A reação das autoridades diante do fuzilamento de um inocente por homens do Exército, no Rio de Janeiro, é tão preocupante quanto o ato em si. Porque se não houver reconhecimento de que foi um erro grave, o risco é de que se repita com outras famílias o absurdo de disparar contra um carro por ser parecido com o usado por um assaltante.
Oitenta tiros atingiram o carro em que estavam o músico Evaldo Rosa dos Santos, a mulher, o filho de sete anos, o sogro e uma amiga, a caminho de um chá de bebê. Evaldo morreu, o sogro ficou ferido e um catador que tentou ajudar a família foi baleado e está em coma.
O caso ocorreu no domingo (7) e, de lá para cá, o que se viu foi uma sucessão de desculpas esfarrapadas. Primeiro, os militares alegaram ter revidado um ataque de criminosos, matando um assaltante.
Como havia testemunhas e o resto da família sobreviveu, a versão caiu por terra e 10 dos 12 militares foram presos. O episódio está sendo investigado e a promessa é de que os responsáveis serão punidos na forma da lei.
As autoridades, cada uma a sua maneira, tiraram o corpo fora, enquanto os defensores da política de exterminar suspeitos foram para as redes sociais dizer que a morte de Evaldo é “dano colateral”.
O governador Wilson Witzel, juiz que trocou a toga pela política, esquivou-se de comentar:
– Não cabe fazer juízo de valor ou tecer crítica.
Ressalte-se que o carro não furou barreira, não avançou sobre uma unidade do Exército. Apenas passou em frente ao batalhão.
O presidente Jair Bolsonaro não se manifestou nem para prestar solidariedade à família. Seu porta-voz vem repetindo que o governo espera a conclusão do inquérito para que o caso seja totalmente elucidado.
Questionado pelo jornalista Pedro Bial, o ministro Sergio Moro comentou:
– Foi um incidente bastante trágico. O que eu vi, porém, é que, de imediato, o Exército começou a apurar esses fatos e tomar as providências cabíveis. Afastou parte dos envolvidos. Submeteu eles a prisão. E tem que apurar, né, se houve ali... Os fatos vão ser esclarecidos... Se houve ali um incidente injustificável em qualquer espécie, o que aparentemente foi o caso (...) As pessoas têm de ser punidas. Mas, lamentavelmente, esses fatos podem acontecer. Não se espera. Não se treina essas pessoas para que isso aconteça. Mas, tendo acontecido, o que conta é o que as autoridades fazem a esse respeito, quais são as providências tomadas. E o Exército está tomando as providências cabíveis.
Bial perguntou se a conduta dos militares, de disparar 80 tiros contra o carro de Rosa, se enquadraria em situação de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”, que justificaria a reação, conforme o projeto anticrime que está no Congresso. Moro respondeu:
– Pelo que eu entendi no episódio, e mais uma vez destacando que ele está em apuração pelo Exército, aparentemente não teria havido sequer uma situação de legítima defesa.