Peço licença para usar a frase que o saudoso Washington Olivetto criou para uma campanha inesquecível da Valisère, tradicional marca de roupas íntimas: o primeiro voto a minha geração não esquecia. O primeiro voto era como a primeira boneca, o primeiro caderno, o primeiro amor, a primeira desilusão. Naqueles anos de ditadura, o voto era restrito. Fomos às ruas pedir eleição direta, mas ela só viria em 1989.
Votei pela primeira vez aos 22 anos, na eleição de 1982. Na de 1978 ainda não tinha título eleitoral, porque completei 18 anos muito perto da data de votação. O título era um documento com foto e espaço suficiente para carimbar o voto em várias eleições. O meu não chegou a ser totalmente preenchido porque, no meio do caminho, mudou de aparência e o antigo virou peça do museu particular que temos em alguma gaveta.
No meu primeiro voto, acordei cedo e fui até a igrejinha da Rua Lucas de Oliveira, onde ficava a minha seção. Não tinha fila. Votei para governador, senador, deputado estadual e deputado federal. Lembro de todos os votos, mas aqui não vem ao caso.
À tarde, trabalhei e essa foi também a minha primeira eleição como jornalista, uma emoção para a "foquinha" que tinha se formado na PUC no dia 8 de janeiro daquele ano. Trabalhei na redação da Rádio Guaíba, e acompanhei uma apuração que parecia sem fim. Naquela época, se passava dias e dias contando votos. Em uma das noites de apuração, ocupei o microfone dando apoio ao querido Amir Domingues, uma lenda do rádio dos anos 1980. De lá para cá, cobri todas as eleições - nos últimos 32 anos aqui no Grupo RBS.
É por isso que dou tanto valor ao voto. Por muitos anos fomos impedidos de escolher o prefeito de Porto Alegre, porque as capitais eram áreas de segurança nacional. Só em 1985 nos foi permitido votar e Porto Alegre escolheu Alceu Collares, que cinco anos depois viria a ser governador. Até hoje, Collares declama, com aquele vozeirão, o poema O voto e o pão:
"Mandam no teu destino
Mas ele é teu, meu irmão
Ergue teus braços finos
E acaba com a exploração
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
Tua casa está caindo
Pouca comida tem no fogão
Tua mulher está mal vestida
Teu filho de pé no chão
Faz tua revolução!
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
Escravismo, feudalismo, capitalismo
Socialismo, tudo em vão
Vai milênio, vem milênio
E continuas na escravidão
Faz tua revolução!
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
Cristianismo, judaísmo, hinduísmo
Todos querem a tua salvação
Tu rezas noite e dia
Ninguém ouve a tua oração
Faz tua revolução!
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
Construíste, com teu trabalho
Toda riqueza desta nação
Por justiça, tens o direito
Vai pegar o teu quinhão
Faz tua revolução!
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
A liberdade é o pão do espírito
Do corpo, a liberdade é o pão
Desperta pra luta amigo
Faz tua revolução
O voto e tua única arma
Põe teu voto na mão
O voto e tua única arma
Põe o teu voto na mão
O voto é tua única arma
Põe teu voto na mão"