![Rosane de Oliveira / Arquivo pessoal Rosane de Oliveira / Arquivo pessoal](https://www.rbsdirect.com.br/filestore/8/9/5/5/2/5/1_c5b4928e789407d/1525598_3a5e7dc3598baab.jpg?w=700)
No fim de semana de 15 de novembro floresceu pela primeira vez uma orquídea que chegou à casa do Parque Eldorado medindo menos de cinco centímetros. Era presente do querido colega Henrique Erni Grawer, revisor que sabia tudo de gramática, de flores e de gentileza. Ele me trouxe três mudinhas de Novo Hamburgo e as coloquei em árvores para que crescessem. Como não nos vemos desde que a pandemia começou e de um dia para outro passamos a trabalhar em casa, mandei a foto para o Erni, que me respondeu assim:
— Já duas! Que alegria! Aproveitando, tinha que te falar do cactário Horst, em Imigrante. Lis Aline deu a dica, quando falávamos sobre suculentas. Falaste dia desses no rádio em ir ao Cristo Protetor. Observei que, tendo-se Lajeado como base, os dois passeios ficam à mão. (Mapa dos caminhos traz algumas cascatas nos trajetos. Bom para o verão.) Quem conhecer primeiro conta para o outro.
Na nossa troca de mensagens, falamos de saudade e da expectativa de voltar à redação. Erni disse que tinha um certo medo do "ambiente hospitalar" e me contou que numa conversa com a colega Ana Karina brincou que “deveríamos trabalhar uns na casa dos outros para matar a saudade”.
Nunca mataremos a saudade, nem falaremos de orquídeas e jabuticabas, nem poderei mandar mensagem no dia de Natal, cumprimentando pelo aniversário. Porque o Erni se foi nesta sexta-feira nublada, com a mesma discrição que marcou sua vida. Teve um mal súbito, foi socorrido, mas não resistiu. Morreu um mês antes de completar 60 anos.
No meu aniversário, em 5 de agosto, ele escreveu assim: “Dia de reafirmar: votos de muitos anos de vida. Que seja longa, sem perderes a característica jovialidade. Para manter parte da tradição, comerei um pedação de torta daqui a pouco. Beijo”.
A torta era uma tradição no tempo em que podíamos nos aglomerar na salinha que ocupei quando assumi a coluna então chamada de Página 10. Os colegas chamavam de “casinha da Mônica”, porque tenho essa mania de colocar flores sobre a mesa de trabalho e de comemorar o aniversário. Erni às vezes chegava depois dos outros, porque não gostava de interromper a revisão de uma página no meio.
![Ricardo Chaves / Agencia RBS Ricardo Chaves / Agencia RBS](https://www.rbsdirect.com.br/filestore/6/2/6/5/2/5/1_05198d9b455c95e/1525626_7438a213aa22c51.jpg?w=300)
Por muitos anos, me salvou das armadilhas da gramática, da minha desatenção ao teclado, do erro na grafia dos nomes próprios que parecem levar acento, mas não têm. Erni era o nosso Aurelião de carne, osso e delicadeza. Nosso Houaiss que tirava dúvidas, indicava sinônimos, falava pouco e lia muito. Acho que nunca dei a ele um presente que não fosse livro. Nas horas vagas, pesquisava sobre plantas — elo que nos ligará para sempre. Compartilhávamos a paixão pelo Rio de Janeiro e sempre que um voltava, contava ao outro sobre as novidades.
Não irei me despedir do Erni. O corpo já não é nada. Dele prefiro guardar a lembrança da figura discreta por trás dos óculos no fundo da redação.
O velório de Henrique Erni Grawer será na Funeraria Krause, em Novo Hamburgo, na capela C (Rua Santos Pedroso, 155), das 9h às 16h30min deste sábado. O sepultamento ocorrerá no Cemitério Municipal de Novo Hamburgo.