Uma bomba. É essa a primeira imagem que vem à mente de juristas, políticos e cidadãos comuns que acompanharam todos os desdobramentos da Operação Lava-Jato diante da decisão do ministro Edson Fachin, que anula as condenações impostas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas diferentes instâncias do Judiciário. Assim que a decisão for publicada, Lula estará livre para ser candidato em 2022 e todas as acusações que pesam contra ele voltarão à estaca zero.
Como se tratou de uma decisão monocrática, a Procuradoria-Geral da República vai recorrer, mas o fato é que, hoje, está se formando a tempestade perfeita para uma convulsão social. Assim que a decisão foi tornada pública, a Bolsa de Valores, que vinha claudicante por erros do presidente Jair Bolsonaro, caiu, enquanto o dólar — já nas alturas — deu novo salto. Como o dólar impacta nos preços dos combustíveis, dos alimentos e de quase tudo o que se consome no país, cresce a chance a inflação disparar. Nada é tão ruim que não possa piorar.
Na política, a decisão acirra ainda mais a disputa esquerda x direita e amplia o descrédito do Supremo Tribunal Federal aos olhos do cidadão. Se os processos envolvendo Lula têm problema de territorialidade, por que demorou tanto tempo para um ministro concluir que a Justiça Federal do Paraná não tinha competência para investigá-lo?
O despacho de Fachin, proferido nos embargos declaratórios de um habeas corpus, não questiona o mérito das acusações que resultaram em condenações referendadas pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, pelo Superior Tribunal de Justiça e, em alguns casos, pelo próprio Supremo Tribunal Federal.
Como esperar que o cidadão brasileiro entenda que só agora a Corte Suprema entendeu que o foro adequado era a Justiça Federal do Distrito Federal e não a do Paraná? E as provas, materiais e testemunhais, as quebras de sigilo, as confissões, as delações premiadas? Finge-se que nada existiu?
Os petistas soltaram foguetes com a decisão de Fachin, embriagados por pesquisas que mostram Lula como o nome mais competitivo para enfrentar o presidente Jair Bolsonaro na eleição do ano que vem. Não percebem o risco do efeito contrário: de a insistência em tentar apagar os desvios ocorridos na Petrobras acabar favorecendo um presidente que vem perdendo força em setores importantes da sociedade por sua inabilidade na condução do país na pandemia. Uma disputa com Lula é tudo o que Bolsonaro quer, porque assim ele foi eleito em 2018, mesmo o candidato tendo sido Fernando Haddad.
Os erros cometidos pelo então juiz Sergio Moro e por integrantes da força-tarefa da Lava-Jato não apagam o fato de que a investigação identificou desvios bilionários na Petrobras e em outras estatais, mapeou pagamento de propina, identificou corruptos e corruptores e repatriou dinheiro depositado em paraísos fiscais. Se tudo o que se apurou nesses anos todos sobre Lula se apagar, outros réus da Lava-Jato serão beneficiados e a confiança no Poder Judiciário será seriamente abalada, criando um quadro potencialmente perigoso para a democracia.
Aliás
Só falta os tubarões e os peixes médios e pequenos que fizeram acordos de delação premiada e entregaram parte do dinheiro roubado para se livrar da cadeia pedirem agora o ressarcimento, com juros, correção monetária e indenização por dano moral. Em meio à pior catástrofe sanitária da história, tudo o que o Brasil não precisa é de uma turbulência jurídica que desvie o foco do colapso na saúde, com pessoas morrendo por falta de leitos de UTI.