Imagine-se um cenário em que os Tribunais de Contas fiquem impedidos de autuar gestores negligentes e imprudentes e só possam impor sanções aos que agirem de forma dolosa. Esse cenário está configurado com a aprovação de um projeto de lei de autoria do senador Antônio Anastasia (PSDB) que aguarda apenas a sanção do presidente Michel Temer. A aprovação, na surdina e em caráter terminativo por comissões da Câmara e do Senado, sem passar pelo plenário, fez disparar um alarme entre auditores, conselheiros e ministros de tribunais de contas.
Temendo o esvaziamento de seus poderes com as brechas abertas nesse projeto, membros dos tribunais de contas pediram a Temer que vete pelo menos alguns pontos da proposta e farão reuniões hoje, em Brasília, para tentar barrar o que está sendo chamado de camisa de força para a atuação do controle de contas.
Preocupado com os efeitos da lei, o conselheiro Cézar Miola alerta para o risco de os tribunais de contas se tornarem figuras decorativas, sem poder para cobrar de forma adequada a aplicação correta dos recursos públicos.
O projeto restringe as situações em que os órgãos de controle poderão atribuir responsabilidade a agentes públicos. O texto diz que eles responderão pessoalmente por decisões ou opiniões técnicas “em caso de dolo ou erro grosseiro”.
Miola diz que a proposta isenta a responsabilidade de quem atua de forma negligente, imprudente e imperita. A Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil e a Associação Nacional dos Ministros e Conselheiros Substitutos dos Tribunais de Contas divulgaram nota na terça-feira com argumentos para que Temer vete o projeto. As entidades reclamam da falta de transparência e dizem que, sem passar pelo plenário, não houve o necessário debate.
Hoje, cabe ao tribunal identificar a conduta errada do gestor público. Se o projeto for sancionado, alerta Miola, será preciso comprovar que houve vontade deliberada de violar a lei:
– A declaração de invalidade de atos irregulares deverá, de acordo com o projeto, levar em consideração as orientações gerais da época (avaliar se, por exemplo, tratava-se de prática administrativa reiterada) e as dificuldades do gestor para saná-la.