Um dia depois de o Centro da Indústria e Comércio de Bento Gonçalves ter cancelado a reunião-jantar com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, e repassado o convidado para a OAB, o ministro cancelou a vinda ao Rio Grande do Sul no dia 3 de junho. Poderia ser uma simples reação do ministro diante da desfeita, mas o episódio é mais grave e exige uma profunda reflexão sobre democracia e respeito às instituições da República.
A assessoria do ministro atribuiu o cancelamento da visita à falta de segurança, replicando a justificativa da presidente do CIC, Marijane Paese, ao suspender o jantar e repassar o convidado para a OAB. A decisão, na verdade, foi tomada depois que dois patrocinadores (Sicredi e Saif) se rebelaram e que outros associados criticaram o convite a Fux com a alegação de que a entidade é “apartidária”.
A OAB de Bento Gonçalves se entusiasmou com a ideia de receber o ministro, reservou o auditório do Spa do Vinho para a palestra e começou a se mobilizar para organizar um evento histórico. Já tinha manifestação de interesse para quase metade das 150 vagas quando recebeu o telefonema de um funcionário do STF informando sobre o cancelamento da visita. O Spa do Vinho é um hotel com acesso restrito, o presidente do Supremo tem direito a segurança da Polícia Federal e a Brigada Militar estava disposta a garantir proteção.
Se um Estado que já recebeu o Papa e todos os presidentes da República da história recente não consegue oferecer segurança ao chefe do Poder Judiciário é porque há algo de muito grave ocorrendo nessa radicalização que imbeciliza até aqueles de quem se espera racionalidade.
Nas redes sociais, viu-se até néscio com mandato comemorando a mistura de indelicadeza e violência como se fossem a prova de que “ministros do STF não podem andar nas ruas e nem darem palestras, em ambientes fechados”. Tomar essa afirmação como verdadeira é dizer que o Rio Grande do Sul é um Estado de bárbaros, incapazes de garantir a segurança do chefe de um dos três poderes.
Que risco correria Fux no Rio Grande do Sul? A presidente do CIC alegou que a sede fica em meio ao parque onde está sendo preparada a Expobento e que no dia 3 haveria operários trabalhando no local e expositores preparando seus estandes. Risco de vaia? De uma chuva de ovos ou tomate como já se viu em outros tempos, em diferentes Estados? Ou de algo mais grave, como um atentado?
No Spa do Vinho não haveria riscos, a menos que a segurança do Supremo tenha sido alertada para algo mais grave, tramado no esgoto da deep web. Seja o que for, Bento Gonçalves — cidade que leva o nome do herói da Revolução Farroupilha — deu motivos para ter seu nome associado à intolerância. Pena, porque esse município tão próspero deveria ser lembrado pelos bons vinhos, a boa comida e a hospitalidade.
Com razão, o presidente da OAB de Bento Gonçalves, Rodrigo Terra de Souza, está constrangido. Democrata que é, Rodrigo diz que é importante ouvir aqueles de quem discordamos. O advogado lamenta as reações contrárias à presença de Fux, que interpreta como antidemocráticas. E são.