelas ilhas do Pacífico, Moana (2016). Mas ajudou o estúdio a enxergar, na época, um caminho para além das parcerias digitais com a Pixar — eram os tempos em que Toy Story e Monstros S.A. ofuscavam as pratas da casa.
Lilo & Stitch não só retomou os desenhos à mão — há amplo uso de aquarelas nos cenários — como rompeu com convenções. Os protagonistas não são modelos de conduta. Lilo, por exemplo, não hesita em dar um soco numa coleguinha, além de infernizar a vida da irmã mais velha, a atrapalhada Nani. Stitch é a criatura mais destrutiva e rabugenta de todas as galáxias. E não há números propriamente musicais, exceto quando Lilo ensina Stitch a dançar o hula-hula.
Pelo ritmo desenfreado, pelo caráter dos heróis e até pela trilha sonora (com cinco canções na voz de Elvis Presley, de Hound Dog a Stuck On You), essa comédia no Havaí lembra os desenhos do Pernalonga produzidos pela Warner. Nos primeiros 10 minutos, há muita ação e armas laser na apresentação de Stitch, cria de um cientista louco, Jumba. Os 10 minutos seguintes mostram o cotidiano da solitária Lilo, que, devido à desordem de sua casa, corre o risco de ser afastada da irmã por um severo assistente social, Cobra Bubbles (um tipo criado à imagem do grandalhão Ving Rhames, de Pulp Fiction).
O encontro dos dois mundos se dá quando Stitch foge do planeta Turo e vai parar na Terra. Aqui, o monstrinho se faz passar por cachorro. Acaba adotado por Lilo, que, ao ver uma estrela cadente (na verdade, a nave de Stitch), havia pedido um amigo.
— Podia ser um anjo — sugere a órfãzinha.
Bom para nós que veio um diabinho! E, para o público gaúcho, a versão em português tem um charme extra. Não sei como anda hoje, mas, naquela época, as dublagens dos desenhos Disney no Brasil seguiam um rodízio de regionalização.
Em Atlantis: O Reino Perdido (2001), um dos integrantes da expedição era "mineiro". Em A Nova Onda do Imperador (2000), se falava de manteiga de garrafa, item típico da cozinha nordestina. Em Lilo & Stitch, o diretor de dublagens Manoel Garcia Jr. privilegiou o sotaque do Rio Grande do Sul.
— Bá, trilegal — diz um alienígena, no típico gauchês.
Quando Stitch é atropelado por um caminhão, já no Havaí, o motorista desce e pergunta ao colega:
— Mas o que foi isso, tchê?