Quando embarcou em Curitiba rumo ao Rio de Janeiro para a reunião com o presidente eleito Jair Bolsonaro, o juiz Sergio Moro já tinha tomado a decisão de aceitar o convite para ser ministro da Justiça e da Segurança Pública. Prova de que a decisão já estava tomada é a assinatura na nota oficial divulgada logo depois de sair da casa de Bolsonaro:
"Curitiba, 01 de novembro de 2018. Sergio Fernando Moro".
Ao aceitar o convite, Moro está trocando o papel de juiz de carreira por um cargo político, sujeito às intempéries que podem atingir qualquer ministro, mas com uma blindagem que outros colegas não terão: a aprovação das ruas.
Bolsonaro o escolheu como símbolo do combate à corrupção, que deve ser uma das marcas de seu governo, e isso faz de Moro a estrela de seu ministério. Ele é o único entre os já indicados que todo o Brasil conhece e que tem status de "herói nacional" para uma parcela significativa da população. Depois dele, o mais popular é o astronauta Marcos Pontes, ministro da Ciência e Tecnologia. O czar da Economia, Paulo Guedes, é um ilustre desconhecido para a maioria das brasileiros.
Que Bolsonaro fez um golaço ao escolher Moro, é indiscutível. Seus eleitores não fazem ressalva. Aos críticos ele não costuma dar atenção. Ao mundo, passa o recado de que o discurso de combate à corrupção é para valer. Aos próprios integrantes do futuro governo e à burocracia da máquina estatal soa como um aviso: a vigilância será permanente.
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Moro assumiu um risco calculado. Trocou a magistratura por uma carreira política – porque daqui para a frente os signos que regerão seu destino são os da política. Se der mais ou menos certo, fica credenciado para uma das próximas vagas de ministro do Supremo Tribunal Federal, como ocorreu com Alexandre de Moraes, indicado por Michel Temer. Se der muito certo, em 2022 Moro passa a ser candidato natural à sucessão de Bolsonaro, que já declarou ser contra a reeleição.
Há risco de dar errado? Sempre há quando se trata de cargos políticos. Acostumado ao mundo jurídico, Moro terá de aprender a transitar em um ambiente desconhecido, onde o presidente não tem controle de tudo e os colegas de governo têm ideias que, em muitos casos, atropelam a Constituição. A parte da Segurança Pública é a mais espinhosa para o agora juiz. Trata-se de uma área crítica, da qual a população espera respostas imediatas. Se a criminalidade não diminuir, ou se aumentar, Moro será sócio nos resultados.
Se der muito certo, em 2022 Moro passa a ser candidato natural à sucessão de Bolsonaro.
Antes da confirmação, colegas de magistratura tinham esperança de que Moro não aceitasse o convite. O temor era de comprometer a imagem de isenção do Judiciário, já que sua atuação na Lava-Jato pavimentou o caminho para a eleição de Bolsonaro, ao colocar na cadeia o principal concorrente, o ex-presidente Lula. Mesmo que a condenação tenha sido referendada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) e que todo o processo legal tenha sido respeitado, atitudes de Moro, como a divulgação de trechos da delação de Antonio Palocci às vésperas da eleição presidencial, dão margem para o questionamento de sua imparcialidade.
Enquanto ele ainda estava reunido com o presidente eleito, o deputado gaúcho Paulo Pimenta usou o Twitter para fustigar o juiz: "General Mourão confessou que Sergio Moro durante a campanha já sabia q seria convidado p/ ser ministro se @jairbolsonaro fosse eleito. Ele revelou detalhes desta relação sórdida entre o verdugo do principal candidato e o eleito. Moro atuou na campanha como cabo eleitoral".
Em outro post, Pimenta acrescentou: "É de uma gravidade espantosa a revelação de Mourão. É prova testemunhal da relação criminosa e perversa entre a Lava-Jato e Bolsonaro. Quando Moro vazou a delação de Palocci, já sabia que se @jairbolsonaro fosse eleito ele seria ministro. "Vergonha #LavaToga".
Confira a íntegra da nota de Moro:
"Fui convidado pelo Sr. Presidente eleito para ser nomeado Ministro da Justiça e da Segurança Publica na próxima gestão. Apos reunião pessoal na qual foram discutidas politicas para a pasta, aceitei o honrado convite. Fiz com certo pesar pois terei que abandonar 22 anos de magistratura. No entanto, a perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado, com respeito a Constituição, a lei e aos direitos, levaram-me a tomar esta decisão. Na pratica, significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior. A Operação Lava Jato seguira em Curitiba com os valorosos juízes locais. De todo modo, para evitar controvérsias desnecessárias, devo desde logo afastar-me de novas audiências. Na próxima semana, concederei entrevista coletiva com maiores detalhes.
Curitiba, 01 de novembro de 2018.
Sergio Fernando Moro"