No princípio, era apenas a CPMF com outro nome e enfrentava a rejeição do presidente Jair Bolsonaro porque era entendida como quebra de uma promessa de campanha. Como viu que não havia clima no Congresso para aprovar um imposto extinto no governo Lula com os votos dos agora aliados do Palácio do Planalto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, promoveu o redesign do bicho-de-sete-cabeças. Na última versão, defendida nesta quarta-feira (29) pelo ministro, a embalagem ficou mais atraente, mas o conteúdo tem as mesmas características da CPMF e poderá ser ainda mais pesado.
Guedes não detalhou, mas fez um daqueles discursos que acompanham a explicação na apresentação do redesenho de uma marca. A caquética CPMF se transmutou em Imposto sobre Pagamentos. Mais clean, fácil de entender e, principalmente, de arrecadar. Incidiria sobre todas as transações eletrônicas, para contemplar a “economia digital”. Para os leigos, significa uma taxa sobre pagamentos de boletos com código de barras e transferências de valores feitas pelo celular e computador, com certeza. E, provavelmente, os caixas eletrônicos dos bancos, porque se forem excluídos será fácil escapar do imposto.
O leque de dúvidas se abre. Um saque no terminal do Banco 24 horas será considerado uma operação eletrônica? Estará o ministro querendo ressuscitar as filas nas agências bancárias, eliminadas pela tecnologia? Ou quando o projeto ganhar forma definitiva os saques e pagamentos na boca do caixa também serão taxados para que os bancos não tenham de contratar mais gente, abrir agências e engordar estruturas para dar conta da demanda?
Para tornar o Imposto sobre Pagamentos mais palatável, Guedes adicionou luzinhas coloridas à embalagem. Se for aprovado, o governo poderá reduzir outros impostos e aumentar a faixa de isenção do Imposto de Renda. O mesmo governo que segue a trilha dos antecessores, não corrige a tabela e faz o assalariado pagar mais Imposto de Renda a cada ano propõe uma troca: corta de um lado, cobra de outro, ou acaba com as deduções de despesas com saúde e educação na hora do acerto de contas com o Leão.
Se esse discurso pode parecer atraente para os brasileiros que pagam Imposto de Renda, como seduzir os outros, que não pagam? Guedes amarra um tope de cetim na caixinha de surpresas: acena com a extinção de impostos sobre fogão, geladeira, máquina de lavar roupa (não citou máquina de lavar louça, mas deveria para tornar mais popular a proposta).
— Podemos redistribuir, criar uma base ampla, nova, e aí você pode, se criar uma base ampla nova e tributar um pouco ali, pode reduzir o Imposto de Renda, eliminar alguns IPIs (Imposto sobre Produtos Industrializados), pode até reduzir, cinco, seis, sete, oito, dez impostos — acenou o ministro.
Não está claro se o imposto sugerido como Guedes teria um dos méritos da CPMF, que era taxar o profissional liberal que não dá recibo, o contrabandista, o traficante, o sonegador convicto, o corrupto que esconde dinheiro em cuecas, meias e malas. Com a caixa fechada, o contribuinte só tem pistas — algumas preocupantes — do que será a segunda parte da reforma tributária.
Aliás
A coincidência de o lançamento da nota de R$ 200 ocorrer no momento em que se discute a criação de um imposto sobre transações eletrônicas leva a uma pergunta óbvia: estará o governo querendo estimular a volta ao século passado, com estímulo aos pagamentos em espécie? Qual é o sentido de lançar uma nota de R$ 200 quando o mundo prefere pagar com cartão de crédito ou débito?
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