Além de todo o potencial simbólico do atentado contra o ex-presidente Donald Trump, o sábado, 13 de julho de 2024, vai mudar, na prática, a condução da corrida eleitoral americana.
Não o seu fim, porque Trump já vinha despontando como favorito para vencer o pleito em novembro. Mas as estratégias para chegar lá já estão sendo alteradas desde o atentado na Pensilvânia, em que o ex-presidente, por muito pouco, não morreu.
A campanha já vinha sendo guiada por uma retórica de violência - as memórias dos ataques de 6 de junho de 2021, ao Capitólio, o processo e condenação criminal de Trump na Justiça por suborno de uma atriz pornô, as acusações de que o republicano é uma ameaça à democracia, a demonização mútua entre os adversários e expressões como a usada por Joe Biden em evento interno de colocar o rival no "alvo". O ataque é mais um ato em um ambiente extremamente polarizado, em que trocas de acusações e recortes de vídeos em redes sociais com conteúdo violento ocupam o lugar que deveria ser do debate de ideias e propostas.
Tudo isso será usado pela campanha republicana para acusar os democratas de terem gestado um ambiente propício à violência, que teria culminado no atentado de sábado. Se, por um lado, os seguidores de Trump poderão reforçar o discurso de que a direita é perseguida (nos EUA e no mundo), por outro irão apostar na imagem icônica do ex-presidente com o punho erguido e o rosto sangrando imediatamente após a agressão, ainda no palco.
A imagem é muito forte e tem impacto direto em um país no qual, em grande parte, o show business se mistura com a política - e do qual o próprio Trump é oriundo. A cena do candidato sendo alvejado, ao vivo, abaixando-se, escondendo-se dos tiros, para, na sequência se reerguer (renascer, ressuscitar) como herói, um mito, reforça a ideia de que Trump personifica a força, a masculinidade, perante um adversário frágil e idoso.
Essa narrativa deve pressionar os democratas pela saída de Joe Biden da disputa. O ataque a Trump ocorre justamente no momento em que o democrata, candidato à reeleição, apresenta evidentes problemas de cognição, com lapsos de memória e dificuldades de raciocínio expostas em praça pública, em rede nacional, no debate do dia 27 e, na sequência, ao trocar os nomes de Volodimir Zelensky por Vladimir Putin e da vice, Kamala Harris, por Trump.
Do ponto de vista imediato, os temas de campanha devem mudar, resgatando polêmicas sobre o porte de armas de fogo (a facilidade de acesso) e a violência urbana. Logo após o atentado, a campanha de Trump enviou o seguinte texto pedindo aos eleitores que contribuíssem para a eleição: “eles não estão atrás de mim, estão atrás de você”. Na psique americana, fica subentendido que se até um ex-presidente e candidato, que conta com serviço secreto, carros blindados e todo um aparato de segurança, o que sobra para o cidadão comum?
Outros temas devem ganhar terreno a partir da identificação das motivações do atirador - algo que a polícia ainda não sabe.
O foco da disputa, sobretudo, sairá da condenação de Trump e dos processos aos quais responde na Justiça. Até a estratégia democrata de atacar, de forma mais agressiva, o ex-presidente deve ser alterada - ao menos nos próximos dias. Afinal, o republicano, neste momento, é vítima.
Também do ponto de vista prático, deve haver reforço por parte do serviço secreto das ações de segurança nos comícios, que podem ter seus locais alterados para áreas fechadas. Em ginásios, estádios e casas de espetáculos, o perímetro de segurança fica mais restrito e é menos complexo fazer a segurança.