Em 2018, o general Augusto Heleno deixou de lado a sisudez que a farda lhe conferia e cantou meio desafinado: "Se cantar pega centrão, não fica um meu irmão...". Era uma versão modificada do clássico "Se gritar, pega ladrão...”. Quatro anos depois, na convenção do PL em que foi confirmado candidato à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro saiu em defesa de políticos do mesmo centrão, quando a plateia do Maracanãzinho ensaiou uma vaia ao presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).
— Sem Lira não teríamos conseguido aprovar os projetos que aprovamos para baixar o preço da gasolina — elogiou.
O mesmo Bolsonaro que em 2018 chamava os políticos do centrão de escória ou de "tudo o que há de pior no país", loteou o governo entre esse grupo para garantir sustentação no Congresso. Levou para a Casa Civil o presidente do PP, Ciro Nogueira, hoje seu braço direito. O partido que escolheu para concorrer é chefiado por ninguém menos que Valdemar da Costa Neto, um dos condenados no escândalo do mensalão, no primeiro governo Lula.
Os elogios aos políticos do centrão não foram a parte mais importante da convenção, mas os ataques às urnas eletrônicas e aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem chamou de "surdos de capa preta". Ao convocar seus seguidores para "uma última manifestação" em 7 de setembro, o presidente voltou a adotar o tom golpista, enquanto os simpatizantes gritavam o refrão "supremo é o povo".
O esquecimento nesta eleição não é exclusividade de Bolsonaro. Na tentativa de tirar Simone Tebet do páreo, seu principal adversário, o ex-presidente Lula, vem cortejando políticos que em 2016 derrubaram a então presidente Dilma Rousseff.
Michel Temer, o vice-presidente decorativo que tramou o impeachment de Dilma, era chamado de golpista por 10 entre 10 petistas. Agora acena com a possibilidade de apoio a Lula e o ex-presidente busca a aproximação com o MDB.
Na semana passada, Temer disse que Dilma era "honestíssima" e classificou como mentira atribuir corrupção ao governo dela. Disse que o impeachment teve motivação política, porque Dilma teria "dificuldade de se relacionar com o Congresso Nacional e com a sociedade". Em nota, a ex-presidente rebateu seu algoz: "Agradeceria que o senhor Michel Temer não mais buscasse limpar sua inconteste condição de golpista utilizando minha inconteste honestidade pessoal e política".
Aliás
Enquanto Bolsonaro incita seus seguidores contra a urna eletrônica e os ministros do STF, desvia o foco da falta de propostas, da inflação na casa dos dois dígitos, do leite a mais de R$ 7 e dos problemas reais dos brasileiros.