Durante o debate na Rádio Gaúcha, nesta terça-feira (6), o prefeito Sebastião Melo citou que "a prefeitura está contratando Tucci" para estudos sobre o sistema de proteção de Porto Alegre.
Trata-se de do engenheiro civil Carlos Tucci, pós-doutor em recursos hídricos pela Colorado State University, que atuou como professor titular do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS. Nos últimos 40 anos, ele desenvolveu projetos de consultoria na área ambiental e atuou como consultor junto a empresas e entidades como Unesco, Banco Mundial, BID e Itaipu. Tucci é um dos membros do Comitê Científico de Adaptação e Resiliência Climática do Plano Rio Grande, instalado pelo governo do Estado.
Ele é proprietário da Rhama Analysis, empresa de consultoria nas áreas de engenharia e ambiente.
Após o debate, a coluna apurou que o acerto entre prefeitura e a empresa está encaminhado, mas o contrato ainda não foi assinado. O Dmae disse que não poderia dar detalhes sobre valores e especificações do trabalho a ser feito até a assinatura.
Tucci tem relações com o grupo de holandeses que esteve no Estado em junho para analisar o sistema de proteção contra enchentes no Estado.
A coluna conversou com Tucci em junho. Veja o que pensa o pesquisador.
Relação com os holandeses
"Quando começamos a fazer uma proposta para o Estado, o governo falou da conversa com os holandeses. Procuramos juntar esforços, já que a gente tinha a mesma linha de ação sobre gestão de inundação. Há um padrão internacional, que, historicamente, o país que mais o desenvolveu foi os EUA."
Alertas de desastres
"Não temos política. O trabalho que o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) faz é muito interessante. Mas não resolve para inundação. O que adianta dizer que vai chover cem, 200 milímetros? Para que a pessoa se sensibilize com a alerta, preciso dizer onde vai ocorrer a inundação e quanto. Para isso, eu preciso sair da chuva até a vazão, o nível, e o mapa de inundação da cidade. Aí você está fazendo alerta. Apenas dizer que vai chover, ou mesmo que terá magnitude alta, não indica se vai chegar na casa de alguém ou não. A gente não tem sistema de alerta no Brasil ou tem muito limitado. Para isso, você teria de ter a parte hidrológica do processo, que não existe. Mais que isso, você precisa de topografia da cidade."
O Rio Grande do Sul
"O Rio Grande do Sul não tem mapa topográfico. Santa Catarina tem metro e metro do Estado inteiro. No RS também precisa-se de batimentaria de rio para poder chegar a uma precisão maior. Por exemplo, o Room for The River (projeto que abre espaço para regiões alagáveis dos rios), que os holandeses adotaram, é nada mais que o zoneamento de inundação, só que com nome mais sofisticado. O que você faz quando você faz o padrão americano de zoneamento? Você delimita a zona dos 100 anos de "tempo de retorno". E aí você calcula a zona de passagem da enchente, que você não vai deixar que seja ocupada porque ocupar aquilo ali vai gerar impacto acima e abaixo do rio. Há um critério técnico para calcular onde fica essa faixa. Você até pode fazer uso, por exemplo, para uma horta, que pode ser inundada, ou uma área de recreação, um parque, mas você não pode obstruir o escoamento. Na outra faixa, você deixa ocupar com certas outras regras. Não deixar um hospital ou uma escola entrar nessa área, os pilotis terem dois pisos. São uma série de condicionantes que você faz no zoneamento da área de inundação."
O trabalho no Estado
"Incorporamos o zoneamento de todas as bacias do Rio Grande do Sul. Vamos fazer todo trabalho em todas as cidades e levantar esses dados, que precisam de topografia e batimetria. É um trabalho grande. Zoneamento é um processo que tem mais de 3 mil anos, porque, quando se projetou a cidade de Amarna, no Egito, se deixou os dois lados do Nilo sem ocupação, para as enchentes. Não é novo. Nós é que não queremos aprender." "
O trabalho em Porto Alegre
"A gente tem uma proposta já enviada para a prefeitura para inspeção, diagnóstico, recuperação, modernização e plano de emergência."
Rio Taquari
"A Holanda inteira cabe dentro da bacia do Taquari.As declividades no Taquari são incríveis. As velocidades de água chegou a 5 metros por segundo, uma energia que destrói tudo. Você não pode deixar ninguém voltar a ocupar as áreas que foram destruídas. O rio não inundou, passou com uma régua, derrubando tudo. Tenho uma estimativa que o Taquari, para mesma área, tem as maiores vazões do mundo. É quase um tobogã."
O modelo dos EUA
"Nos anos 30, os EUA gastavam muito dinheiro com obras de engenharia para controlar enchentes. Eles perceberam que isso era insustentável. No final dos anos 1960, viram que não dava mais para continuar gastando dinheiro com obras com custo muito alto e o resultado não era dos mais favoráveis. Um professor deu a estrutura inicial baseado no zoneamento de inundação e seguro. Então, a política no mundo inteiro foi saindo de medidas estruturais para medidas não estruturais. Medidas não estruturais é zoneamento, seguro, sistema de alerta, proteção individual, e medidas estruturais é diques, barragens, mexer em canais. Só que essas medidas estruturais são "n" vezes maiores que as medidas não estruturais, de custo, e não é sustentável, e nem todo lugar tem possibilidade de fazer obras."
Mapa de inundação e seguro
"Em nível federal, fizeram o mapa de inundação de todas as cidades americanas e criaram um programa de resseguro nacional - para que a cidade entre no programa de seguro, e o cidadão da cidade dentro da faixa considerada de risco, faça o seu seguro de inundação. Na Inglaterra, não dá para fazer seguro, porque é um país que o risco acontece no país inteiro ao mesmo tempo, porque é pequeno. Ele pode fazer um resseguro internacional, mas não é simples fazer isso. Por exemplo, a Holanda não tem seguro para inundação, também porque é um país pequeno. A Alemanha tem."