A prefeitura de São José do Norte, no Sul do Estado, foi autorizada pela Justiça Federal a contratar médicos que não prestaram o Revalida - exame feito anualmente que testa o conhecimento de médicos diplomados fora do Brasil. Com isso, médicos formados em outros países que não possuem registro no Conselho Regional de Medicina poderão atuar na cidade enquanto perdurar o estado de calamidade pública em decorrência da pandemia de coronavírus.
A decisão liminar foi proferida pelo juiz Sérgio Renato Tejada Garcia, da 2ª Vara Federal de Rio Grande. O presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), Carlos Isaia Filho, informou que a entidade vai recorrer da decisão.
De acordo com a prefeitura de São José do Norte, o município opera com leitos de UTI no limite e enfrenta "grande deficiência de médicos" nos hospitais, unidades de pronto atendimento e postos de saúde. Somente em março, teriam faltado 12 profissionais para atender aos pacientes no município, que tem cerca de 27 mil habitantes.
Segundo a prefeitura, além da demanda crescente provocada pela pandemia, a carência de médicos se deve a fatores como a convocação para prestar serviço militar, o ingresso dos profissionais em residência médica e a localização da cidade, cujo acesso desde Rio Grande requer o uso de lancha.
Na decisão, o juiz determina que o Cremers se abstenha de exigir licença para o exercício da medicina em São José do Norte de profissionais diplomados fora do Brasil e que nenhuma penalidade seja aplicada ao município.
"Assim, considerando a situação de excepcionalidade em que vivemos, é prudente o afastamento de regras básicas para permitir que médicos estrangeiros, ainda que sem revalidação do diploma, possam atuar na linha de frente do combate ao coronavírus", escreveu o magistrado, na decisão.
À coluna, o presidente do Cremers explicou que a posição da entidade é de dar "validade e credibilidade" a médicos inscritos no conselho, o que só pode ocorrer mediante a aprovação no Revalida.
— Não é uma questão de preservar os médicos com registro, mas de proteger a população para que possa ser atendida por profissionais que o conselho julga capacitados para o atendimento — explicou Carlos Isaia Filho.
Também consultado, o presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Marcelo Matias, disse que a obtenção do registro para a atuação na medicina é "fundamental" e que só abrem mão de contratar médicos sem registro os locais em que a condição de trabalho e a remuneração não são adequadas.
— Quando se abre mão do registro no conselho, não temos a convicção ou a certeza de que esses profissionais têm a condição adequada para exercer a profissão de médico no nosso país — afirmou Matias.
Rio Grande não obteve autorização
A prefeitura de Rio Grande ajuizou ação semelhante para conseguir a mesma autorização obtida por São José do Norte. O processo também foi protocolado na 2ª Vara Federal de Rio Grande, mas foi examinado por um juiz diferente, que não concedeu a liminar.
Conforme o procurador-geral do município, Enio Fernandez Jr., a prefeitura já recorreu da decisão:
— Não conseguimos entender que em uma situação de anomalia, a situação seja enfrentada pelas vias normais. É difícil as pessoas entenderem como o mesmo órgão julgador autoriza a contratação para uma cidade e não autoriza para outra.
O procurador disse que a falta de médicos não está relacionada às condições de trabalho ou de remuneração, mas da ausências de profissionais disponíveis para atuação. Segundo ele, há risco iminente de o sistema de saúde de Rio Grande entrar em colapso.
— Estamos em uma situação constrangedora em que a cidade que tem quase quatro vezes mais habitantes do que a cidade vizinha (São José do Norte) está deficitária de atendimento médico, enquanto a cidade vizinha consegue — disse Fernandez.
Na decisão em que negou o pedido de Rio Grande, o juiz federal Gessiel Pinheiro de Paiva ponderou que o Revalida tem respaldo em lei, de modo que "somente o Poder Legislativo, também através de lei, pode alterar essa regra".
"Os gestores públicos municipais devem atuar, portanto, no âmbito político/legislativo, junto aos deputados de sua bancada, visando agilizar a tramitação desse importante projeto de lei, não cabendo ao Poder Judiciário interferir nessa questão, pois importaria em atuar como legislador positivo, criando norma legal inexistente e contrária ao ordenamento jurídico vigente", escreveu o magistrado.
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